24/02/2011

Maria Cristina 4

Mas que bela mulher!

Ter beleza aos vinte anos é uma dádiva divina, por meio da genética e dos bons tratos em casa. Ser linda aos quarenta, com muitos lutos, perseguições covardes, fragilidade física, inúmeras frustrações seguidas e sem uma vida pessoal que mereça o nome, é mérito.

Ela é bela por seus próprios e exclusivos méritos. Pelo coração livre de rancores e afãs vingativos.
A escassez de amigos que lhe valham o amparo necessário e urgente, pelo qual faz mais do que por merecer, não tolheu o olhar doce e meigo que seu coração nobre e autruista irradia. Ela sabe que seu olhar pode ser tudo de que um colega em profunda depressão (este mal pandêmico) precisa para seguir.
As agruras crescentes não logram êxito em curvar-lhe a coluna, bem como as víboras que almejam vôos políticos não quebraram a autoridade que sua obra impôs à instituição, outrora séria, que vem consumindo sua juventude há duas longas décadas.

Ela dedica sua vida, desde então, a atenuar a corrupção socialmente aceita com que o materialismo desenfreado (dos que pregam "cada um por si e todos contra todos") tem infectado o caráter de nossa juventude, assegurando um fio de civilidade e humanidade àqueles petizes que só esperavam se tornar técnicos, mas que por suas mãos acabam se tornando adultos. Idade é fácil de se conseguir, basta não morrer. Ser adulto envolve muito mais detalhes.

Tirando de seu bolso, da míngua que se tornou o provento de um funcionário público idôneo, para ajudar a manter suas funções, e com o desdém que o governo federal tem pelos que não são dos seus, entregou-se de modo quase sacerdotal ao labor que tomou por livre e espontânea vontade. Sempre dizendo que "os meninos não podem ficar daquele jeito". Os "meninos", às vezes, são pais e mães com mais idade do que ela. Se desdobra para compensar a decrescência do contingente com que pode contar, posto que seu trabalho não é bem visto pela banda podre que tem suas regalias, então não lhe concedem o mínimo para operar suas funções dentro de seu horário contractual.

Saiu dos correios para poder ter mais tempo. Que ironia! Hoje é cativa dele. O amor pela burocracia fútil, que disfarça a inépcia e a egóica mentalidade dos agraciados, impede que os serviços se dêem a contento, burlando os princípios éticos mais básicos e nobres do funcionalismo público, que é a presteza e urgência para com as questões públicas. Ela sabe quem paga o salário de quem e não considera isto uma vergonha.

Ela gostaria de tirar férias em uma serra, visitar parentes pelo país, se mostrar disponível em sua solteirice a quem acaba lendo "quero ficar só", ao verem sua dedicação cristalina. Ah, homens! Um bilhão de ticos mais um bilhão de tecos extras, brigando em vez de trabalhar, só lhes tolhem a visão; geralmente também a maturidade. Para estes ela não tem tempo, quer quem combine com tua mente afiada e ajude a atenuar sua índole encrenqueira. Encrenqueira pelas causas justas, que já a fizeram enfrentar um policial. Tudo por seus meninos. Um pretendente teria que adoptá-los também, ou não saberia compreender e aceitar esse amor desapegado ao trabalho e às pessoas, que nutre com carinho.

Ela queria sua vida em festa, entre deveres e prazeres que são de direito a qualquer cidadã. Poderia tê-la se fosse um pouco menos sensível à dor alheia. Poderia estar com seu marido e rebentos, se fizesse exclusivamente o que reza seu contracto profissional. Poderia, se não fosse ela. Há muita gente precisando para pouca gente se dispondo. Arregaça então as manguinhas e deixa seus sonhos à espera de uma oportunidade.

Diziam os filmes da época de ouro que as mulheres encrenqueiras são as mais belas. Se todas, não sei, mas Maria Cristina honra o postulado. Cutucar onça (ou touro bravo) com vara curta é com ela mesma. Desde que valha à pena. Diziam também que são as melhores esposas e mães... Acredito que ela seria, piamente.
Uma de suas resoluções é o uso intensivo do bom senso. Se considera e se assume perua. Gosta de roupas coloridas, cheias de bordados, bijouterias e jóias que de todo tipo. Gosta de carros grandes e potentes, tem horror aos hatches de mil cilindradas que se esgoelam para sair do lugar. Mas se recusa a se comportar como a adolescente que já não é. Roupas pensadas e feitas para adolescentes estão fora de seu guarda-roupa. Ela tem amigas e colegas que as usam, mas para si prefere a coerência. Advogada (em modo de espera) e assistente social, tem clara em mente a noção de lugar e oportunidade, na hora de se vestir e no modo de agir. Desde a época em que era uma menininha magricela trabalhando em uma creche, cuidando de rebentos alheios. Se o poder público fosse o que se diz, ela estaria escalada para receber a família presidencial americana, em Março próximo. Mas lá estarão os que adulam e enchem sua mesa de burocracia inútil.

