26/04/2009

Meu manual do homem romântico

Para começo de conversa, assuma a mulher, com todos os defeitos e todas as qualidades, com a família por perto e sabendo dos amigos que ela tem. Sem isto, nada feito.
Não adianta inventar apelidinhos fofos e constrangedores, chamar de "Momoca", "Bunzunguinha" ou qualquer outro que (se eu fosse mulher) me faria dar um tempo na relação; leia-se: dar o fora. Apelidinhos são muito bons na adolescência, nem sempre em público e dificilmente sobrevivem à fase adulta... Graças à Deus. Apelidos fofos são muito bons para personagens de anime, na vida real eles quase sempre caem no ridículo.

Um bom apelido não é inventado, ele está na cara da pessoa e surge aos poucos para os mais atentos. Uma amizade de longa data ajuda muito a encontrar bons apelidos, mas infelizmente a maioria dos casais não consegue ser também de amigos. Infelizmente porque com os anos é a amizade que sustenta o casamento. Sim, meus caros, casamento. Se isto está completamente fora dos teus planos, desculpe, entraste no blog errado.

Não queira tornar tua amada uma inútil, cercada de confortos e privada de iniciativas relevantes. Ela e a vida vão lhe cobrar os tributos dessa arrogância. Tampouco deixe-a desamparada, ajude-a a quitar suas dívidas, mas é para ajudar e não pagar tudo por ela. Isso tanto a faz se sentir útil quanto faz um belo polimento na tua imagem, tanto para ela quanto para a família dela.

Há uma diferença muito grande entre ser Homem e ser macho. Qualquer animal pode ser macho, grosseiro, brigão, promíscuo, et cétera. O homem sabe qual cabeça deve comandar qual, sempre escolhendo a de cima, para que a de baixo cumpra suas funções sem pôr tudo a perder. O homem comanda o animal que lhe serve de corpo, usa os instintos em vez de ser usado por eles, honrando a lenta e dolorosa evolução pela qual nossa espécie passou. Se tu aprendes isto, já és um romântico.

Minha noção de romantismo não tem a ver com as viagens na maionese que muitos divulgam. Lembremos que ainda andamos sobre a terra, precisamos do chão firme para nossos pés; às vezes de água limpa para nadar também, mas esta é outra conversa. Minha noção de ser romântico é baseada na entrega, fazer tudo o que estiver ao meu alcance para amparar e dar um pouco de alegria. Quase sempre o facto de estar por perto e disponível é suficiente. Muitos homens têm arrepios de ouvir uma mulher desabafando, o que contraria a regra básica se ser amigo de seu par, sem o quê um casamento fica na corda bamba. Se quer que ela aceite a presença dos teus amigos e as bobagens que falam sobre futebol, então aprenda a aceitar as bobagens dela também. Usar um peso e uma medida alimenta tanto o respeito quanto a confiança mútua, e ela te deixa sair com eles sem policiar teus passos.

Ouvir e se fazer presente, quando necessário, equivale a ter um médico por perto atentando aos menores sintomas, pode até prevenir um suicídio.

Gentilezas são um indício de civilidade, algo que tornaria o mundo um lugar seguro para se viver, imagine então os efeitos delas em uma casa. Não peço que a leve a um restaurante caríssimo, simplesmente que alivie o trabalho doméstico. Prendas domésticas são importantes, ajudam a valorizar a família e educar (sendo o caso) os filhos. Trabalhar junto dela, em casa, estreita os laços e faz a tua presença ser mais importante, a ponto de uma ausência breve ser sentida. É a diferença entre ela dizer "Ah, enfim sozinha" e "Ele está demorando (após cinco minutos de ausência)".

Voltando ao primeiro parágrafo, assumir significa também fazer escolhas. Tens amigos, tens hábitos arraigados, tens toda uma história de juventude. Não precisa abrir mão, mas precisa saber que existe uma diferença entre um casal e dois solteiros. Meu querido, um casal é um compromisso. Em maior ou menor escala, algumas cousas mudam, o par precisa da tua atenção. Não se casa com o futebol, muito menos com prostitutas que colegas secundaristas costumam arranjar. Algo vai mudar ainda na fase do namoro sério e vocês dois terão que dar conta disso. Amigos terão menos tempo, farras terão menos tempo, enfim, se ainda não amadureceram a maturidade vai entrar à força. Aprenda a abrir mão de um pouco, para não perder tudo.

