23/11/2017

A Maldição dos Templos - resenha

   



    Demorei, mas li o quarto livro da saga OS DRAGÕES DE TITÂNIA, do meu amigo Renato "Matthew" Rodrigues. Não é por ser meu amigo, mas o sem-vergonha sabe escrever!


    Aos desavisados, este livro pode parecer mais do mesmo, mas devo lembrar que não se trata de uma série de histórias sobre a ordem paramilitar, cada livro é uma parte da longa história; se ele fosse colocar tudo em um livro só, seria um catatau imenso e pesadíssimo, que ninguém conseguiria ler. E sim, "A Maldição dos Templos" é o arroz com feijão que ele sempre serve, mas cada livro tem seus temperos e seus acompanhamentos. Não só isso! Este livro faz jus e dá seqüência com trema prefeita aos anteriores. Um leitor novato poderia devorá-lo sem medo de não entender a trama, mas conhecendo os outros, o sabor é mais refinado.

    E por falar nisso, o refinamento da história merece um comentário à parte! A necessidade de administrar a quantidade crescente de personagens, sem que um se pareça com os outros, sem trocar nomes e sem atropelar o modo de vida de cada um, demonstra o profissionalismo e a organização que se escondem no jeito debochado de ser do autor. E nenhum personagem é supérfluo! Todos eles, mesmo os figurantes, têm suas funções, por mais efêmera que seja a participação. Entre os principais, o leitor pode ser pego de surpresa, ao se defrontar com um sujeito que não dá as caras há livros!

    Diga-se de passagem, este livro tem surpresas agradáveis para os que sentiram os lutos dos amigos. Certamente não da maneira como gostaria, mas o sabor desse acepipe de acompanhamento é igualmente aprazível, e dá sinais de que será servido novamente em outra oportunidade; só não me perguntem quando; mesmo que eu soubesse, não diria ainda que um cinísio halterofilista me ameaçasse.

    O que temos de particular neste quarto livro, é o modo lépido e consistente com que o autor aborda a corrupção, e se embrenha nas suas causas expondo a sordidez como algo arraigado no cotidiano de um corrupto, pois mais do que a ganância, é necessário haver o completo desdém para com a vida alheia para alguém se corromper. Boas intenções não resistem à primeira vantagem ganha de modo torpe. Isso inclui a forma didática e eficaz como ele mostra a formação de um monopólio, baseado em um problema que o próprio corrupto ajudou a formar. Qualquer semelhança com a política brasileira NÃO É mera coincidência! Renato tem se indignado de modo contundente, nos últimos dois anos, em uma seriedade em que ele quase não se faz reconhecer.

    O mais interessante, é que esses quatro livros compreendem o tempo de pouco mais de um ano. Daí não é de o leitor se espantar com o tamanho e a quantidade de arestas ainda por aparar, que todos os personagens têm uns com os outros. A coisa é muito recente, compreendem? Eles não conhecem todos os defeitos dos parceiros de ordem, ainda há muitas esquisitices para cada um revelar aos outros e, diga-se de passagem, vocês não devem cair na armadilha de acreditar que já conhecem o senhor Augustos Máximus Khosta. Saber que ele é um baita nó cego e um grandicíssimo safo, é tudo a que vocês podem se apegar.

    Outro tempero próprio deste livro, é que o amor está no ar. Não só a paixão complicada entre uma freira nórdica e um príncipe misterioso, mas a coisa pega fogo... ou quase... bem, em dados momentos, pega fogo mesmo, mas podem tirar seus pégasos da chuva, não é nada impróprio para menores. Seus mentes poluídas!

    Em alguns momentos, parece que um caso vai se resolver, que um ou dois vão se entender com os pares, mas a coisa fica na promessa. Não de graça, é claro, afinal os figurantes querem seus cachês! O costumeiro gancho que Renato sempre dá para o próximo livro, neste foi replicado várias vezes. Há personagens antigos que não davam as caras há tempos, há personagens novos que deixaram marcas cordiais em suas curtas aparições, em ambos os casos eles ainda têm o que fazer nesta saga, e podem reservar seus exemplares do quinto livro, porque eles serão importantes.

    Como sempre, claramente auxiliado pela primeira dama da magia brasileira, Renato nos dá algumas lições que, façam o favor, não me digam que vocês não notarão! Eis algumas:
  • Às vezes as aparências não enganam! O que (ou quem) parece ser ruim é realmente ruim, mas quase sempre esconde o seu pior para quando for dar o golpe, então não meça prudência se precisar lidar com gente assim;
  • A diferença básica entre um parlamento e uma arena de luta, é que o lutador se apresenta quando vai dar o golpe, o parlamentar se apresenta quando o golpe já foi dado;
  • Não superestime sua capacidade, não importa o quão grande seja, de reconhecer o perigo. Sempre haverá alguém mais perigoso e experiente do que você, e vai te enganar direitinho! Tenha sempre um pé atrás e um punhal oculto para se defender;
  • Nunca tente completar, por falar nisso, o que o outro está tentando dizer. Em vez de ajudar, pode deixar o outro mais nervoso e atrapalhar ainda mais o seu julgamento. Ajude, se for necessário, mas não tente fazer por ele o que só ele deve fazer;
  • Os motivos do outro, especialmente se for um pai de família desesperado para não perder sua casa! Por mais baixo que ele PAREÇA estar descendo, o facto consumado pode ser o exacto oposto do que você está pensando;
  • O fanatismo não desaparece se seus fundamentos forem proibidos, pelo contrário! Uma população desprevenida e crente de seu desaparecimento, é incapaz de evitar que ele se ramifique; então não reclame dos idiotas se mostrarem como são, nas redes sociais, incógnitos eles são mais perigosos;
  • SEMPRE, mas SEMPRE MESMO, desligue o corrector automático do Office! Ele não sabe que não precisa colocar todas as palavras de uma oração na mesma concordância em que uma das trezentas foi colocada! Ele é burro!
    Sem mais, meus queridos, é mais uma obra literária de entretenimento com boas lições morais enxertadas, digna do nosso bom amigo! Eu recomendo!

    Agora só mais uma coisa... De onde surgiu em minha cabeça, a musiquinha irritante e TOTALMENTE SEM NOÇÃO "Shokozug! Shokozug! Shokozug! A fada do amor!"?

14/11/2017

O que o operário faz?

Disneyland 1950-60s
    Se alguém consegue um emprego em uma linha de montagem na Ford, o que diria às pessoas que ajuda a fabricar?
  1. Bolo de mandioca;
  2. Garrafa térmica;
  3. Automóveis;
  4. Não faz idéia do que sai na ponta da linha de montagem;

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego em uma linha de montagem na Embraer, o que diria às pessoas que ajuda a fabricar?
  1. Televisores;
  2. Roupa de inverno;
  3. Aeronaves;
  4. Operário não sabe o que está fabricando;

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego em uma linha de montagem na Estrela, o que diria às pessoas que ajuda a fabricar?
  1.  Tijolos furados;
  2. Cerveja;
  3. Brinquedos;
  4. Quando me aposentar vou até o fim da linha e vejo o que é;

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego em uma linha de montagem na Erlan, o que diria às pessoas que ajuda a fabricar?
  1. Microprocessadores;
  2. Chapa de aço cromo-níquel de alta liga;
  3. Doces;
  4. Empregado não precisa saber o que está fabricando;

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego em uma linha de montagem na Toshiba, o que diria às pessoas que ajuda a fabricar?
  1. Dentadura;
  2. Revistas pornô;
  3. Aparelhos electrônicos;
  4. Só quem sabe é o patrão;

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego em uma linha de montagem na Malwee, o que diria às pessoas que ajuda a fabricar?
  1. Vidraria;
  2. Discos de vinil;
  3. Roupas;
  4. Se eu soubesse eu seria burguês;

     Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego em uma cozinha do Habib's, o que diria às pessoas que ajuda a preparar?
  1. Barcos;
  2. Baterias de íons de lítio; 
  3. Comida;
  4. Operário simplesmente vende sua força de trabalho;

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego nos estúdios Disney, o que diria às pessoas que ajuda a fazer?
  1. Seringas de injeção;
  2. Alho poro;
  3. Filmes e programas de televisão;
  4. Desde quando operário sabe até mesmo onde trabalha?

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue ingressar no exército, o que diria às pessoas que ajuda a fazer?
  1. Cerimonial de debute;
  2. Música ruim para cantores "cool";
  3. A defesa do território nacional;
  4. Empregado só bate ponto e nada mais;

    Tens certeza? Ok, então vamos à próxima questão. Se alguém consegue um emprego em uma linha de montagem na Rolex, o que diria às pessoas que ajuda a fabricar?
  1.  Preservativos;
  2.  Biquínis;
  3.  Relógios
  4. Vou pedir ajuda aos universitários, que sabem menos do que eu;
     Tens certeza? Ok, então vamos à última questão. Se alguém consegue um emprego na NASA, o que diria às pessoas que ajuda a fazer?
  1. Gravações infames para carros de mensagens ao vivo;
  2. Mapa astral;
  3. Exploração espacial;
  4. Ah, cansei, você não é intelectual como eu. Adeus!
    Salvo em ditaduras extremamente fechadas, que escravizam seu povo, um operário sabe sim o que está fabricando e o que sairá  na ponta da linha de montagem. Em alguns casos, sabe até mais do que o CEO da companhia. Em última instância, é só ler o contracto de trabalho, ele diz exactamente o que a empresa faz. Essa discussão foi inventada por quem não sabia do que estava falando, ou queria confundir quem jamais pôs seus pés em uma fábrica.