Avessa à informática, desta vez se verá obrigada a fazer sua declaração nesta geringonça esquisita, de plástico e luzinhas, que nunca faz o que manda. Porque ela é mandona e gosta de ser acatada. Que não se subestimem, porém, sua competência e sua vontade férrea. Se for preciso ela entra na sala com uma marreta e faz a devida intimação ao software indolente. Ela tem e-mail. Como nunca voltou, suponho que o abre de vez em quando.

Um de seus sonhos é um Ecosport. Sabe-se lá por que critérios, pois tem uma queda arrebatada por sedãs grandes, como Fusion e Ômega. Fica com seu pequeno Fiesta sedã, que é o que pode ter no momento. São nuances de sua personalidade cristalina, sim, nem por isso escancarada a quem quiser bisbilhotar, pois detesta se ver vigiada. Mas adora dizer em tom desafiador "Eu sei muito bem o que você estava fazendo lá, viu!".

Me pergunto sempre até quando será submetida a este regime perverso, dedicando sua vida a uma instituição que há muito não merece nem sua presença, hoje liderada por quem faz vistas grossas aos escândalos dos que voltaram à cena política. Mas ela mesma já me disse, certa feita, que o mundo protege as pessoas más. As boas, com suas manias de negar o egoísmo, não são divertidas o bastante.

Dia vinte e cinco de Fevereiro, é dia mundial (não declarado) do amor incondicional ao próximo. É aniversário daquela quem olhará para o Mestre nos olhos, sem remorsos por ter feito menos do que poderia, quando seus feitos excederam até o salutar para sua compleição física. É quando os anjos descem um pouco mais às proximidades da Terra.

É dia de Maria Cristina.

19/02/2011

Nomes para novas igrejas

Olha a salvação baratinha, quem vai querer...
Os intrometidos da Folha de São Paulo, do caderno de Ciência, registraram uma igreja falsa, como é a maioria delas. Tudo para mostrar como é fácil enganar a população com discursos inflamados, moralistas e de extrema direita rançosa. Também para afagar seus egos ateus, sejamos sinceros.

Bem, sendo tão fácil abrir uma igreja, logo faltarão nomes, e é para resolver este problema que estamos aqui.