Eu já disse em um monte de lugares, um monte de vezes o que constatei ao longo da vida: machismo é homossexualismo enrustido. Então deixa de ser fresco e aceite as delicadezas que ela te dispensar. Tu não se garantes? Pois deixe ela te pentear, fazer tuas unhas, te hidratar, que ninguém precisa ficar sabendo e se souber, vais descobrir quem realmente são teus amigos. Tu abre mão de um pouco agora e ela abre mão de um pouco depois.

Por falar em delicadezas, as tradições dos realmente antigos valorizavam delicadezas e as coisas belas, o que o encrudescimento da idade média transformou em futilidade. Não entrarei em méritos e não farei um tratado a respeito, é assunto para um livro inteiro. Apenas digo que são muito importantes, fazem toda a diferença e hoje em dia evitam que as potências mundiais se destruam umas às outras. Sensibilidade e sofisticação são essenciais, não repitamos os erros medievais e não as misturemos com caprichos fúteis, pois as mulheres conseguiram preservar a essência de tudo isso e gostam de tudo isso. Colares singelos, uma blusa florida, sapatos baixos para ela descansar seus lindos pezinhos são artigos de baixo custo que farão seus olhos brilharem. Não só isso, ela vai querer mostrar para todo mundo o que ganhou, vai repetir teu nome uma centena de vezes e fazer a tua boa fama. Mulheres sabem se vingar, mas também sabem agradecer como nenhum homem consegue. Também são mais práticas do que podes imaginar, o que lhes rende a pecha de interesseiras, quase sempre injusta.

Aprender a cozinhar é importante, tanto para quem mora sozinho (e não quer ir à falência em restaurantes) quanto para quem quer tomar um rumo na vida. O de baixo não vai cair se comprar e ler um livro de receitas, pelo contrário, vai até ficar mais activo com a alimentação mais saudável. Então, depois de descobrir que a massa não pode ficar ad infinitum no forno, cozinhe para ela. Faça um lanche para ela, acostume-a a te ver como parte importante de sua vida. Ela não tem muito tempo para sair do trabalho e almoçar decentemente, prepare um bom grelhado, junte alguns legumes, um pão recheado, uma fruta e faça a surpresa, leve-lhe um almoço feito com todo amor e que custaria os olhos da cara no restaurante. Ser romântico é também ser útil sem que ela precise pedir.

Seja honesto, não minta para ela. É horrível descobrir que não se pode confiar na pessoa que te abraça todos os dias, com quem nenhuma intimidade é segredo.

Aprendido tudo isso, pode decorar e redigir poemas, aprender música, cantar para ela, levá-la ao restaurante e tudo mais. Depois de assumir tua mulher, o que é muito mais trabalhoso do que quem está de fora pensa, então podes passar para os detalhes. Boa sorte.