06/11/2017

Uma coisa sobre o amor

1940s

    Vamos deixar logo de cara a verdade, tu não levas absolutamente nada de quem amas. Mas nada mesmo! Essa coisa aí, entre as suas pernas, meus amigos, não é amor, na melhor das hipóteses é expectativa. Não, eu não quero saber de definições dadas por intelectuais, philosophos famosos e artistas cultuados; a maioria deles também não sabe o que é o amor. Não sabem e, em não sabendo, sofreram e os vivos ainda sofrem pelo que pensam que sentem.

    Digo sem medo de ferir, porque melhor para a alma é um ferimento pontual do que uma chaga cultivada em campos florais: amor é aquilo que tu dá pelo outro, não necessariamente ao outro. Explico, dois pontos:

    Essa coisa egoísta e possessiva que faz o corpo tremer, tender a correr e agarrar, agredir quem se puser no caminho e tudo mais, é conseqüência de reações hormonais que trazemos desde a origem de nossa espécie, e serve tão somente para garantir a perpetuação de sua linhagem genética. Os cuidados que a maioria e nós sente que tem obrigação de dispensar aos rebentos, é subseqüência disso. Na natureza, assim que o filhote consegue caçar sozinho, o risco de ele se tornar persona non grata no bando é muito grande, até porque ele provavelmente não vai mais enxergar seus genitores como "pai e mãe", um será o potencial parceiro de cópula e o outro o concorrente; ou talvez ambos sejam concorrentes, acontece.

    É assim, onde o impulso hormonal impera. Os adultos não se importam com o que vai acontecer ao descendente, assim que ele tomar seu rumo, e é bom para ele que nunca mais se cruzem, alimento na natureza é escasso. Fora do universo dos mamíferos, quase todas as espécies são assim, inclusive as plantas.

    O comportamento altruísta para com a prole, às vezes até com conhecidos não consangüíneos, pode ser aprendido, para que a pessoa tenha aceitação social e aumente suas chances de sobreviver até a morte natural. Neste caso, é uma construção social. Mas no caso das pessoas que realmente se importam com os outros, mais numerosas do que a imprensa faz parecer, às vezes se contraria a posição da família ou do grupo, para ajudar a outra pessoa. Claro, também há os que fazem questão de contrariar e provar que não cederam à "construção social", mas esse é outro caso para outro texto, caso de bobos que foram placidamente montados por quem berra a todo pulmão que a sociedade é uma montagem. Vamos ao que interessa aqui...

    O que basicamente diferencia a atitude de amar do mero impulso passional, é querer o bem do outro, ou do grupo, mesmo que lhe doa muito; e às vezes mesmo que doa ao outro. Pelo bem do outro, infelizmente muito mais freqüente do que gostaríamos, é necessário deixar que ele padeça até certo ponto, para ele compreender o erro que cometeu.

    O que faz o apaixonado? Tenta encher o outro de prazeres e facilidades a qualquer custo, mas qualquer custo mesmo! Se faz de servo, mas exige magistralmente reciprocidade dessa paixão, muitas vezes de forma asfixiante, mesmo que o pagamento seja noutra moeda; como um masoquista que se apaixona por um sádico, por exemplo... caso de muitos, mas muitos casais, quase todos inconscientemente. A paixão te cega para absolutamente tudo o que o outro fizer de errado, desde que não frustre as tuas expectativas, porque se o fizer, meus amigos, a paixão se volta contra o objecto de desejo e se torna o ódio mais estúpido. É assim que acontecem os "crimes passionais", que absolutamente nada têm de amor, mas tão somente desejo e sentimento de posse.

    Caso não consiga destruir o antigo "amor", aquele que por contracto hormonal deveria satisfazer a todas as suas expectativas, uma rixa que pode durar décadas, até séculos, pode colocar duas famílias em pé de guerra, como foi o caso até recente das famílias Alencar e Saraiva. E AI de quem estiver no meio do fogo, a paixão é cega e insaciável, para o mal e para o pior! Porque a simples recusa de um caso rápido, pode desencadear um ódio tão intenso, que matar se torna a única razão de viver do que foi frustrado.

    Isso não é amor! É preciso muita maturidade e, quase sempre, muita serenidade para deixar o amor crescer. Às vezes é preciso até mesmo se ferir, porque assim a ira hormonal se volta contra o ferimento e deixa o outro se revelar como é, para o indivíduo discernir se existem afinidades suficientes e sincronia para que esse amor tenha uma potencial relação a dois para cultivar. Isso vale tanto para uma pessoa, quanto para um grupo ou mesmo uma causa; só muda o foco, é amor do mesmo jeito. Bonito? Talvez não, quem ama o feio sabe que é feio, não o ofende e não romanceia a aparência, mas trata com amor do mesmo jeito.

    Acontece, meus amigos, que uma relação precisa ser renovada de tempos em tempos, algumas até continuamente. Não, nada a ver com aquelas demências televisivas de "loucuras por amor"! Eu já disse, o amor demanda muita serenidade e muita maturidade, características que não dão espaços parra arroubos exibicionistas. Eu tenho experiência no caso, mais do que quase todos os que me cercam imaginam, bem como base científica de décadas de convívio com psicoloucos, digo, psicólogos.

    Infelizmente, nem todas as relações são renováveis. Infelizmente em termos, porque nem todas foram feitas para a eternidade, a maioria se presta para nos dar lições, e é aqui que o amor se diferencia realmente da paixão. O sofrimento dos que amam não tem com o que se retroalimentar, dura enquanto a dor da separação durar e depois passa, sem com isso privar a pessoa de tocar sua vida. Talvez, se a separação for uma perda traumática, dure muito tempo, mas a pessoa não alimenta a dor, ela tenta atenuar até eliminá-la, para continuar vivendo e, principalmente, não tenta fazer os outros ao seu redor sofrerem também.

     Às vezes, bons amigos, a única coisa que se pode fazer por quem se ama, seja uma pessoa ou um grupo, é ir ou deixar ir embora. A tristeza se origina mais naquilo que ainda queríamos fazer pelo foco do amor do que pela separação em si, sejamos francos; todos fazem expectativas, por mínimas que sejam, inclusive eu. Esperar poder participar de algo com alguém, por banal que pareça, é uma expectativa. O que diferencia o apaixonado do que ama, é que este se recusa a vampirizar a vida do outro e o deixa partir. Às vezes o outro nem sabe, às vezes só desconfia, mas para o que ama a chance de esse outro (ou esse grupo) estar bem a longo prazo, é suficiente. Molham-se alguns lenços, talvez até um início de depressão, todos somos humanos, então se retoma a vida, ainda que aos poucos.

    Aqui, meus queridos, vem a diferença estrutural mais gritante: O amor liberta! tanto quem deixou ir quanto quem foi. E num dia qualquer, em um reencontro, ainda que um rubor denuncie, haverá sorrisos. Dependendo do que aconteceu, ou o que ficou por ser conversado, haverá risos. Porque sem os grilhões da obsessão, a tolherem seu desenvolvimento, ambos terão crescido. Apenas tente não fazer expectativas, não caia nessa armadilha, mas esse hipotético reencontro pode ter sucedido o hiato de que uma renovação perene necessitava para acontecer.

Só o amor vale à pena

11/10/2017

O Saci vai sim!

 
    - Saci!
    - Aí, Drácula!
    - Tudo em riba, meu irmão?
    - Só beleza! Me preparando pra viagem...

    Alguns longos segundos de espera pela próxima mensagem, incomodam o brasileiro. Drácula não é de fazer rodeios, algo está errado. O conde começa a digitar, desiste, retoma a digitação...

    - Então, Saci, é sobre isso que quero te falar... Estamos sendo processados...
    - Uai! Por quê?
    - Estão nos acusando de nos apropriarmos de você, da Mula sem Cabeça, da Iara, do Boitatá, enfim, de todo mundo dessas matas aí.
    - Que trolha é essa, conde? Explica isso direito.

    O romeno radicado em Los Angeles, manda a imagem bem nítida do documento, que o acusa e aos demais monstros setentrionais, de corromperem e se apropriarem da cultura das florestas. Saci lê, começa a anotar nomes, então começa...

    - Meu, vou falar o que penso a respeito, mas vai ser meio longo, então espera eu terminar tá.
    - Tá, pode começar.

    - Pra começar, eu não pertenço a ninguém @#*!!! alguma! Saci não é bibelô de faculdade, não tem dono! Você se lembra bem do que o Lambão fez com o último que tentou aprisionar ele! Sou um elemental, eu não tenho fronteiras, não tenho país, não tenho vínculo algum com nenhum lugar específico. Eu vou pra onde eu quiser, quando eu quiser e volto SE eu quiser. O facto de terem me incluído na cultura brasileira, não me prende ao Brasil. Minha aparência pros humanos é resultado do que eles mesmos plasmaram, saca?