Você, picareta que não sabe como aplicar seus golpes de forma legal e enriquecer às custas da boa fé da população, por falta de um nome e um enredo! Seus problemas acabaram! As organizações Palavra de Nanael apresentam o Denominator and Roterizator for Fake Church Tabajara! Com ele fica fácil até mesmo escolher se será uma igreja de fachada, ou só um nome de fachada para uma igreja de araque. Eis alguns exemplos...
  • Igreja da Cereja Benfazeja; Nesta igreja, todos os fiéis iniciam o culto com suas cerejas sagradas em mãos, junto com a verdadeira bíblia da cereja, que prova que Jesus disse que a planta era uma cerejeira, não uma videira, plantinha ridícula que nem consegue se manter de pé. Ao fim do culto, as cerejas já abençoadas (adiquiridas com o apóstolo santificado de quinto grau célcio) serão recolhidas para fazer o bolo do verdadeiro dia de nascimento de nosso salvador, por uma incrível coincidência também o do apóstolo santificado excelso de nossa igreja. Contamos com sua presença, e seus presentes também.
  • Igrejinha do Chacrinha; Aêêêê... Aêêêê... Quem vai querer a multiplicação dos bacalhaus? Terezinha!! (de Jesu-us!!). Mas realmente! Realmente! Jesus não multiplicou peixes quaisquer, ele multiplicou bacalhau! Porque o bacalhau, além de se conservar pelo seu sal, é também o símbolo da mulher santa. Oh, Terezinha! Oh, Terezinha! É de Jesus a Igrejinha do Chacrinha!
  • Igreja da Escorpiana Virgem; Esta só aceita mulheres de escorpião com ascendente em virgem. Será pelo veneno santo que se curarão os pecados do mundo, pois o veneno do escorpião é o mal pelo qual o bem será feito. As dores da redenção, por si só, já purificam a alma das fiéis, e picada de escorpião dói mesmo! A ascendência é um critério de seleção pela praticidade e delicadeza, o que realmente limita o número de fiéis, mas não serão poucos os escolhidos? Então por que haveria de ter muitas escolhidas? Heim? Virgindade? Quem falou em virgindade? E o pastor, como fica? No seco?
  • Congregação Pentecostal da época de Cristo; Chega de falsos profetas pregarem a vida em Cristo e viverem diferentes d'Ele! Nossos fiéis vivem de acordo com a época, os costumes de época, a tecnologia da época, as roupas da época, o vocabulário da época, o conhecimento técnico e científico da época, a medicina da época. Para tanto, todos passarão a viver isolados do mundo pecaminoso de hoje, na fazenda do reverendo Dhakeo Wendo, vivendo e trabalhando como era na Galileia da época, deixando para o santo reverendo a total e irrestrita disposição de tudo o que for produzido, bem como o teste de pureza das noivas, antes do casamento.
  • Igreja Deus é Surdo; IRMÃOS! DEUS JÁ ESTÁ VELHINHO E NÃO ESCUTA DIREITO! VAMOS LOUVÁ-LO E ADORÁ-LO DE MODO QUE ELE NOS OUÇA, PORQUE REZAR BAIXINHO É PARA QUEM TEM VERGONHA DE SER CRISTÃO. E GRITANDO DESSE JEITO NINGUÉM VAI OUVIR A GRANA ROLANDO SOLTA AQUI DENTRO!
  • Seita do Capeta Cristão; Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Eles não matam em nome do Altíssimo? Não roubam em nome do Salvador? Eu os conheço! Sou eu quem os leva para o mal caminho que eles mesmos escolheram. Mas quem vier pro meu lado não vai cair com eles. Eu conheço o caminho do mal, então também sei como trilhar o caminho do bem, só depende de vocês.
  • Seita Cheque; Também aceitamos todos os cartões de crédito, grana viva não, que este mundo de pecados está cheio de salteadores, de falsos profetas, de pregadores infiéis, de lobos em pele de cordeiro. Então venha para a nossa igreja! Não fique aí sentado, como se o mundo não fosse acabar a qualquer momento! Para quê economizar para uma casinha aqui na terra, se logo será destruída pelo fogo divino? Venha e garanta o seu lote no céu. Dividimos tudo em até seis vezes sem juros.
  • Igreja Atéia da Galiléia; Bem, vamos ser sinceros. Não acreditamos em Deus. Jesus foi um cara legal, que incomodou e pagou com a vida por isso. Então a gente quer dizer que nossa igreja é um lugar legal pra gente se reunir, bater um papo, desestressar, se confortar uns aos outros. Tudo por uma mensalidade módica. Parece um clube? É um clube, só que com isenção de impostos.
  • Igreja Messiânica de Todos Casados; Irmãos! A solteirice, com sua permissividade e promiscuidade sem rédeas, é a causa de todo e qualquer pecado que já tenhamos visto, vemos e veremos na face da terra. Então, em nome do Senhor Jesus, nós temos a solução. Nossos Pastores, Bispos, Apóstolos e Messias estão sacramentalmente autorizados, pessoalmente pelo próprio Criador, a celebrar o casamento de seus filhos assim que vierem à luz. Sim, irmãos, não precisamos nos incomodar com filhos pentelhos que passam a vida inteira em casa, dando dores de cabeça e atraindo desgraças mundanas para nossos lares. Assim que nascem, nós reunimos todos em sessões de descarrego preventivo, até os sete anos de idade, e escolhemos quem se casará com quem, a partir de quando eles passarão a viver sob tutela de nossa congregação, sob nossa supervisão e serão educados de acordo com os nossos santos dogmas. Vocês, irmão e irmã, só terão que pagar por isto, nada mais.
  • Igreja do Surfe no Mar Vermelho; Aí... Só... Mó barato, valeu! Cara, não pague jacaré pra Jesus, aí. Chega mais pro nosso lado, venha ter um lero com a nossa galera, sinta as vibrações positivas do Espírito Santo em ondas radicais! Uhuuuuuu!!!! Moiés, aí, quando abriu o Mar Vermelho, não podia obrigar os coroas doentes a atravessarem à pé. Eles foram surfando. Porque, imagina só o tamanho das ondas criadas por Deus! Cara! Foi uma loucura, valeu! Os soldados do faraó, bando de caretas, foram de biga, muitos até a pé! Aí, camaradinha, no meio do caminho a galera de Moisés já tava curtindo um luau na praia, e com eles lá o mar fechou, aí!
  • Engreja Aunaufabeta; Irmãos! Nóis não preciza lê a bíbria! O Insprito Santo inpira nóis pra nóis falá o que Deus qué que nóis fala. Sabê lê é pra pecadô, que qué sabê mais do que Deus. Cristão de verdade só trabaia e ora. Sabe fazê conta pra pagá o dízemo certinho, qui sinãu Deus castiga cum fogo do enferno. E muié teim que ficá calada, é um ebeçurdo muié sê pastora, pruquê é as muié que mandô todo mundo pro pecado, intão teim que ficá calada. Não pode usá masqenhaje, não pode depilá, não pode mostrá do pescosso pra baixo, não pode uzá xampô nem cortá us cabelo. Muié serve pra aumentá o tamanho da nossa engreja, parino.
Estes e outros trambiques descarados vocês encontram no Denominator and Rotarizator for Fake Church Tabajara. Compre já o seu!

