06/08/2012

Pelo amor de Deus, chorem!


Não adianta virem com essas caras de espanto, vocês sabem do que eu estou falando. Foi-se o tempo em que ser honesto era correr o risco de ser preterido, hoje é motivo para ser punido, vocês sabem disso. O que isso significa? Significa que estamos no cume da degradação, as pessoas estão vivendo no limite de suas sanidades mentais, sendo atacadas de todos os lados por ações e factos escabrosos. Gente que conseguia controlar sua índole agressiva, está simplesmente surtando, dando de ombros para a própria vida e dando cabo dela, mas só depois de alvejar outras pessoas que encontra pela frente. Não, isso não justifica, eu sei, mas isso explica os surtos de franco atiradores que pensávamos serem endêmicos no oriente médio.

Um dos motivos, certamente dos mais fortes, é a pessoa se ver obrigada a parecer forte o tempo todo, fria o tempo todo, competitiva o tempo todo, obrigada a amealhar uma fortuna que torrará em pouco tempo, em tratamentos psiquiátricos, se sobreviver até lá. Quando conseguem se segurar, oscilam entre o surto psicótico já descrito, e a frieza do desdém para com as pessoas e até nações inteiras, como os especuladores que agravam e prolongam a crise mundial. Nada pessoal, só falta de vergonha na cara que aflorou sob a máscara do empreendedorismo financeiro.

Em ambos os casos há o desvalor da própria paz pessoal e do bem estar do próximo, que passa então a ser um mero alvo ou peça a ser movida ou removida, de acordo com os danos psicológicos causados. Infelizmente, só o que surta tem o quadro clínico psiquiátrico reconhecido, o outro é apenas um homem de negócios.

Não chegando a tanto, temos pessoas cada vez mais doentes, com a imunidade atacada por um estresse que não pode ser demonstrado em hipótese alguma, não da forma como poderia ajudar. Pode ser externado com barbarismos no trânsito, com hostilidades a torcedores de outros times, com provocações a quem parecer estranho, investidas sobre mulheres acompanhadas, enfim, só se permite e se aceita externar o problema se ele gerar outros ainda piores. Parece tática de médico picareta, que receita drogas sintéticas desnecessárias, para depois ganhar comissão com outras que combatam seus efeitos colaterais, que gerarão mais efeitos colaterais e assim por diante.

O que poderia externar toda essa tensão sem gerar riscos a si e aos outros, incluindo a saúde financeira de países inteiros? Dançar, cantar, chorar. O que tem sido dado pela sociedade industrial como fraqueza, como algo fútil à sobrevivência, é justo o que evitaria a maior parte das, senão quase todas as, perdas de controle da própria personalidade. Não que seja inerente ao ser humano o auto controle propriamente dito, mas um controle mínimo e esporádico lhe é dado, o suficiente pra decidir como e quando desabafar, espernear, gritar ou o que sirva para manter a própria sanidade.

Bem, vou contar-lhes uma cousa, os combatentes também choram durante um ataque. Eles não páram de lutar, não páram de avançar sobre o inimigo, mas choram por diversos motivos. Seja pela iminência de ser despedaçado e nunca mais ver seus entes, seja por ver seu amigo ser despedaçado por uma bomba bem ao seu lado. Ainda que aos berros, o comando imediato faz o que pode para consolar o soldado, para que ele se sinta menos mal e amparado pelo grupo. Pedir que alguém se sinta bem no campo de batalhas, debaixo de uma chuva de bombas, pelamor da bicicreta véia zangada! Nenhum oficial que eu conheço sabe fazer milagres! Nenhum oficial que eu conheço quer um surto psicótico na tropa. O estresse é extremo, mas as formas de extravasar são imediatas e na mesma intensidade. Se mesmo assim, muitos voltam com traumas terríveis, às vezes incapazes de retornar ao convívio civil, imaginem se fossem obrigados a fingir-se felizes e contentes enquanto são cravejados de balas! Pois nós o somos.

Claro que na vida civil, a oportunidade de extravasar não é tão imediata, nem tão integral quanto na guerra, ainda bem! Na guerra, o soldado desabafa lutando, para não morrer perfurado, pulverizado, enfartado ou vítima de um derrame. Em tempos de paz aparente, porque ela jamais habitou de verdade o seio da humanidade, mostrar o que se sente, para pessoas que se importam, é a forma mais eficaz. Não, somente desabafar não resolve, mas ajuda. O amparo imediatamente posterior é o que vai de facto resolver o problema. É aqui que está o calcanhar de aquiles deste início de século. As pessoas trocaram o senso de humor pelo senso de cinismo, zombar  ou rechaçar o sofrimento alheio tornou-se socialmente aceito. É tido como piegas e digno de reprimenda dizer ou demonstrar o que se sente, a não ser que dê prazer ou dinheiro, como em quadrinhos, livros, músicas, entre outros. O que quer que dê retorno financeiro ou algum tipo de prazer ao grupo. Só que a maioria dos casos não dá margem para criatividade, não de forma imediata e nem sempre pelo sofredor.