    Então! Você ainda pode se considerar com um gentílico, nasceu e morreu na Transilvânia, mas eu sou um elemental, nasci numa outra dimensão. Eu não tenho gentílico. Será que esses palermas aí sabem o que é um elemental? Mas saber mesmo, bem além das classificações preconceituosas de quem vê tudo abaixo da cintura, como se a gente fosse só uma lenda para ser pregada na parede e jamais ser tocada por estrangeiros! A gente não é isso, a gente vive, e ser vivo não pode ser preso por causa de preconceitos de quem se diz combatente deles!

    Nenhum de nós conversa com eles! Sabe por quê? Porque eles são arrogantes. Debaixo daqueles discursos bonzinhos, eles não aceitam quem pensa diferente. Não aceitam nem que exista quem pense diferente! Por isso a gente evita esses caras e por isso eles não sabem que existimos... e a gente nem sente falta. Eles nem sabem das próprias existências! Eles se acham os salvadores da humanidade, da natureza, da cultura do diabo vestido de saia! Na prática não fazem @#**!!! nenhuma na vida, além de tagarelar e encher o saco! Nem tem graça sumir com as coisas deles, porque logo pedem outro de presente e ganham na hora, então nem pra isso servem! Pra lugar chato, saci não vai... quer dizer, vai pra trolar, rá, rá, rá, rá, rá, rá, rá, rá!

    Falam de invasão estadunidense (como se eles fossem chamados de republifederenses) como se vocês todos fossem americanos! Quem lê uma coluna de jornal, sabe que não! Eles não sabem de onde vem o halloween! Nem sabem pra que serve! Falam de união de culturas milenares, mas quando quem eles odeiam junta todas as tradições milenares numa única festa, vêm com ataque de frescura!

    Fica de boa aí, Drácula, é com a gente que estão contando pra unir os povos, porque os "politizados" querem mais é despedaçar os territórios dos países e isolar cada micro cultura em seu acre territorial. Confirma todo mundo da minha turma aí, a gente vai e ainda vai levar muita comida!

    - É muito bom ler isso de você, Pererê! Mas, e essa histeria, como estão lidando com isso?
    - Não sento em formigueiro, então o que vem de baixo não me atinge.
    - Rá, rá, rá, rá, rá, rá...
    - Eu não esquento com isso!
    - Eu não acredito que chamaram você de "Pequena lenda afrodescendente com limitação de mobilidade"!
    - Me chamaram de quê?
    - Ah, desculpe, isso está na outra página, esqueci de te mandar... Aqui...
    - "Parem de repetir a imagem de 'negrinho divertido' de nossa pequena lenda afrodescendente com limitação de mobilidade".... Isso me ofendeu... tô bravo! Não é porque eu apareço como um garoto perneta, que sou deficiente... Vou mostrar pra eles o que eu realmente sou, depois a gente conversa... Vai ter Halloween sim! E o deles vai ser antecipado!

    Coisas estranhas aconteceram no auditório da faculdade, naquela mesma tarde; depois no ambulatório, onde alguns foram parar.

16/09/2017

Aurora tempo de ouro

   
1918
Aurora chega à escola imaginando o que poderia ter ocorrido. Os filhos não reclamaram de nada, não apareceram com nada estranho, não tiveram qualquer mudança de comportamento, nem mesmo reclamaram dos colegas. Chega e espera, como se tivesse a vida inteira para amassar seu derrière naquela cadeira sem ergonomia. Finalmente é chamada. Os cumprimentos de praxe, as perguntas de praxe, o "praxeamento" de praxe e a pedagoga vai ao assunto, após enrolar muito...

    - Mãe...
    - Aurora! Aurora Finotti!
    - Nosso corpo docente tem estado percebendo que seus filhos têm estado demonstrando assuntos estranhos à grade curricular. É como se como se eles estivessem estando aprendendo por outros métodos, enquanto didática e conteúdo, que não o que lhes é repassado ao nível de aprendizado, por nossos professores e nossas professoras.
    - Eu reforço o aprendizado deles em casa. Algum problema?
    - Mãe...
    - Aurora!
    - Eu estou estando compreendendo enquanto pedagoga, seus temores enquanto mãe, mulher e agente social empoderada em nosso sistema patriarcal, pelo que seus dois pequenos cidadãos em situação de menor idade possam estar estando aprendendo. Mas devo estar assegurando que não não fundamentados, visto que nosso corpo pedagógico é altamente capacitado dentro da visão neorrelativo-construtivista-arcano-freiriana. Pode então, Mãe...
    - Aurora - interrompe já sem muita paciência.
    - Pode estar estando se atendo ao seu papel assumido perante a sociedade, aos normalismos, à construção arquetípica e expectativas de seu meio. Deixe conosco a educação e o engajamento para a orientação enquanto educadores, nós somos capacitados e titularizados enquanto acadêmicos. Suas boas intenções, ainda que nos toquem, podem vir a estar causando desvios de aprendizado aos pequenos estudantes, dissonando seu nível e padrão de aprendizado junto aos demais do corpo discente de nossa instituição. É dever do professor, enquanto educador subordinado ao corpo pedagógico, transmitir e discutir o conteúdo formal e legalmente reconhecido, para um aprendizado pleno e libertador de nossa grade curricular. Para tanto, é necessário e imperioso que eles estejam nivelados e não constranjam os coleguinhas, que certamente não recebem em seus lares essa complementação.
    - Eu ainda não entendi o porquê de ter me chamado. Qual o problema?
    - Mãe!
    - Aurora - levanta o tom!
    - Você, em sua ingênua tentativa de ajudar, desconhecendo toda a ciência teórica e retórica que permeia o cabedal de nossa titularidade acadêmica, enquanto cidadã e mãe, tem estado estando prejudicando o desenvolvimento escolar e a integração social, causando desconfortos ao nível de desigualdade perante à comunidade estabelecida.
    - Onde, como e quando meus filhos constrangeram alguém?
    - Não se trata de constrangimento, no literal jargão a que se refere, mas demonstrações de, por assim dizer, desconformidade que dificultam o controle do andamento do aprendizado.
    - O que eles fizeram, por exemplo?
    - Por exemplo... Bem... Falaram algumas coisas que não podem ser provadas, como coisas que, veja que imaginação, teriam ocorrido na segunda guerra, fazendo os aliados parecerem bons...
    - Se estiver se referindo ao relacionamento entre os soldados, tudo o que eles disseram eu lhes repassei. Meu avô era pracinha e lutou na Itália, ele me contou tudo o que testemunhou.
    - Com que respaldo acadêmico alguém pode dizer algo que professores da área não dizem?
    - Você não ouviu o que eu disse, ou saberia que ele foi pracinha, um expedicionário, ele fez parte da FEB. Ninguém contou, ele simplesmente participou do processo e do resultado da segunda guerra mundial.
    - Mas mãe...
    - Au-ro-ra! Eu não sou uma pessoa genérica, tenho nome próprio!
    - Agora estou estando entendendo! Sua demonstração de individualismo e apego aos títulos sociais, enquanto integrante de uma elite, explica a não integração plena a nível de subordinação dos dois pequenos cidadãos em situação de menor idade. Tudo o que ensinamos aqui, ao nível de instituição escolar, é proveniente das universidades mais conceituadas, a nível de preparo acadêmico progressista e libertador das amarras da sociedade castradora...
    - A senhora quer dizer de uma vez por que me chamou aqui? Se acha que o facto de eu ensinar em casa aos meus filhos, aquilo que eu decidi que eles devem aprender, é prejudicial ao trololó pedagógico de vocês, então a solução já está posta na mesa; vou daqui mesmo procurar outra escola. E não é só história que eu ensino, gostem vocês ou não! Eu ensino tudo o que considero importante, até o que não está na grade. É meu dever, eu sou mãe deles.
    - A criança não pode estar sendo propriedade da família, ela deve estar estando pertencendo à sociedade que estamos construindo! A função da família é exclusivamente estar estando custeando o desenvolvimento físico, não interferindo no desenvolvimento intelectual e moral...
    - Meus filhos não pertencem a ninguém! Muito menos a intelectuais de ar condicionado como você! Agora vi que preciso mesmo de outra escola!

    Retira-se sem dar mais importância à pedagoga, que a chama de conservadora, preconceituosa, ignorante, a acusa de abandono intelectual, mas a voz fica mais fraca com o aumento da distância. Por fim tenta chamá-la de volta, gritando "Mãe" e ouve "AURORA, CACETA"!

05/08/2017

Surrupiadores astrais; paródia

Art by Solda

Woooooo...

Um hotel seis estrelas pois estou mais rico
E um bando espreita querendo um bico
Todas as verbas e outras mais
Propiciam desvios demais

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

Um solene desdém ao que o povo opinar
Sempre foi obrigado a me sustentar
Eu fiz a lei e faço outras mais
Para ter privilégios mais

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

Um cargo que é titulo nobiliárquico
Salvou meu pescoço bem rápido
Hoje temo não me safar mais
Vou pois jogar sujo bem mais

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

O poder é uma forte droga mas aqui eu fico
Mando matar quem tentar tirar isso
Todas as tramas e outras mais
Propiciam desviar mais

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

O verme pleiteia a urna cheia
O verme pleiteia a urna cheia

Toma lá da cá, toma lá da cá, toma lá dá cá
Toma lá dá cá, toma lá dá cá...