Legal, né.

Agora, com esta sátira, vocês podem ter uma idéia precisa dos critérios que o governo usa para conceder autorização para igrejas novas, que proliferam diáriamente nos rincões onde aquele se omite, deixando caminho livre para organizações criminosas e pastores caça-níqueis.
Não é necessário absolutamente nada além de reunir a papelada e pagar as taxas iniciais. Depois, tudo o que estiver em nome da igreja será isento de impostos, inclusive aquilo que, na prática, pertencer ao seu clero; carros, casas, aviões, et cétera. Mede-se a honestidade de um pastor pela inversa velocidade com que enriquece no exercício do sacerdócio, se não tiver outra fonte de renda. Falsos profetas e lobos em pele de corderos, sempre tivemos pelo mundo, mas não tenho notícias de uma época com índices tão elevados.

Quando vocês estiverem desesperados, fujam de promessas. Procurem seus amigos para que coloquem suas idéias de pé, não tomem decisão alguma enquanto estiverem desesperados, porque o desespero (salvo raríssimos casos em que vocês certamente não se enquadram) é o pior dos conselheiros.

11/02/2011

Sabotagens à democracia

É de menino que se torce o pepino
Tudo começa em casa. Tudo mesmo.
Como já falei recentemente dos excessos das  mães-tigre, e fui suficientemente incisivo, me aterei ao outro extremo, o da negligência.
Começa com os pais amparando a criança a todo instante. O petiz não pode cair sentado que lá vão eles, enchê-lo de dengos por horas e horas. A criança não tem experiência nem discernimento da vida, mas não é burra. Com o tempo aprende que fazendo birra ou chantagem, consegue o que deseja. Raramente o que realmente quer, mas sempre o que deseja. Não que se deva deixar a criança se ferir sem dar importância, mas as atenções não devem ir muito além de quando o choro cessa, pois vicia.
Forma-se uma personalidade tirana, que pode tomar três caminhos básicos; o do coitadinho, que se faz de vítima o tempo todo; o do fútil, que pensa que o mundo só existe para lhe dar prazer e até agride para obtê-lo; o do revoltado, que não quer se misturar com os dois e adopta discursos nos quais realmente não acredita, são só para ocupar seu tempo ocioso e experimentar mais os limites frouxos. Os três são basicamente o mesmo conteúdo em embalagens diferentes.

Os dois primeiros não dão a mínima para política. Política não é divertida, não assopra o dodói, te obriga a ter as atenções divididas com outros temas, o que para os três é inadmissível. O terceiro gosta de política justo porque não é divertida e não assopra o dodói, assim se sente acima dos dois alienados mimados, se envolve com ela até o pescoço e rola na sua lama. O problema é que sua militância tem a mesma maturidade que a daqueles, está voltada para sua própria satisfação.

O coitadinho e o fútil podem se tornar agressivos, quando suas vontades não são satisfeitas, geralmente se tornam. Para linhas gerais e evitar delongas, uno-os em um primeiro tipo só. Este tipo sai de casa assim que toma o café e vai "curtir a vida". Escola? Talvez. Há os que compreendem um pouco mais e vão à escola, conseguem um aproveitamento razoável e esperam recompensas generosas em troca. Uma boa parte, porém, vai em busca de grupos que satisfaçam seu ego inchado e super protegido. Encontram-nos em shoppings centers, bares, boates, lugares onde seus cartões de crédito possam comprar atenção e a ilusão de que são importantes para o mundo, quando na verdade só ocupam o espaço de quem quer fazer algo.
Contrariá-los é um risco à própria integridade física, como no episódio em que uma menina recusou uma cantada e foi agredida com uma cadeira, em uma boate. Ele não aceita ser contrariado, vale para os dois tipos. Quando chega em casa, quer tudo arrumado, mas não dá a mínima quando está, só olha o que não estiver no seu devido lugar. Quer comer o que estiver pensando em comer e ai dos pais se não houver ao menos uma porção do que quer na casa. Mas é freqüente mal tocar no prato, desperdiçando a maior parte da comida. Para quê se preocupar, se quando voltar estará tudo arrumado de novo? Sai à noite para procurar diversão, é tudo o que sabe fazer. Essa diversão pode ser qualquer cousa. Tendo acreditado que é melhor do que algum grupo, por ver a mãe ralhando com a empregada que não adoçou direito seu suquinho, não custa tempo algum para se alinhar a grupos extremistas, passando a sentir prazer em agredir, especialmente porque se acostumou a sair impune. Bulling é arroz-com-feijão. A humilhação do outro passa a trazer um prazer indescritível, se houver suicídio simplesmente procura por outra vítima.