Houve uma campanha no início dos anos oitenta, chamada "Chore se for homem". Foi a cousa mais sensata, e uma das poucas cousas sensatas, que os departamentos de propaganda do governo já fizeram. Como sensatez não é bem-vinda na política, durou pouco e não foi veiculada a contento. O machismo continuou falando mais alto do que o próprio bem estar. Se sexo fosse cura para depressão, prostitutas não cometeriam suicídio, já adianto aos manés detratores que costumam falar baboseiras na minha caixa de comentários. Essa mentalidade é a mesma que convence os garotos de miolos moles a comprarem felicidades químicas, que não resolverão porcaria nenhuma, mas darão a ilusão efêmera de que tudo é bom e que por causa daquilo sua vida vale à pena. Psicologicamente falando, apelar para o sexo pago é o mesmo que usar drogas, consegue-se um prazer efêmero e a aceitação do grupo, mas o problema continua lá, e vai te obrigar a recorrer com mais voracidade ao vício, sem perceber, a pessoa fica cada vez mais vulnerável àquilo que pretendia resolver, podendo se tornar agressiva quando interpelada a respeito. Sim, isto também faz parte do meu cabedal, da minha experiência de vida.

Vigorexia, literaxia, anorexia e bulimia são palavras relativamente recentes, que não teriam vindo à tona se seus efeitos sociais não estivessem muito evidentes. como todos os outros transtornos e vícios, eles só existem para compensar problemas que poderiam ser resolvidos, e até evitados antes de surtirem os primeiros efeitos, se a pessoa pudesse falar, reclamar e chorar, principalmente chorar a sua dor. O pior é saber que isto não vem de poucos anos, desde a década de setenta que se fazem alertas a respeito, mas até hoje o vulgo acredita ser uma bobagem, que um prazer ou uma tarja preta resolve tudo. Não resolve. Repito: NÃO RESOLVE. Essas bobagens mundanas são oferecidas por debaixo do pano há milênios, sob as vistas grossas da própria sociedade que as condena em praça pública. Se resolvessem, os problemas já não existiriam mais, estaríamos em um planeta pacífico, onde as armas seriam usadas apenas para caça e esporte, mas o mundo não é assim. Para ficar longe dessa semi utopia, ainda precisará melhorar muito.

O que fazer: chorar. Literalmente. Não se iluda com aquele sujeito de cara fechada que aprece ser uma muralha de resistência, o senho franzido pode ser de dor, ele pode já estar andando de joelhos sobre as pedras cortantes deste mundo, por conta do peso que carrega há sabe-se lá quanto tempo. Talvez ele já esteja operando acima do seu limite, prestes a enfartar ou perder o juízo. Então chore. Com certeza terás que passar por anti social, grosso, mal educado, mandar o cidadão ir ter com a meretriz que o trouxe à luz, mas é um preço razoável a se pagar pela manutenção de tua lucidez. É provável que demores muito a encontrar quem lhe dê o acolhimento necessário, até porque há muito mais gente precisando do que capacitada a dar essa ajuda, então recolha-se à tua intimidade e chore lá.

Um modo eficaz e eficiente de soltar o choro preso, é cantando. Aliás, o modo mais socialmente aceito de se chorar é cantando, une-se o útil ao agradável. Sua voz não é lá essas cousas? E quantos lançamentos recentes o são? A maioria das tristezas hoje em dia, é bem próxima à tristeza pura, aquela matriz da qual todas as outras derivam, então não faz diferença o que se vai cantar chorando, do hip-hop à ópera clássica, tudo funciona a contento. O que torna o choro mais eficaz do que qualquer porcaria viciosa que te forçam a usar, como se estivessem te fazendo um favor, é que ele ataca o mal na raiz, aliviando as tensões musculares que dão a sensação de asfixia e arritmia, dando vazão aos hormônios represados, aliviando o trabalho das artérias, enfim, te dando de graça o que custaria muito caro por outros meios.

Resolve o problema que te aflige? Não, resolve o teu problema e te dá cabeça fria para enfrentar o que te aflige. Te ajuda a ser um adulto bem resolvido e mais próximo da plenitude. Não entrarei nos méritos dos que dizem não existir gente confiável a quem entregar seus sentimentos, isto fica pra outro artigo. Enquanto não encontras, se em nenhum outro lugar puderes chorar, chore durante o banho, que é o melhor momento para expurgar seus males e soltar o gogó, chore ao se deitar, enquanto faz uma prece, ninguém que mereça os dentes no lugar, vai reprimir alguém que demonstra emoção intensa durante uma prece íntima. Ninguém precisa saber os motivos dos prantos, se o virem, aceite um lenço com gratidão, mas não aceite interferências dos donos da verdade. Se for preciso, mande todo mundo ao raio que os parta e vá choraterapiar em um lugar sossegado. MAS CHORE, CARAMBA!


3 comentários:

Lilly Rose disse...

Boa noite querido Nanael !!
Nada mais verdadeiro, amar dói !!!! E como dói...

Teu texto é claro, sentimo-nos em nossa sociedade actual como peças em um jogo de xadrez.

Prestes a sermos abatidos pelo inimigo, oculto ou declarado ...

As razãos não importam mais nestes tempos modernos....

O esquema é "vamos atingir este e agora aquele"... e assim por diante.

Chorar é remédio mesmo, e eu hoje estou a chorar.

Pelo menos encontrei um cantinho para fazê-lo.

Obrigada meu amigo querido.

Aromas de Rosas Brancas...
Lilly Rose

Nanael Soubaim disse...

Tome meu ombro.

Lilly Rose disse...

Bom dia meu querido Nanael,

Sempre podes contar com meu ombro amigo também.

Tua amizade é um dos melhores presentes que recebi do Divino.

Que a paz reine em tua alma e que o amor pulse sempre em teu coração!
Abençoado FDS !!

Aromas de Hortelã...
Lilly Rose