18/04/2009

Respeito

Começa com a tolerância. Tolerar que o outro tenha seu espaço (físico ou não), que pense diferente, que se vista diferente, que goste de cebola, que veja desenho animado depois dos quarenta anos et cétera.
Então vem o acolhimento. Além de aceitar o jeito do outro, aceitar o outro com os seus jeitos e trejeitos. Tolerar suas "estranhezas" aceitando também sua presença, porque é muito fácil tolerar os defeitos dos outros do outro lado do muro. É muito fácil aceitar o filho gay do vizinho, se ele continuar na casa do vizinho.
Respeito é noventa por cento ação, dez por cento palavras. Dizer que não quer incomodar, mas ligar o som no último volume não é respeito. Os outros não são obrigados a ouvir as tuas músicas. Nem na rua, nem em casa.
Respeito se aprende com exemplos. Dizer "Faça o que eu digo, não faça o que eu faço" é compreendido como "Se tu és mais forte, tu podes". Pois um dia a criança fica mais forte do que o pai e faz o que ele fez, talvez até pior.
Dizer que o sujeito é estranho não causa incômodo, tratá-lo como estranho causa. Dizer que é estranho, pode render piadas e até gerar simpatia; tratar como estranho, pode render zombarias e se ganha um inimigo de graça. De perto, ninguém é normal, alguém sempre será estranho em algum lugar.
Daí vem mais um ingrediente do respeito: Colocar-se no lugar do outro. Quanto maior for a prática, maior a capacidade e maior a compreensão. Esses moleques inúteis que vivem quebrando boates e batendo em gente pobre, são incapazes de se ver na pele do outro, são incapazes até de se verem sem um espelho. Não se respeitam.
Respeito é noventa por cento ação, dez por cento palavras. Respeito se ensina respeitando. Nenhuma criança que cresce sendo humilhada e preterida vai conseguir se respeitar, dificilmente conseguindo respeitar o próximo também. Há exceções, mas uma exceção não pode servir para medir a regra.
Respeito não é só obediência, muitas vezes é comandando que se demonstra o devido respeito. Por isso a maioria dos chefes é odiada, enquanto uma pequena parcela caminha entre os subalternos como se estivesse em casa. Empregado (e soldado) desrespeitado conhece em detalhes a rotina e as dependências de onde trabalha. Respeitar não é ser bonzinho, basta ser justo. Justiça e respeito são sinônimos.
Não é preciso tentar gostar, aderir ou agir contra a própria natureza. Sei o quanto é difícil um tiozão assumido (como eu) se comunicar com alguém que solta gírias a torto e a direito, como se a língua portuguesa se resumisse a elas. Visualmente me incomoda quase tudo o que está na moda. O que hei de fazer? Chicotear todo mundo até que reaprendam a ser como eu? E por que deveriam ser como eu? Em que isso melhoraria essas pessoas e a mim mesmo?
Sou um tanto pragmático e não gosto de desprender esforços para o que não dá resultados plausíveis. Fazer todos acreditarem que estou certo, não resolve o problema. E, francamente, ver uma amiga usando uma camisa que parece ter sido recortada de uma cortina de cozinha, não constitui um problema. Nem o facto de ela gostar da noite, ao passo que eu sou bicho do dia, acordo antes do sol. Por ser pragmático, gosto de resolver e não inventar problemas. Problemas aparecem sozinhos, sem nossa intervenção. Se quero resolvê-los, é preciso respeitar o problema, sem achar que sou o único em todo o universo com poderes extraordinários para solucionar tudo a contento. É achando que muita gente se perde.
Primeiro é preciso ver o que realmente é um problema e o que é simplesmente desagradável, o que nos é simplesmente desagradável pode ser contornado ou evitado. Em se detectando o problema, é preciso ver quem está por trás do problema, e respeitá-lo se quisermos obter cooperação. Cresci em quartéis e sei a diferença que faz uma abordagem; quem gosta do ofício de policial sabe abordar; quem gosta dos poderes de policial só faz asneiras, esquece quem paga o salário de quem e denigre uma corporação inteira. Gostar do ofício e gostar do poder têm uma fronteira muito tênue e nebulosa, fácil de ser ultrapassada, e isso vale para qualquer profissão.
Quanto maior o poder, maior o respeito que se deve demonstrar. Cargos públicos são exemplos claros de em que tipo de gente a população se espelha para agir como age, no dia a dia. Uma criança em tenra idade não sabe nem onde está o próprio nariz, é contra senso exigir-lhe respeito. Um adulto, pelo contrário, principalmente se for instruído, tem (de leve) consciência de si e do outro, sabe que alguém vai penar se parar o carro diante do rebaixamento da calçada. Se ele pratica respeito, vai se colocar no lugar do cadeirante e se tocar. Um adulto é um líder, queira ou não, e os exemplos do líder são sempre copiados.
Deus tem o exemplo perfeito de respeito. Mesmo sabendo do quanto somos estúpidos e infantis, respeita nosso livre arbítrio até que aprendamos com nossos próprios tombos e hematomas. E um dos aprendizados mais importantes, é o respeito para com o próximo e para conoso.
Não custa lembrar: Respeito é noventa por cento ação, dez por cento palavras.