Mas um dia é pego e esquenta o banco de uma delegacia, e chora, chora, chora... Não de remorsos, pois não tem arrependimento do que tiver feito, não importa o que tenha sido, chora porque alguém mais forte (no caso policiais bem treinados) interrompeu sua diversão e fez-lhe uma reprimenda. Que absurdo! Coitadinho do meu filhinho! Tão inocentinho! Só estava se divertindo e a bichona o ofendeu moralmente, saindo de casa em plena luz do dia, se defendeu tacando gasolina e ateando fogo. O que é que tem de mais?

Embora saiba idiomas, cite escritores famosos, tenha uma longa lista de viagens, et cétera, et cétera, este primeiro tipo unificado não sabe absolutamente nada da vida real. Ele pensa que a única realidade que importa é a do seu conforto. O mundo aqui fora só lhe fará falta se não puder mais sustentar sua vida artificial, mas o mundo gosta das pessoas ruins e acha que as boas podem se virar sozinhas. As ruins são mais atraentes, simpáticas, elas se esforçam realmente para parecerem muito mais do que são, é um investimento pelo qual exigirão retorno concreto.
Este, aliás, um talento muito desenvolvido pelo revoltado, o segundo tipo.
Visando vôos mais altos, este tipo seduz, às vezes literalmente, para obter seus intentos. Depois, se os seduzidos não lhe servirem mais, os descarta. Mas faz parecer que não, que só está ocupado, para poder se reaproveitar depois. É um político inato. Tudo o que ele quer é ser mimado, como faziam seus pais, só que agora com roupagem de adulto, de homem sério. Por sua natureza praticamente cristalizada, tem simpatias por ditaduras, sejam de esquerda ou direita, depende da orientação ideológica que escolheu, não importa, importa que a idéia de ser perpétuamente uma autoridade, praticamente com título nobiliarquico, faz seus olhos brilharem. Para tanto consegue se programar e acreditar naquilo que diz, obtendo assim discursos inflamados, coerentes e altamente carismáticos.
O cérebro, caros leitores, é altamente programável, até mesmo na sua morphologia interna. Ele muda de acordo com aquilo que realmente queremos. Se alguém realmente quer acreditar que Stálin era um guardião do povo, ou que os mentores do golpe de 64 realmente queriam preservar a democracia, assim o será. O cérebro buscará as sinapses necessárias à alimentação da mais ululante e encerada retórica para que o discurso seja convincente. O cérebro é burro, e burros arrastam toneladas, quando bem alimentados.
Ele conseguiu enganar os pais (e estes se deixaram enganar), ainda cheirando a cocô, por que não enganará uma população que raciocina com o ventre e não sabe de seus podres? Mesmo que soubesse, ele daria um jeito de distorcer a verdade e fazer parecer que é aceitável ser podre.
Este tipo geralmente consegue se eleger, no mínimo alçar cargos indicados por sua boa margem de votação. Seus métodos diferem dos do primeiro tipo pela extensão do estrago causado, tendo basicamente os mesmos princípios e objectivos: eliminar a qualquer custo o foco de descontentamento, mesmo que com métodos de máfia. Ele não aprendeu a reconhecer a dor do outro quando criança, por que se importaria agora? Ameaçar a família, especialmente as mulheres, do desafeto é o de menos. A turma é substituída por capangas que, assim sendo, não dão nota fiscal de seus serviços e deixam poucas pistas de sua passagem.

O padre Alcides disse uma vez e estava coberto de razão, não existe pecadinho ou pecadão, quem rouba uma figurinha, um dia mata para roubar teu cartão de crédito. Muda o tamanho do estrago material e psicológico, o estrago social e político é exactamente o mesmo. Assim como os dois tipos citados parecem ter periculosidades diferentes, mas não é verdade. Um ameaça pela quantidade, o outro pela intensidade de seus indivíduos. Ambos desabonam os ideais democráticos. Ambos querem um sistema que lhes perpetue a boa vida e privilégios. Esquerda ou direita, não importa, ou acham que não há privilegiados em países ditos de esquerda?