A seguir, a versão original da música... para não revirar mais seus estômagos com a realidade...
 

01/08/2017

Querida Cadillac

    É com carinho e uma leve dose de preocupação, que redijo esta crítica. Não questiono suas qualidades ainda vigentes, tampouco sua renomada e versátil capacidade técnica, longe de mim! Meu descontentamento é com sua reincidente ociosidade de potencial; inclua-se aqui a perda aparente da lendária ousadia, de que hoje se servem os "luxorollas" petulantes, que almejam ser seus concorrentes. Eles aprenderam rápido, mas cento e quinze anos de experiência não se conseguem na faculdade. Ser ousada e manter o bom gosto é para quase ninguém. É para você!

    Peço com apreço que não corra o risco de ficar embaçada como sua irmã, que Leland fundou com o mesmo carinho dedicado a você, para que fosse sua real concorrente e até sua parceira de aprendizado, mas perdeu completamente o viço de outrora. Sua triste irmã foi convencida a termo de que seus carros eram exagerados, até impróprios para os tempos vigentes; algo que os ingleses provaram ser inverdade. Ela apequenou-se neles e, logo em seguida, a si mesma, desaparecendo no mar de concorrentes apelativos que surgiram nas últimas décadas, a ponto de hoje não ter mais a mais remota ligação com o que justificava sua existência, que era ser sua contrapartida. Ela nem mais sabe ao certo quem é, está acanhada, tentando se reencontrar.

    Não quero isso para você. Não quero que suas tentativas de retomar a glória dos anos dourados, se dêem em vão, mas para isso você precisa, minha querida, voltar a se comportar como você mesma. Você não é uma moça na multidão, com roupas de grife cara cortadas segundo os ditames da moda, maquiagem seguindo as tendências, trotando pelas ruas como essas modelos modernas. Não, Cadillac, você não deve se reduzir a essa escassez existencial. Você é grande demais, é maior do que sua estrutura de revendas, do que suas fábricas, maior até do que a companhia de que faz parte. Você é a estrela da companhia, é o norte dos engenheiros, é de você que dependem os progressos de todas as outras marcas que te acompanham, quiçá mesmo de algumas concorrentes.

    Desde 1902 a multidão é que some à sua presença, não deveria ter deixado de ser assim! Seu porte altivo, quase arrogante, mas de modos afetuosos com os que leva consigo, ignorando mesmo as pistas mais mal acabadas, destemida e confiante é que se destaca e ofusca tudo ao redor. Não perca isso!

    Você não segue modas, minha querida. Você é muito mais significativa do que elas! Você lança modas, e as modas que você lança nunca saem de moda, não se importe com as maledicências dos despeitados que pregam o azedume e a vulgaridade, eles mentem para si mesmos a fim de justificarem suas existências supérfluas! Sua existência, Caddy, ela sim é necessária! Foi por sua causa, após um luto amargo pelo desfecho trágico de um acto de cavalheirismo, que as pessoas aos poucos não corriam mais o risco de quebrar um braço ou até morrer, tentando dar partida no carro com uma manivela. Você salvou tantas vidas, que nem se pode calcular quantas! Só por você existir!

    Suas maquiagens sempre foram harmônicas, mesmo quando por contraste, com sua compleição avantajada e opulenta. Você não combina absolutamente em nada com a moda vigente de exaltação às doenças da anorexia e da obesidade mórbida. A sua imagem sempre passou ostensiva e subliminarmente a mensagem de vigor e longevidade, de vida longa e próspera. E longevidade, minha amiga, é algo de que você entende muito bem! Seus modelos rodam macio e silentes mesmo aparentemente caindo aos pedaços, mesmo com falhas na manutenção, mesmo apesar do mundo corrosivo no qual esta qualidade os fez adentrar. E como chamam atenção, mesmo cercados de contemporâneos! O mundo suspira, quando você passa! Então é você que deveria continuar a ditar tendências, sem escondê-las debaixo da ficha técnica.

    Mesmo em seus piores momentos, quando parecia que as imitações baratinhas tomariam seu lugar, você nunca descuidou-se de sua elegância! Enquanto as outras se rendiam à maré, você ainda se valia de sua lendária força de vontade para manter-se firme em seu caminho, apesar de cambaleante. Lembra-se? Foi você lançar um modo todo novo no olhar e rapidamente ser copiada, de forma descarada, pelos "luxos" de custo/benefício. O termo "luxo" se manteve em seu comportamento apesar de tudo, enquanto as outras subvertiam e até pervertiam a palavra para se referirem a brinquedos e novidades tecnológicas, estas que sempre e rapidamente migram para classes mais baixas, desvirtuando assim a proposta original. O seu cabedal, pelo contrário, sempre foi o do refinamento, da elegância leve e descomprometida, do toque agradável e da experiência de ter em movimento a maciez de uma poltrona feita sob medida para a sala de leitura.

    Mesmo vindo da nobreza francesa, fidalga de longa linhagem, você jamais foi esnobe com plebeus, pelo contrário! Eles sempre encontraram na Caddy, como passaram a chamá-la carinhosamente, o mais alto padrão sem que isso significasse chamar mão de obra do outro lado do mundo, só para trocar uma tampa de válvulas. Você sempre foi uma abastada humilde! Isto nenhuma de suas rivais jamais se prestou a ser. Já tentou enfiar a mão para trocar uma vela de uma delas? Um horror! Mesmo conduzindo gente humilde, você faz as pessoas se sentirem flutuando, dando a uma classe média a sensação de conforto que as outras só dão aos muito ricos. Não deixe esse legado tão valioso se perder!

    O motivo maior de minha preocupação é que você ainda demonstra sentir as conseqüências dos tempos amargos. Você está mirando baixo, Caddy! Você pode muito mais do que isso! Foi por sonhar cada vez menor, que sua irmã se perdeu. Ela não vai conseguir se reerguer enquanto você não o fizer, porque sempre foi em você que ela se espelhou, como o mundo inteiro se espelhou um dia. Eu sei, há uma rusga continental entre vocês, mas ela foi adoptada por outra família, ela não escolheu isso, assim como você não escolheu a sua.

    Sonhar pequeno ou grande, minha querida, não torna o esforço menor ou maior, só torna maior a frustração de não ter conseguido o sonho acanhado, pois ele parecia ser mais exequível; até a culpa pelo fracasso é maior por ele. Quem se frustra pelo sonho grande, pelo menos tem o alento de suas dimensões e dificuldades, e o aprendizado que grandes sonhos sempre dão; mas nem por isso se deve desistir deles.

    Da mesma forma, a própria fauna automotiva de suas terras provou que seus carros não eram exagerados cousa alguma! Aproveitamento de espaço interno? Ok, é sempre bom se aperfeiçoar, algo que você sempre fez com muita rapidez. Mas não há mal algum em optimizar o espaço de dois por cinco metros, a não ser para os despeitados que não têm competência para fazer cabines realmente espaçosas. Isso você sabe fazer até melhor do que suas correspondentes britânicas, porque exclusividade de classes nunca fez parte de sua philosophia. Exclusividade, na sua cartilha, sempre foi para suas inovações e personalizações.

    Não, minha querida, o mote de que mais é menos não se aplica a tudo. Principalmente se ele significar a infelicidade e a perda de personalidade, ainda mais a sua personalidade tão forte e marcante! Ela faz falta! Muita falta! Sim, eu sei, você voltou a ser distinguida de longe, pelas pessoas, das outras ao seu redor, mas ainda não é aquilo que você sempre foi sem esforço. Você deve, pelo menos nisso, dar ouvidos às suas amigas inglesas e deixar os patetas de lado. Você não é exagerada, eles é que são medíocres! Você é o que você mesma se fez, e nunca deveria ter aberto mão de ser grandiosa e inspiradora.

    O seu público não quer tanto que você supere as outras, quer que supere a si mesma, que deixe de ter e passe a ser a referência. Você não deve se acanhar e oferecer mais do que os outros, deve oferecer tudo o que pode, como sempre foi! Alguns de seus fracassos se deram justamente por isso, por se nivelar por baixo. Deixe a média para a Chevy, é ela que briga bem nessa categoria, ela pode rodar apenas 30 milhas só com as baterias, por agora lhe basta! Deixe o segmento superior para a Buick, porque sua briga no território dela a está sufocando. Ofereça o máximo e o melhor! O seu básico deve deixar o topo dos outros lá em baixo! É isso que você sabe e deve fazer.

   Ainda me lembro quando estive a poucos metros de uma de suas meninas mais simples, a XT5. Esperei em vão para ouvir o suave ruído do motor, porque ela partiu sem sequer murmurarem os pneus! Mesmo ela compartilhando a plataforma com a menina da Chevy! Parecia ser eléctrica! É isto que seu público espera de você! É você que deve ditar onde está o topo, não almejar chegar a ele! É a isso que me refiro quando falo em sonhar grande, porque você sempre foi o sonho maior, mas de uma hora para outra resignou-se a um papel de "premium" que está muito aquém de sua majestade imperial! A Boo é premium! Você é luxo! A única coisa que te impede de voltar a andar lado a lado com a inglesa, é o medo pelos traumas persistentes!