11/04/2009

16km/h

16 km/h. É esta a velocidade a partir da qual um acidente pode matar. Parece pouco? Pois nós somos frágeis mesmo, não importa que seja o Lou Ferrigno, a desaceleração brusca afeta o cérebro e outros órgãos vitais do mesmo jeito. Eles não ficam mais fortes com musculação.
E pensar que as pessoas, mesmo quando podem pagar, dispensam air bag e freios ABS, só porque não podem exibir para suas turmas.
Não se pode esperar muito de quem acha que vai conseguir burlar as leis da física, da mesma forma como burla as de trânsito ao fingir que atou o cinto de segurança. Alguém aí já viu gente voado pelo pára-brisas? Bicho, é bizarro! Parece uma comédia de mau gosto que vai acabar assim que entrarem os comerciais, mas não acaba. Ainda que resulte (e freqüentemente resulta) no óbito da vítima, a família e o erário público continuam sofrendo.
Mas por que esses dois equipamentos ainda são tão caros no Brasil?
Resposta: Produção. Uma empresa investe milhões de dólares para desenvolver um equipamento sofisticado que funcione direito, quanto mais unidades ele puder vender, menor será o peso do investimento sobre cada unidade. Acontece que por aqui isso está engatinhando, o que já encareceria, sendo agravado pela rejeição do brasileiro a tudo o que não for estético e de entretenimento. Os bocós gastam seis mil reais em som, inutilizando completamente metade do carro, mas não pensam em gastar cinco mil a mais para comprar um novo que já venha com ABS e air bag. A mim, soa como suicídio.
Quem pode comprar um carro novo à vista, não deveria se incomodar com os custos de equipamentos de segurança. Quem compra financiado, não deveria se preocupar com os poucos reais diluídos ao longo das prestações.
As seguradoras também não colaboram, cobram mais porque são mais componentes para consertar, em caso de acidente. Mas se esquecem que esses equipamentos as poupam de pagar indelizações por invalidez ou óbito, que são mais caras do que o conserto de uma dianteira arrebentada.
A partir de 2014, todos os carros nacionais sairão de fábrica com esses dois salva-vidas. São cinco anos de espera e uma frota abarrotada de carros que já poderiam contar com eles. Na realidade, apesar de as engenharias dizerem o contrário, acredito que mesmo a kombi poderia recebê-los. ABS não exigiria grandes modificações, o air bag depende da desaceleração causara pela deformação da dianteira para calcular quando e o quanto inflar as bolsas... Cá com meus botões e meus vinte e tantos anos de praia no ramo, vejo várias maneiras de adaptar com sucesso satisfatório. Uma delas (e das mais em conta) é uma dianteira suplementar que funcione como um colchão de fibra de vidro; de quebra melhora a aerodinâmica da Kombosa.
Por mais desagradável que seja, a única forma que vejo para incentivar a compra (e antecipar os benefícios da obrigatoriedade) de carros com ABS e air bag, é chocando. Não com excessos e o mau gosto com que as campanhas oficiais sempre pecam, mas dando a entender com mensagens claras. Uma mãe não precisa ver uma criança presa e desfigurada entre ferragens para imaginar que poderia ser seu filho, bastaria ver outra mãe desesperada e bastante machucada. Isto por si já dói muito, mas não vejo lugar, ao menos por agora, para sutilezas na educação dos motoristas brasileiros.
Eu sei que muita gente vai me xingar, me chamar de chato, estraga-prazeres, et cétera. Mas ser chato faz parte das minhas atribuições, então continuarei sendo chato e, mesmo sabendo que a adesão será pequena, insistirei na mensagem deste texto.
Os ônibus são um problema particular. Se já é quase uma utopia fazer os passageiros usarem os cintos que cada banco tem, imaginem colocar ais bag para cada um deles. Agora imaginem fazer isto em um ônibus urbano. Dá para colocar bolsas infláveis do tipo cortina, para evitar que as pessoas sejam arremessadas pelas janelas ou batam com força nas vigas da carroceria, mas a rigor só o motorista poderia contar com o benefício. Usar bancos infláveis seria uma boa idéia, não só para a segurança, como para reduzir o peso, mas dificilmente resistiriam ao vandalismo, outra praga recorrente nos países subdesenvolvidos. Ou seja, o trabalho de conscientização é mais amplo do que a esphera do Contran.
Pasmem, já existe air bag para motos. Não tenho notícias de onde ele seja obrigatório, mas não imagino uma Mobilete com uma tralha dessas naquele arremedo de painel, com certeza teria que ser do tipo colete-salva-vidas, acionado quando o piloto se desprendesse do veículo, o que mesmo assim gera o risco de não ser utilizado, mesmo sem querer, pela não fixação da cordinha no tanque ou onde quer que esteja o ponto de ancoragem.
Mas em carros não há desculpas. Mesmo em mini buggyes é possível instalar todos os equipamentos de segurança existentes. Todos.
Então vai meu apelo aos que vão comprar carros novos: Esqueçam um pouco o valor de revenda (que é efêmero e depende da moda) e atentem para o valor da vida. ABS e air bag ainda são caros, mas não são acessórios.

04/04/2009

Motivação? E o bolso?


Não é conversa de sindicalista partidarista. Já participei de um monte de palestras motivacionais, cursos motivacionais e já recebi um monte de mensagens motivacionais. Agora estou desmotivado até a aceitar outro convite.