Para haver uma democracia plena, mas longe da perfeição que está além do alcance da humanidade, é necessário que o cidadão se sinta parte de uma nação. É necessário que ele esteja ciente de que o que acontecer à mesma, se refletirá cedo ou tarde na sua pele. Nos países desenvolvidos é assim. O japonês se sente parte do Japão, o alemão parte da Alemanha, o americano parte dos Estados Unidos da América, o norueguês parte da Noruega e assim por diante. Neles, discursos separatistas viram piada, no mínimo. Seus defensores são vistos como ridículos e qualquer atitude para seus intuitos é imediatamente reprimida, como na vez em que um grupo de idiotas tentou cobrar pedágio dos compatriotas que entrassem no Texas. Um deles foi eleito pelo grupo como presidente o Texas e realmente se sentia presidente de uma república. Tipo dois.

O que temos no Brasil? Um monte de partidos. Só isso. Cada um tentando lotear os cargos do governo, quem não consegue faz a política do "quanto pior melhor" e que se dane o país. Enquanto uns fazem invasões e actos de vandalismo, outros anestesiam a população para que o joguete fique só entre eles. Ambos distorcem a realidade, transformando causas em princípio nobres em pretexto para cometer excessos, desde o legalismo extremo até a pregação da anarquia à força. Um usa o outro como pretexto para instaurar um regime autoritário. Eles precisam um dos outro... Não, na verdade são só dois braços de um mesmo corpo.

O estatuto do menor, que foi eufemizado um monte de vezes até chegar ao (inútil) "Estatuto da Criança e do Adolescente", como se ambos não fossem menores, deveria ter sido uma ferramenta para coibir abusos. Na prática só os transferiu de mãos. Se antes abusava-se de adolescentes, por ser aceitável pagar-lhes menos, hoje não se pode ensinar uma profissão a uma garota de doze anos. Até uma empresa familiar pode ter problemas com o juizado se alguém ver uma criança ajudando a varrer o piso. Um professor que exija o estudo a um aluno pode ser processado por humilhação, ainda que ele tenha sido o inverso. Se antes as famílias relapsas tinham maiores chances de desenvolver tiranos em casa, hoje todas estão expostas ao risco. Quem abusa de adolescentes não deixará de fazê-lo por causa da lei, ele geralmente tem costas quentes para isso. Eles sabem que não, mas alimentam a histeria dos dois extremos, é o que os mantém no poder. Assim fomentam mais gerações de crianças mal acostumadas, podam a boa índole dos que gostam do trabalho e mantém a população presa a problemas que não fariam diferença se não fossem alimentados. Ai de quem pegar uma criança para criar, tem que deixar na rua, à espera do conselho tutelar.

Os dois tipos têm uma grande facilidade em disseminar suas mentalidades tortas, enchendo os noticiários de barbaridades terceiromundistas; como atrocidades de trânsito, depredações, pixações, "pequenas" corrupções, desacatos a funcionários públicos de baixo escalão, enfim, cousas que fazem parecer pequenas diante de tantos problemas que assolam o país. Fazem as pessoas acreditarem que estes "pequenos deslizes" nada têm a ver com as mazelas nacionais, encorajando sua repetição. Quem não tem tendências à barbárie não vai aderir, mas será assolado pelos que têm e passam a ver com normalidade virar sem dar seta, ultrapassar pela direita, parar em local proibido, ligar o som no último volume, furar o sinal com pedestres já atravessando e assim por diante. Afinal, o mundo está tão caótico, por que não vão consertá-lo em vez de encher o saco?

O caro leitor já deve ter se pego na situação de pensar que está no país errado. Deve ter pensado que está cercado e sem chances de escapar. Pois é assim mesmo que funciona. Os dois tipos mandam, agressivamente, prestar atenção um no que o outro está fazendo, como se o erro do outro fosse pior. Uma das estratégias é manter um escabro na surdina até ser útil, ou inevitável, como as tragédias anunciadas no Rio de Janeiro. Quer saber? Eles estão rindo. Distraíram nossas atenções para as vítimas, depois para a burocracia burra e inútil que está emperrando a entrega de doações, quando nos demos conta aprovaram vantagens para si mesmos em um processo vicioso de legislatura (sempre) em causa própria.
Então vem alguém dizer que na época da ditadura não era assim, como se na época a mídia pudesse noticiar o que quisesse. Mas fala de seu contexto pessoal, ou do que leu em algum jornal tendencioso, muitas vezes sem ter conhecido a época. Os meios de comunicação não ajudam, bastando ver o nível de imbecilidade dos programas, com especial caráter emburrecedor dos reality shows. Logo em seguida o telejornal apresenta um desfile de catástrofes, que te faz ter vontade de voltar para as amenidades e permissividades estúpidas daquele programa inútil.