    Quer se inspirar? Inspire-se nela. Você sabe fazer o que ela faz, e sabe fazer em maior volume sem perder o padrão! Lembre-se de que seu norte nunca foi a exclusividade, foi sempre a personalização do cliente, mas sempre dando a gente comum o direito a sonhar com ela. Sonhar com os pés no chão não significa sonhar menor, significa assumir ser a gigante que você é, sair da posição de joelhos e pôr-se de pé, erecta, altiva, encantadora e até intimidadora como nunca deveria ter deixado de ser. A sua cabeça sempre deixou as nuvens para baixo, ponha-se novamente de pé!

    Você não pode continuar a simplesmente brigar com custos, quando há um público que só recorre à inglesa porque você a deixou sozinha no pedestal. É esse público, não os detratores, que paga por você! Quem desdenha seu passado glamoroso não te aceitaria nem que você oferecesse micros de 3 metros! Compreende? Não é uma Cadillac menor que eles querem, eles querem o fim da Cadillac e de toda a era de esperança e abundância que ela representa. Quem te quer, quer em todo o seu esplendor e dignidade. Se a inglesa trabalha bem com um V12, você trabalha bem com um V8. Por que a vergonha? Sua competência sobra para alimentar oito bocas sem deselegâncias!

    Vamos, minha amiga, levante este rosto lindo, dê aquele sorriso triunfante que sempre precedeu de longe a sua chegada e seja você mesma! Ninguém é feliz na medida do possível, da mesma forma como não se é feliz no sonho alheio. Os seus adeptos não querem o sonho medíocre dos que têm medo de se assumirem ocidentais! Eles querem ter e espalhar pelo mundo o que o ocidente tem de melhor! Para eles, ansiosos pelo seu retorno ao trono que lhe é de direito, você é o modelo, o padrão, a meta e o sonho. Pelo menos por eles, Caddy! Faça isso!

23/07/2017

Eu uso óculos!

Paulina Poriskova for Dior sunglasses, 1980s

    Decidido a dar uma boa impressão, ele memoriza onde está o quê e treina. Tira os óculos, localiza algo, põe de novo e corrige a precisão. Teve problemas com as garotas desde que precisou usar aqueles óculos, que lamenta o oftalmologista, são para a vida toda.

    Não está cego, pode se orientar no ambiente sem eles, mas para dirigir, ler e reconhecer pessoas a mais de dois metros, precisa daquelas lentes multifocais. Tenta levar a vida apesar delas, mas já descobriu que sal e bicarbonato de sódio são mais parecidos do que vale o risco; a mãe o obrigou a comer sozinho o frango resultante da culinária às cegas. Também descobriu que óculos e vapor não combinam, especialmente se o vapor contiver gordura animal.

    Enfim, hoje é domingo, a piscina do condomínio está cheia, os biquínis estão minúsculos, quer se dar bem hoje. Coloca seus acepipes adiposos sobre a mesa de ferro fundido, põe os óculos ao lado e tenta ler aquela revista de cultura surfista. Até consegue ver razoavelmente bem as photos maiores, com alguma dificuldade lê as chamadas espalhafatosas, mas quando precisa ver o corpo do texto e as legendas, não tem jeito, precisa colocar o para-brisas de Fenemê, como a irmã caçula já chama.

    Tenta ler rápido, para usar o mínimo possível aquela órtese, mas a tira rapidamente quando uma garota se aproxima, mantendo a pose de intelectual atento à leitura, que nessas condições varia do embaralhado ao borrão. Consegue disfarçar, simplesmente porque quase ninguém dá a mínima para a sua presença ali.

    O sol começa a castigar, a radiação ultravioleta está quase fritando os ossos, vê por bem colocar o guarda-sol no encaixe da mesa. Problema? Não, nenhum, se ele não se metesse a fazer isso sem os óculos. Primeiro derrama o refrigerante, mas o levanta antes que perca muito. Espalha o "isopor de milho" e o recoloca no saco, engordurando as mãos, mas confiando que tem lenços e papel toalha. Finalmente encaixa, mas não sem estremecer a mesa e fazer bagunça, que se apressa em arrumar como pode, sem enxergar os detalhes.

    Volta a sentar-se, pegar a revista e fingir que consegue ler, com aquela cara de homem confiante em seu taco. Está protegido do sol, mas a sombra atrapalha um pouco fingir que lê, precisa pegar os óculos com mais freqüência. Ainda não notou a bagunça que resta na mesa, apenas enfia a mão em um dos sacos e mastiga algo.

    Uma garota nova no condomínio se aproxima; pele morena, corpinho de violão, tudo proporcional, firme e empinado, com quase nada tampando quase nada, e uma tatuagem do logo da época da guerra da Cadillac entre os seios. Ele a detecta em cima da hora e põe os óculos de qualquer jeito sobre a mesa, naquela mistura de refrigerante com gordura vegetal que ainda está no tampo de pedra.

    Ele a cumprimenta, ela responde com a cabeça e segue, enquanto ele admira sua compleição se afastando em seu requebrado. Pega os óculos para ver melhor e piora. Pega um lenço de papel para secar a lente, antes que ela suma de vista, e borra tudo com aquela gordura. Pega outro lenço para tirar a gordura, mas pega o que está engordurado com a pururuca. Tenta melhorar as coisas, limpando no calção, até consegue, mas deixa suas partes um pouco expostas a quem está atrás, e é muita gente.

    Desiste de parecer a águia do local, engole o orgulho e tenta encontrar o limpador de vidros adequado, dentro da bolsa de praia, mas precisaria dos óculos para isso. Vai tateando enquanto o calção começa a descer, pelo laço afrouxado pela tentativa de limpeza das lentes.

    Só se dá conta pelos gritos das mães, uma delas a sua. Levar bronca de mãe não é incomum, mesmo quase adulto, mas está levando bronca de uma quarentona em plena forma, que faz inveja a muitas garotinhas, e está também de biquíni, sendo admirada como ele admirou aquela garota. Ela procura e encontra o limpador, no meio daquela algazarra, se demora limpando os óculos, com o vigor que lhe é característico, balançando todo o corpo, e o adverte para não tirá-los mais.

    Ele coloca os óculos se vê sendo visto do modo como não queria. O condomínio inteiro o fita com caras de deboche, fazendo insinuações sobre sua mãe e em maior número do que pode tirar satisfações. O atenuante é que ninguém lá estuda na mesma faculdade que ele, mas costumam se cruzar nas ruas próximas e nas idas ao supermercado.

    Desiste! Adeus, domingo cruél! Volta para o 2703, o último andar, com o firme propósito de virar lagartixa de escritório, mais branco do que nerd sueco. Nunca mais descerá à área de lazer! Nunca mais! Vai conseguir um emprego pela internet e só sai de casa para a faculdade! Sai do elevador, pensando em cortar os pulsos com papel machê, e quem encontra voltando?

    - Oi, foi você que me cumprimentou lá em baixo? Desculpe se fui grossa, é que esqueci os óculos no meu quarto, eu não enxergo direito sem eles. Você usa, então me entende, né?

    Pensando bem, vai arranjar esse emprego sim, mas vai ser para outros propósitos. Afirma que compreende, não foi nada e oferece companhia de volta.


26/06/2017

Sobre a autoridade e a propriedade


https://www.aeclassiccars.com

    Ele se aproxima daquele carro super customizado, saca seu tablet e começa. Photographa e pormenoriza tudo, cada infração que encontra, aquilo que não conhece, mesmo sabendo que não é, também registra como infração.

    Para começar, nunca viu aquele tom de vermelho na vida, não sabia que existia jeito de fazer uma pintura parecer um lago, com flocos reluzindo em várias camadas de verniz altamente reflexivo, até parece que o carro foi vitrificado! Mas não é é original, e se for, nunca viu aquela cor na vida, então é a primeira infração, que por si já justifica chamar o guincho. Não bastasse isso, há aquelas largas faixas em bege aveludado, altamente liso e agradável ao toque, que não tem mais do que trina polegadas de largura nas laterais, portanto não toma metade da área da carroceria, mas não vai dar o braço a torcer, o dono se quiser que entre com uma ação e espere por anos, enquanto aquela bela máquina apodrece no pátio a céu aberto do Detran. Carro tem que ter uma cor só, e nem adianta ser de fábrica se ele não gostar, porque apreende assim mesmo!

https://www.aeclassiccars.com

    E quelas rodas? Grandes, estilizadas, diferentes de tudo o que já viu em sua garagem! Nem sabe o que está escrito, deve ser inglês, e já que não entende o que está escrito, vai mais uma infração toda detalhada. E vejam só, o dono até gravou o nome dele nos pneus: Mickey Thopmson! Não vai ser difícil enquadrar, com o nome se consegue a ficha completa do meliante, que se atreveu a usufruir de sua propriedade como bem entendia, sem autorização da burocracia estatal. Ele vai ver quem é que manda na propriedade dele, ele ou a autoridade que está em ação!