Já ouvi histórias e estórias de palestrantes, a do faxineiro da Nasa, a da formiguinha, do ratinho que salvou o leão, do garotinho que ia descalço para a escola e hoje é milionário, de Bill Gates, de Henry Ford, Fred Astaire, da tonga da mironga do cabuletê.

O que esqueceram de dizer: o faxineiro da Nasa ganha mais que muitos professores universitários no Brasil, a formiga é um robozinho biológico sem livre arbítrio, o ratinho ganhou a proteção de um rei, o garotinho virou magnata, Gates virou magnata, Ford virou magnata, Astaire virou magnata e amigo de Grace Kelly. Ou seja, eles tiveram resultados práticos para o que planejaram. Houve recompensa pelos seus esforços, exceto a formiga, que é um robozinho.

O que pensar então de empresas que exploram seus funcionários até a medula, que não dão a mínima para seu aperfeiçoamento profissional, que trapaceiam (quando dão) nas horas extras e vetam completamente as chances de eles crescerem lá dentro? Fazer a secretária usar shortinho até estimula a freqüência, mas só a masculina e não garante produtividade.

Funcionário que não sabe se vai ter dinheiro para comprar o medicamento de tarja preta para a esposa, não se concentra direito no emprego, se concentra em conseguir o dinheiro de que precisa. Nem sempre pesando os meios.

Quem não tem perspectiva alguma de melhorar seu padrão de vida, ainda que a longo prazo, fica insensível a qualquer que curso motivacional. Até aproveita o oba-oba que os palestrantes costumam fazer, mas tudo se dissipa assim que a euforia passa e o curso termina.

Quando volta para seu posto de trabalho e vê que tudo está exactamente igual, ou até pior, esquece imediatamente o que aprendeu. Por que só ele tem que se esforçar? E a empresa faz o quê? Circo de terno e gravata? Uma festa todo fim de ano sairia mais barato e daria muito mais resultados.

Com o passar dos anos e dos "cursos", o funcionário vai decorando cada fala, cada gesto, cada estorinha. Quando aparece algo de novo, geralmente é só roupagem nova. O mais importante ele não vê: resultados. E não vê simplesmente porque não tem, porque a empresa pede todo aquele dinamismo para o qual não oferece as mínimas condições.

Vamos ver a situação dos funcionários públicos: após três anos ganham estabilidade, na prática não podem ser demitidos por incompetência; não ganham horas extras, não importa quanta diferença para melhor isso faça ao órgão de lotação; não podem ser promovidos, salvo situações extraordinárias que eu jamais presenciei; faltam até três dias por mês sem precisar justificar; convivem com comissionados que grudam chiclete embaixo da mesa o dia todo e ganham o dobro do salário; quando querem trabalhar, são emperrados pela burocracia e até mesmo por sindicatos que visam unicamente cargos eletivos. Qual, então, a motivação? Só os de má índole ficam satisfeitos com essa situação, é o ambiente perfeito para se corromper um funcionário, se é que não é este o objectivo de quem elabora esses estatutos.

Palestras de aprimoramento são uma boa idéia, quando acompanhadas da contrapartida. Ensinar o porteiro a controlar a respiração, demanda um espaço e uns minutos para a prática diária. Quando se fala de um magnata que nasceu no aterro sanitário, imediatamente o ouvinte imagina o Rolls Royce dele, não o berço feito com caixa de papelão; ele foca onde quer chegar e espera (já que foi convidado) alcançar. Mas sai da palestra e vai mofar meia hora no ponto de ônibus, mais uma hora dentro do ônibus e uma caminhada do pondo de descida até o barraco onde mora. Alguém lá falou em auxílio (mesmo que meramente de consultoria) para conseguir morar mais próximo do emprego? Poucos falam. Eu mesmo não conheço um.

Um aceno de possibilidade de ascenção, pelo menos. Ninguém trabalha direito sem perspectivas. É pedir que se plante no cimento, sabemos que as sementes vão até brotar, mas não vão sobreviver.

Dar chances claras e iguais para ascenção interna, funciona muito melhor do que qualquer palestra com um careteiro pulando lá na frente. O funcionário vê a perspectiva, ela é tangível. Mas nada substitui a certeza de poder usar as férias para descansar, não para arranjar um biscate e complementar o orçamento do ano.

Já trabalhei em tantos lugares que nem me lembro mais, mas em um ponto todos se parecem (com uma única excessão) até o actual; pedem motivação, mas não oferecem motivos. Para a maioria, que vive com a corda no pescoço, motivação é dinheiro no bolso.