Sim, caro leitor, teu raciocínio está correcto. Os dois tipos também têm influência na mídia, e muita. Tu, que se sentes parte do país e responsável por ele, és uma ameaça à boa vida dos mimados que estão no poder. Eles usam a democracia como simples instrumento para acalentar o sonho de instaurar uma ditadura. Para tanto precisam desmoralizar as instituições, como correios e polícia, para que o povo se convença de que não sabe e jamais saberá votar. Tua vontade de ver a cidade limpa e segura se choca com a vontade que eles têm de se divertirem sem medir conseqüências. Teu hábito de se abaixar para colocar um papel na lixeira é um ofensa aos que jogaram o papel na calçada. Teu sonho de ver este país no primeiro mundo te torna um inimigo potencial desta gente. Tua naturalidade em ajudar nas prendas domésticas insulta a mentalidade misógina dessa gente. Não ser igual a eles é ser seu oponente. Não, não estou exagerando nem um pouco, estou sim poupando-vos de detalhes sórdidos desnecessários.

Para terminar, tudo isto começou em casa, quando a criança ainda podia ser corrigida. Não que se possa transformar um sujeito turrão em um Chico Xavier da vida, mas pode-se ensiná-lo a controlar suas tendências. Recebendo limites em casa, ninguém vai testar os do mundo.
Criança que aprende desde cedo a trabalhar em casa, e eu ajudo desde os cinco anos, aprende também a se portar civilizadamente no mundo.

04/02/2011

Disciplina não é terror

Infância tem que ter cor, cheiro e sabor.
Há nos Estados Unidos um movimento chamado “Mães-tigre”, que em resumo tentam moldar os filhos na marra às suas expectativas. Proíbem que brinquem, que tenham amigos, que expressem suas preferências. Exigem que sejam sempre melhores que todos os outros em que circunstâncias forem, sob pena de punições severas. Devem tirar sempre dez, só entrar em uma brincadeira para vencer, só voltar para casa com medalhas de ouro.


Quem pensa que me conhece até acredita que eu aplaudo isto. Pois eu deploro.


Há uma diferença aparentemente tênue, mas muito sólida entre disciplina e neutralização da personalidade. Isto é o que estas mães chinesas estão fazendo. Elas querem que os filhos realizem os sonhos delas, que sejam o que elas querem que sejam, danem-se os petizes e seu sofrimento. Querem que sejam formados em Harvard e em primeiro lugar.


Direi o que essas mulheres estão fazendo, estão transformando crianças em monstros insensíveis ou em bonecos de marionete sem personalidade. Não dá para todos eles serem o número um, simplesmente porque só há um lugar. Estas crianças se acostumarão a ver qualquer pessoa como uma ameaça ou inimigo, que deve ser subjugado ou eliminado. Até Wallstreet está vendo com maus olhos o excesso de competição, que acaba arruinando as empresas por dentro, pela rivalidade que gera entre os funcionários. Competição é boa em certos lugares, certos horários e até certo ponto. Exigir que a pessoa seja melhor do que todos em tudo, desde a mais tenra idade, é patológico. Só para constar, mamar não é fraqueza da criança.


Para quem não sabe, nos países (como China, que certamente incentiva este disparate) autoritários, onde esta prática é tolerada pelo Estado, o índice de suicídio de crianças é imenso, e ninguém estranha. Brasileiros que viveram lá por algum tempo descrevem horrores medievais à psicologia das crianças. Formam soldadinhos prontos para fazerem o que seus comandantes ordenarem, sem contestações... Ditaduras fazem isto sem o mínimo de vergonha. Não quero iniciar uma teoria de conspiração, mas estas mães chinesas estão me parecendo muito bem orquestradas. Formar levas de pesquisadores em universidades realmente de ponta, como Harvard e Princeton, é o sonho de toda ditadura. O facto de as crianças rapidamente perderem totalmente a vontade de viver não importa a esta gente. Ditadura é sempre igual, de esquerda, direita, de cima ou de baixo, elas são todas iguais.


Vou falar de dois gênios da humanidade, sem os quais o mundo de hoje simplesmente não existiria. Einstein foi considerado um aluno medíocre e pouco inteligente. Gostava de divagar por horas e estava longe do que as tais mães-tigre querem que seus filhos sejam. Ele era considerado distraído e os professores não viam nele um futuro que valesse à pena. Pois o aluno medíocre e pouco inteligente calou as bocas dos céticos de sua época, provando que a matemática newtoniana não poderia ser aplicada além de certos limites. Graças à Deus as antas nazistas não deram crédito às pesquisas de um judeu desengonçado.


Edison se irritou profundamente com a rigidez (não confundir com rigor) com que os reverendos “ensinavam” às crianças, impondo tudo sem se importar com as diferenças de capacidade e modo de aprendizado de cada uma. Foi chamado de preguiçoso e o resto nós sabemos, passou a estudar em casa, sob a tutela da mãe. Embora exigisse resultados, ele nunca pressionou seus colaboradores como as mães-antas fazem com suas crias. Edison tem mais de mil patentes. Sua importância para o mundo foi tamanha, que sua morte, em 1931, fez os Estados Unidos apagarem suas lâmpadas por um minuto.