    Vidros baixos, isso facilita tudo. Portas destrancadas, então pode esmiuçar o interior inteiro. Absolutamente nada é original de fábrica! Para piorar, não sabia que existia aquele tipo de decoração, então vai descarregar sua ignorância todinha contra o proprietário! Onde já se viu, colocar bancos mais firmes, anatômicos, confortáveis e seguros no carro? é mais uma infração. E que material é aquele? Nunca viu nada parecido, jamais soube que existia aquela textura, aquela costura com jeito de carro de luxo é suspeita... registra e descreve tudo nos mínimos detalhes, fazendo as interpretações mais subjetivas e estranhas de leis que já são feitas por leigos. Já mandou carros velhos para o depósito, só porque os donos pintaram as placas de preto com letras brancas, por que perdoaria aquele?

    E aquele painel? Com certeza não veio assim de fábrica, mesmo desconhecendo que marca de carro é aquela. E está tudo em inglês! mais uma para a multa e mais um argumento para o carro apodrecer no pátio até ser leiloado como sucata! Não sabe o que quer dizer "MPH", mas aquilo parece ser um velocímetro e ele está fora de seus padrões, então tem que ser ilegal! E onde está a alavanca do câmbio? Que história é essa? Como se atreve a modificar um elemento vital para um automóvel, mesmo que ele mesmo não saiba para que serve o câmbio? Ah, o tal Mickey está encrencado! Não será só apreensão com multa, vai perder pontos na carteira, e se reclamar vai preso, porque autoridade pode bater na cara e o cidadão tem é que ficar agradecido por apanhar!

https://www.aeclassiccars.com

    De atrevido decide abrir o capô. E o que encontra? Não faz a mínima idéia, mas é certamente uma modificação! Aquelas peças estranhas, aquele monte de polias e correias, aqueles fios todos, aquelas baterias extras, tudo aquilo vai para o registro de infrações. O tal Mickey terá que pagar mais do que um cafezinho para liberar aquele carro, e só depois de deixar todo original! Pois o dono do carro não se chama "Mickey" e está chegando com amigos, e não é dono, é dona. Agora sim, vendo que é mulher, se sente mais à vontade para tratar com o devido desprezo e exibir sua superioridade de macho! Mas leva um tapa no primeiro desaforo que profere. Vira onça! Dá voz de prisão e chama a polícia e... que polícia estranha... Opa, se esqueceu de que está noutro país, só acompanhando os mil e quinhentos turistas, que viajam às custas do erário, da comitiva presidencial...

    - Isso aqui não é Brasil, seu babaca! Isso aqui é a América! Foi por causa de vagabundos como você que eu saí de lá! Seu guarda, faça seu trabalho.

    - O senhor queria levar o carro dela?

    - Mas é claro que eu ia! Ia não! EU VOU! Esse carro é todo irregular, segundo as normativas regulamentares do meu órgão, junto ao qual me foi concedida autoridade ao nível de fiscalização enquanto funcionário estimado pelos meus superiores! Ela é brasileira, então tem que seguir as leis do Brasil! Me dá essa chave que...

    - O senhor está preso por flagrante tentativa de roubo, ameaça a uma cidadã americana naturalizada, tentativa de intimidação e trabalho ilegal em solo americano! O senhor tem o direito de ficar calado, tudo o que disser...

    É levado protestando, evocando as relações bilaterais e ameaçando com sanções, gerando provas contra si. Os amigos da brasileira a olham, pasmos...

    - Quando você disse que as leis brasileiras são escravagistas, eu não pensei que chegasse a esse nível! Vocês lá não podem usufruir de sua propriedade?

    - Não, Peter, a gente lá não pode nem viajar se dar satisfações a apadrinhados políticos, que estão em seus cargos apenas para garantir apoio ao executivo, e têm prazer sádico em atrasar e até arruinar com a vida do cidadão. Isso nas três espheras do poder!

    - MAN!!! MAN!!! GOD BLESS AMERICA!

31/05/2017

Animais pagam inteira


    Não faz muito tempo vi a frase "O ser humano é o único animal que paga para viver na Terra". Eu não sei de onde o autor tirou isso, mas esqueceu-se de que fora da civilização, não existem folgas, férias, auxílio doença, nem qualquer outro amparo que permite aos humanos, permanecer longos períodos sem sair de casa e ainda assim ter o que comer.

    Os animais não usam papel-moeda ou cartão de crédito, mas eles pagam sim para viver, e pagam caro! Dependendo do lugar no planeta em que estiverem, a lei da oferta e da procura é literalmente mortal. Embora muitas espécies possam estocar alimentos, isso não as exime de ter que procurar por ele todos os dias em que não estiverem hibernando. Aliás, mesmo as plantas são vítima desse, perdoem o trocadilho, capitalismo selvagem. Elas não podem se dar sequer o luxo de adormecerem, precisam sugar nutrientes do solo ininterruptamente, ou começam a morrer.

    Vejamos o exemplo das borboletas e das flores. Vocês têm idéia de o quanto é caro para uma planta produzir flores? Pensam que as produziria apenas por altruísmo, para dar néctar de graça para insetos e pequenas aves? Vamos repensar isso, porque flores são órgãos sexuais, elas usam o néctar para atrair quem possa levar seu pólen para outras flores, para isso se tornam o mais atraentes possível para as espécies que precisam atrair. É quase como prostituição, em troca da fecundação elas PAGAM os animais com alimento. Não tem valores mensurados envolvidos, mas é uma troca de bens por serviços. O dia em que um macaco não conseguir mais ir atrás de uma fruta ou um inseto, ele morre de fome.

    As plantas frutíferas então, investem ainda mais e distribuem ainda mais pagamentos, primeiro com a polinização, depois com a dispersão das sementes. A concentração de nutrientes é muito grande, a produção precisa compensar o investimento e atender às expectativas da clientela, ou ninguém mais volta lá, as frutas caem ao pé da árvore, brotam e concorrem com ela, atrapalhando em vez de ajudar a disseminação dos genes.

    Plantas que não podem oferecer algo aos insetos e pequenos animais, apelam para a armadilha. Elas cuidam de ser atraentes com o mínimo do escasso recurso de que dispõe, seduzem a vítima e a digerem viva. Cruel? Talvez, mas só nós humanos achamos que é. Para as outras espécies, é apenas parte do preço que alguém precisa pagar. Se o predador estiver plenamente satisfeito, então a morte do colega de bando terá valido à pena, por algum tempo. Aliás...

    Quando um animal vive em bandos, as chances de sobreviver crescem, porque há a possibilidade de, no mínimo, pegar as eventuais sobras da caça ou da busca por alimentos. Quanto mais próximo de uma sociedade humana for o comportamento de uma espécie, maiores as chances de sobrevida do indivíduo. Vejam os lobos, por exemplo. Eles ajudam os membros idosos da alcateia, sem o que eles seriam presas fáceis e estariam fadados a, cedo ou tarde, morrer de fome por não conseguirem mais caçar. Algo vagamente parecido com entidades de amparo aos idosos, como os asilos.

    Eles fazem isso confiando, inconscientemente, que receberão o mesmo tratamento quando também estiverem velhos, ensinando esse comportamento aos filhotes. Não preciso explicar o quanto espécies assim têm uma organização social complexa e hierarquizada, preciso? Todos têm suas funções, todos precisam trabalhar pelo bando, todos precisam prestar satisfações de suas falhas ao líder. Quando se trata de abelhas e vespas, o indivíduo sequer tem a chance de crescer na hierarquia.

    Quanto ao mito de que na vida selvagem tudo é todos e nada tem dono, é só um mito. Nenhum bicho tem escritura lavrada e comprovante de endereço para provar sua propriedade, mas eles as têm. O território de que um animal precisa para obter seu alimento, será defendido com violência ao menor sinal de invasão. Muitas espécies permitem que indivíduos não competidores entrem em seu território, seja porque eles simplesmente não farão diferença, seja porque servirão de alimento. Isso se estende a todas elas, mesmo entre os unicelulares há briga se alguém chegar perto demais.

    Não fosse assim, ninguém precisaria de acompanhamento armado e treinado para fazer turismo nas savanas. Se alguém que não for mais forte entrar inadvertidamente no território de um predador, e não será aceita a desculpa de não ter visto nenhuma cerca, o clima vai pesar. Haverá uma luta, uma fuga ou uma refeição; ou uma cópula. Não há meio termo, uma onça não vai pedir educadamente que se retire de seu território em meia hora, sob risco de processo judicial por invasão, ela vai partir para cima e te matar. Não existe perdão na natureza. O alimento até está lá, mas tens que encontrar, conseguir prendê-lo ou colhê-lo, encontrar um lugar seguro para se servir dele e ficar atento para os pequenos perigos que, apesar de incógnitos, estão lá.

    Os únicos animais que não precisam se preocupar em trabalhar incessantemente para sobreviver, são os nossos de estimação. Longe de nós, a morte é certa para quase todos eles, porque chegar à vida adulta é um prêmio, na vida selvagem. Só os nossos animais comem sem pagar, e olhe lá!

25/04/2017

VAMOS PROIBIR TUDO!!!

Tudo em uma só imagem!
    Vamos proibir os barcos de madeira! Eram de madeira as naus que levaram os europeus para o novo mundo, onde causaram destruição, devastação e degradação dos povos primitivos que viviam cem por cento em paz entre si e com os outros! Toda a animosidade teve origem no ocidente, onde nasceu tudo o que é de ruim, com o intuito de oprimir e escravizar os povos africanos e asiáticos, que viviam aos beijos e abraços em uma terra perfeita!

    Continuar a usar barcos de madeira é utilizar um recurso historicamente perverso, que presta unicamente à depredação do meio ambiente, além de jogar na cara dos negos e indígenas que a situação vai continuar como está! Pior ainda é permitir a existência de oficinas que ainda hoje reproduzem caravelas e galeões, embarcações historicamente utilizadas para dominar e escravizar os povos africanos. Aliás, vamos proibir tudo que for de madeira!

    NÃO É MIMIMI! É EXIGIR RESPEITO E REPARAÇÃO AOS QUE JÁ MORRERAM E NÃO VÃO VER A COR DA GRANA!

    Vamos proibir os productos para bebês! Eles são uma opressão do mercado que visa lucro, para manter a mulher no papel de reprodutora restrita ao ambiente doméstico, submissa ao marido, ao irmão, ao tio, ao pai, ao filho e ao espírito santo, AMÉM! Basta de sugerir que a maternidade é boa, que alguém gosta de ter filhos! É tudo mentira! É tudo construção da sociedade patriarcal judaico-cristã ocidental para convencer a cidadã em situação de mulher, que sua única razão de viver é reproduzir! Isso só existe no ocidente, o oriente médio é diferente, é o paraíso!

    Proibiremos também saias e vestidos, essas peças estigmatizadoras e segregadoras, que identificam e rotulam visualmente a cidadã em situação de mulher, dando à sociedade satisfação de gênero, tirando historicamente a individualidade e direito de escolha por uma repressão velada que só existe no ocidente eurocultural! Usar saias e vestidos é condenar a mulher ao assédio! À violência! À biologização de seu gênero! A prova é que muitas mulheres que foram agredidas, usavam saias e vestidos, e das que ousaram desafiar o machismo eurocultural, usando calças, muitas foram agredidas!

    NÃO É MIMIMI! É EXIGIR RESPEITO E IGUALDADE DE UMA SOCIEDADE OPRESSORA QUE SÓ EXISTE ONDE HOUVE DOMÍNIO EUROPEU!

    Vamos proibir a música clássica! Os acordes eurocastradores culturais de um estilo anti-natural, imposto pelo eurocentrismo opressor e xenofóbico que só existe na Europa, tolhem as culturas tradicionais dos povos milenares que ainda preservam o modo de tocar de seus ancestrais. O ocidente judaico-cristão patriarcal que não estudou história, oprime historicamente as culturas orientais e pré-colombianas, quando mostram aos membros das civilizações tradicionais que existem outras opções de música!

    Proibiremos ainda que os habitantes de cada região sejam obrigados a só ouvir o que surgiu em sua região, as histórias que surgiram em sua região, usar as roupas que surgiram em sua região, os conhecimentos que brotaram do nada em sua região! Nada de catalogar e ensinar para a posteridade, é preciso isolar, ou haverá degradação e conseqüente desaparecimento. É preciso isolar as culturas para preservar o multiculturalismo, que é o único modo autêntico e legítimo de convivência entre os povos! Todos os intelectuais afirmam que é, então é!

    NÃO É MIMIMI! É FAZER JUSTIÇA E IMPOR AOS COLONIZADORES, ATRAVÉS DE SEUS DESCENDENTES, O MESMO MAL QUE CAUSARAM A OUTROS POVOS!

    Vamos proibir a ciência! Ela ultraja e segrega aos cantos obscuros, os conhecimentos tradicionais dos povos primitivos! São conhecimentos baseados na cultura, nos costumes, na sabedoria, na harmonia, na vida utópica das tribos assoladas pela dominação europeia! Conhecimento científico não é nada! Conhecimento tradicional de culturas historicamente perseguidas é tudo! O facto de a ciência ter respaldo em todos os cantos do mundo, e os conhecimentos tradicionais de um povo muitas vezes desmentir os de outros, não é nada! A ciência tem que ser proibida e os conhecimentos ancestrais têm que ser impostos! Na marra! Queiram ou não seguir!

    Proibiremos também os livros, que são uma forma eurocultural de transmissão da opressão judaico-cristã patriarcal! Todo conhecimento deve ser transmitido da forma tradicional, oralmente! No máximo em caracteres das culturas milenares historicamente oprimidas em cascas de árvore, peles de animais, pedras e afins! Morte aos livros! Morte à ciência ocidental! NA MARRA!

    NÃO É MIMIMI! É FAZER JUSTIÇA E BANIR TUDO O QUE MACULA A PUREZA CULTURAL, ÉTNICA E GENÉTICA DAS TRIBOS TRADICIONAIS!

    O que foi? "Não é bem assim"? Estou deturpando? Onde? Sua opinião é demasiadamente sujeita aos seus critérios, que podem não ser científicos como imagina. Tanto menos quanto mais carregada de bordões, frases de efeito, citações e discursos alheios. Quero que justifique e fundamente. Eu estudei história, mas toda a história, não só a parte do ditador bonzinho que lutou contra a democracia malvada. Quer fazer justiça? Faça, mas não aos mortos, nem usando seus túmulos como palanque; eles não precisam dela. Ajude o outro a se levantar e capacite a fazer suas próprias escolhas, mesmo que seja o modo de vida tipicamente ocidental.

31/03/2017

Ignorância; luxo supérfluo

    Muita, mas muita gente mesmo considera a ignorância um alento, como se desconhecer um disparo tornasse alguém à prova de balas. Eu poderia tecer um artigo quilométrico a respeito, mas me aterei a três casos de que tenho conhecimento na prática, resguardando nomes e características pessoais, ara evitar problemas. Inicio com o caso de uma diarista desastrada, facto recente, que reescalonou meu conceito de alienação;

    A mãe de uma amiga contractou uma diarista que lhe fora indicada, diziam saber fazer bem o serviço doméstico. A dona da casa saiu para arcar com seus compromissos, confiante, quando a certa altura do dia, a diarista liga questionando, indignada, o que eles tinham feito para as panelas ficarem tão encardidas. Disse ter sido necessário usar uma faca para raspar a sujeira, que estava grudada nas peças, que tinha levado o dia inteiro na tarefa. Voltando para casa, ela viu o que temia: a diarista raspou todo o teflon que havia naquela cozinha.

    Não, ninguém é obrigado a conhecer o que não faz parte de seu cotidiano, mas se sair do pequeno mundo onde ele é possível, o desconhecimento do mundo exterior vai trazer problemas; a questão não é "se", mas "quando" vai acontecer o pior. Principalmente se a pessoa insistir em usar de seus modos costumeiros em um ambiente que desconhece, ambos podem ser e geralmente são incompatíveis. Sair da clausura cultural que lhe dá a torpe sensação de felicidade, vai exigir que abra mão do conforto alienativo que pode ser muito caro ao indivíduo, como parecia ser para aquela diarista.

    Outro caso é o de um candidato a motorista, que foi fazer um teste na transportadora de um amigo que não vejo há vinte anos, talvez. Acontece que essa transportadora só utilizava caminhões de ponta, que utilizava tecnologia de última geração, que ainda hoje nem todos os caminhoneiros se preocupam em conhecer. O problema ocorreu com o diferencial, cuja função explicarei para ajudar a terem uma idéia do que houve; Por conta da largura de um veículo, e tanto mais quanto mais largo, as rodas da direita e da esquerda giram em velocidades diferentes, em uma curva. Em um caminhão isso é muito crítico, porque é um veículo muito largo, muito pesado e tem pneus com aderência muito grande, o que poderia gerar quebras freqüentes, não fosse aquele componente enorme que se vê por baixo e detrás, que parece uma bola, ele permite que as rodas do lado de fora da curva não sejam arrastadas pelas do lado de dentro, e não atrasem estas, evitando forçar demais componentes muito caros.

    Pois bem, não sei a que aquele candidato estava habituado, mas com o diferencial travado (recurso para facilitar sair de atoleiros e outras emergências) ele não só fez uma curva fechada durante o teste, como a fez em alta velocidade, e ainda deu cavalo de pau! Resultado? Um barulho horroroso de metal sendo quebrado, triturado e moído. Um prejuízo que poderia facilmente comprar um carro popular. Claro que ele foi dispensado e claro que a empresa arcou com o estrago, iria cobrar como, daquele duro?

    Outro caso é o de um policial, no início dos anos 1980, que foi ao Paraguai em uma excursão de sacoleiros. Foi o "boom" da muamba paraguaia no Brasil e ele quis pegar a boquinha, só que era um sujeito meio xucro, que não abria mão de falar do jeito que falava e nos termos que sempre falava, quase sempre sem se preocupar se iria ofender, afinal sempre freqüentava os mesmos lugares, falava com as mesmas pessoas e nem mesmo se importava com notícias de fora do país. Ele foi ao Paraguai. Acontece que entrou na loja de um chinês, não filho ou neto de chineses, mas um chinês autêntico made in China, com todo o complexo e melindroso código de honra dos orientais.