Todas as pessoas felizes e bem resolvidas que conheço, e de quem ouço falar com alguma profundidade, tiveram em suas infâncias o equilíbrio do rigor com o lazer. Elas tiveram lazeres, fizeram besteiras, aprenderam com seus erros e pagaram por eles na medida do razoável. Tornaram-se adultos felizes e úteis à comunidade. As mães-mongas se esquecem, talvez nem se importem, que é brincando à sua maneira que a criança aprende a ser adulta. A brincadeira é uma preparação para as obrigações da vida adulta. Aos que não sabem, digo que em colégios militares, à margem do que a disciplina rigorosa pode aparentar, os alunos brincam durante os recreios. Os soldados mesmo, nos quartéis, têm vários momentos de descanso e lazer. Por que? Porque um bom comandante sabe que o esgotamento físico é um inimigo traiçoeiro, que pega a tropa desprevenida ao menor descuido de seus oficiais. E mais, soldado feliz é soldado motivado, disposto a dar mais do que simplesmente sua obrigação pela pátria e pelo seu povo. Ok, podem tocar o hino da independência, fui fundo nisto. Mas é tudo verdade. Não, não sou militar.


O que me parece, é que essas parideiras querem ter alguém que lhes permita olhar os outros de cima, querem que os filhos sejam seus pedestais. Se importam somente consigo mesmas. Pela intimidade que adquiri com o tema “política”, acredito piamente no incentivo estatal natal a este comportamento.


Quando ouvi falar pela primeira vez a respeito dessas mulheres, acreditei que talvez fossem úteis à cultural negligência dos americanos na disciplina de seus filhos. Pois o que as imbecís estão fazendo é somente revoltar as mães e dando corda para as relapsas, que a esta altura do campeonato já vasculharam a internet e têm dados para sustentarem o modo solto com que criam seus filhos. Crianças precisam de limites, sim, mas também para suas obrigações. Elas devem aprender a escolher seus caminhos e arcar com eles, devem aprender a cair e se levantar, errar e corrigir seus erros, aprender com os erros para acertar, tudo isto antes dos dezesseis anos, porque depois não haverá mais margem para ensaios. Crianças que só aprendem a receber ordens são pratos cheios para corruptos e fanáticos, enxergam em sua competitividade desmedida qualquer um como obstáculo a ser superado. Em dado momento a mãe-mula também pode ser vista como obstáculo.


Lembrei de outro exemplo, Bill Gates. Para quem acha que liberdade de expressão e escolha fada a criança ao fracasso, nunca ouviu falar deste homem. Não imagina o ambiente de trabalho que há em suas empresas e o quanto ele se tornou útil à humanidade, financiando pesquisas de medicamentos e tratamentos para doenças, tudo a fundo perdido. Gates, em um discurso em 2007 deixou claro seu descontentamento para com a frouxidão da educação das crianças americanas, mas me consta que ele respeita as decisões e escolhas de seus filhos, e faz tudo o que pode para que eles aprendam enquanto podem os valores que quer passar, porque de sua fortuna eles verão no máximo dez por cento. Algum jornal anunciou maus-tratos ou privação de liberdade na família Gates? Eles estão sendo bem preparados, com a disciplina e o carinho de que precisam. Não um ou outro, mas ambos. Mas claro que isto não interessa às mães-de-rapina, elas querem que os filhos sejam úteis somente aos seus propósitos, e aos do partido. Ninguém me convence de que não há mão política nisto.


Rigor e respeito não são antônimos. Respeitem-se os limites de cada fase da vida, dêem a disciplina de que a criança precisa e até pede de modo subjetivo, sejamos pais e não simplesmente pagadores de mesadas ou torquemandas para nossos filhos. Método e organização são bons alicerces para educar uma criança, isto eu vi na prática, não em livros retóricos de gente que se tranca em laboratórios e tira conclusões alheias à vida que corre aqui fora. O estilo varia muito, pois pais e filhos são pessoas, portanto diferentes entre si e dos outros. Não se pode esperar que um Homer Simpson aja da mesma forma que Johathan Kent,  mas ambos podem ser bem sucedidos na criação de seus filhos. Certo, não dá para comparar Clark a Bart, mas dentro do que cada um pode ser útil, este também pode ser bem sucedido. Ele pode ser um diplomata, com toda a malandragem que lhe é particular, enrolaria todo mundo e não cairia nas armadilhas típicas do ramo.


Deixem as tigresas nas selvas. Na civilização as crianças precisam de mãe-gente.