    A certa altura, falando pelos cotovelos, rindo, perguntou brincando se aquela mercadoria era legítima ou se era falsificação; foi expulso aos berros da loja, sem entender o motivo de tê-lo sido. Este caso poderia ter culminado em um assassinato, e a polícia paraguaia da época teria dado razão ao chinês. Ele confiou que sua larga experiência de vida e serviço, o gabaritaria a lidar com qualquer pessoa em qualquer situação, mas outra cidade não é a mesa de bar costumeira com a roda costumeira de amigos, que dirá outro país! Que dirá alguém do outro lado do mundo!

    Há ainda um agravante relativamente recente ao apego de costumes locais, é a insistência de muita gente em classificar essa alienação como "sabedoria comunitária", não raro tentando impor a idéia de que isso é vida autêntica, como se ignorância fosse um elixir contra a corrupção. Como se não houvesse parlamentares com diplomas de faculdades pay & play, quando não falsificados. Por corrupção entenda-se todo e qualquer comportamento que cause danos em proveito próprio a terceiros, o que no meu padrão inclui furar fila.

    Há uma diferença tão sutil quanto perigosa, entre falar a linguagem que o outro compreende, e simplesmente imitar o que ele fala, este o expediente mais utilizado para tentar "socializar" alguém. A imitação deliberada não melhora a vida do imitado, só o priva de se aprimorar e crescer como pessoa. Aliás, vai uma informação que nem todos conhecem, sobre o modo de falar de gente que nasce a praticamente morre sem sair do campo; é imposto. Sou descendente de gente assim, o modo como eles falavam era imposição dos coronéis locais, que não admitiam que alguém dentro de seus domínios demonstrasse mais cultura do que eles. Em suma, não é uma cultura verbal gestada e formada, é a continuação inconsciente de uma repressão duríssima ao próprio desenvolvimento humano do indivíduo como ser humano.

    Uma das muitas lições que aprendi, lidando com adolescentes problemáticos, é que ninguém ajuda o outro simplesmente lhe facilitando as coisas, às vezes a facilidade só atrapalha. Quer ajudar? Mas quer mesmo ajudar? Não tenha pena, tenha respeito; são coisas parecidas, mas uma é a Ruth, a outra é a Raquel.

24/02/2017

Thomash desencantou-se

    Esta é uma história real. Nomes e detalhes podem ter sido alterados ou omitidos para preservar as partes prejudicadas, em clara situação de perseguição burocrática.

    Thomash era um jovem idealista, ele acreditava que meia dúzia de garotos decididos e bem intencionados mudariam o mundo. Mas o mundo que ele enxergava, limitações da pouca maturidade em sua idade escassa, era aritmética simples, quando o mundo real funcionava com algo mais complicado do que a relatividade especial.

    O conheci quando era ele ainda um petiz com metade do meu tamanho, o que já é pouca coisa. Alguns anos se passaram até revê-lo e ver, surpreso, que a escala 2/3 se inverteu para 3/2. Mas a barba e o timbre mais grave não escondiam até então,  o garoto cheio de boa vontade e preocupado com seu próximo.

    Estudioso, muitas vezes em excesso, Thomash às vezes se esquecia até do sono e da fome, entretido e envolto em livros e apostilas. As notas acompanhavam esse empenho todo, com seu perfeccionismo crônico atormentando em sua consciência, cada vez que tirava menos de 10,0. Excessos também prejudicam o desempenho, leitores, aprendam isso.

    Com muito custo, Thomash conseguiu entrar para uma faculdade pública, acalentando o sonho de ser professor e ajudar seus alunos a mudarem o mundo. Com relativa facilidade e um bom alemão, ele conseguiu um intercâmbio nos domínios de Fräu Merkel. Lá foi ele, por um ano, aprender muito mais do que esperava na Alemanha unificada. Viu com pesar que alguns de seus heróis eram na verdade, os vilões carismáticos da história, mas também viu com alegria que quase tudo o que se fala mal dos teutões é mito.

    Voltou mais maduro ao Brasil, mantendo a mesma disposição para mudar o mundo e ajudar seus alunos a encontrarem seu espaço nele. Retomou os estudos para o mestrado, empenhou-se como de costume e enfiou-se nos livros, como sempre. A namorada dele realmente o ama, ou já teria arranjado outro.

    Veio aos poucos, em uma curva elíptica, a decepção com a instituições que, em sua cabeça bem intencionada, deveriam ser baluartes da justiça e da honestidade; ainda que não 100%, pelo menos 85% deveriam ser.

    Sem absolutamente nada a ganhar com isso, presumindo então que a inveja e orgulho ferido orquestraram tudo. Vendo o rapazote tão empenhado, apesar das dificuldades, os preguiçosos se incomodaram com seu empenho; vendo seu sorriso tão entusiasmado, apesar das decepções, os amargos se irritavam vê-lo sorrir; vendo seus resultados tão primeiromundistas, apesar das sabotagens que já sofria, os invejosos se revoltaram contra seu sucesso.

    Justo os que apontavam seus dedos rígidos para a "perversidade da sociedade ocidental", usaram de suas morais maleáveis para colocar a burocracia interpretativa contra alguém que, ironia, justamente queria acabar com as injustiças da sociedade, só que agora incluindo as orientais, que então sabia serem tão boas e ruins quanto a sua.

    O usufruto do poder outorgado pelo cargo público, adorado pelos perseguidores, vitimaram Thomash com progressiva intensidade. Pessoas que fazem o que querem e não aceitam sequer receber a outra parte para esclarecimentos; Democracia é só do lado de fora, aqui a lei é a do meu "pensador" preferido.

    Por falhas dos setores da faculdade, deliberada vista grossa de quem poderia corrigir as falhas, acrescidas agora pelos rompantes de autoridade de ideólogos que jamais deram uma aula ao rapazote, e portanto não poderiam avaliá-lo, uma nota com injustos décimos a menos o fez perder não só o semestre, com isso também o mestrado, como também a bolsa que custeava suas actividades acadêmicas.

    Um dos espessos compêndios que Thomash estudou, para apoiar seu mestrado, versa justamente sobre a avaliação integral do aluno, em vez de puní-lo com acento por oscilações pontuais, ainda mais sem sequer chamá-lo para avaliar-se a situação.

    A pessoa não quer saber, simplesmente usou de uma caneta para destilar a peçonha de sua inveja, aproveitando a viagem de férias do reitor, para jogar no lixo anos de estudos metódicos e disciplinados. Isso já faz quem um dia defendia com unhas e dentes o serviço público, pensar com seriedade a favor da privatização de, pelo menos, parte dos trabalhos das autarquias; ao menos algo que obrigue o funcionário a pensar que é um empregado da instituição, não um de seus reis e juízes.

    Se ele vai recorrer? Sim, já está arranjando meios e recursos para tanto, ainda e com mais fervor desejando mudar o mundo através de seus alunos, mas os anos dedicados terminaram em vão... E sua inocência também.

21/01/2017

As regras da casa

   
    Salvo por situações excepcionais, como risco de morte ou coerção, ninguém te obriga a entrar em uma casa, um clube ou qualquer outro lugar. É assim na sua casa, por que não poderia ser na casa em que entrares?

    É muita gente que entra em uma residência sabendo que os donos têm animais, que eles vivem soltos, mas mesmo assim já entram pedindo que os amarrem. Vamos deixar uma coisa clara, aqueles bichos são moradores da casa, as regras internas foram formuladas levando-os em consideração, para permitir o bom convívio de humanos com animais. Não venha fazer-se de inocente e vítima, porque a presença de cães e gatos são notadas de cara, quando se entra na casa, isso quando o próprio morador não avisa previamente que há animais na casa. Se alguém tem que sair ou ser amarrado ali, é tu.

    O mesmo acontece quando há crianças pequenas no ambiente. São filhos dos donos da casa, tudo ali foi preparado para essas crianças virem ao mundo, todos os cômodos foram preparados para elas crescerem com um mínimo de segurança. Até animais de estimação podem estar lá, pensados para ajudar no desenvolvimento dos petizes. Mesmo assim, uma criatura chega aos genitores e diz, na cara de quem carregou os pequenos por nove meses e amamentou por mais seis, para mandá-los ir brincar lá fora, mesmo que não estejam incomodando ninguém. Depois reclama de ter feito um vôo não controlado da porta da casa até a calçada pública.

    Pedir desculpas e fazer as pazes com a parte ofendida? Que nada! Vai às redes sociais falar mal do casal, da casa, das crianças, fazer militância contra animais de estimação e pregar que as pessoas devem ficar até a adolescência trancadas em internatos, só saindo quando estiverem prontas para satisfazer seus caprichos do que deveria ser o mundo. Ah, claro, não se furta o direito de exigir desculpas por não terem mudado as regras da casa por sua causa, e de apagar os comentários contrários à sua vontade.

    Eu não sei vocês, mas quando entro em um lugar estranho, me comporto como visitante de baixa importância. Normalmente eu não conheço as regras, então fico comportado e atento ao comportamento geral, que me dirão quais são elas e se eu devo ou não permanecer lá. Se não concordar, eu saio, não faço protestos contra tudo isso que aí está pra forçar a barra e mudar as partes que não me convém. Aquele ambiente não é meu, a hierarquia dele não é minha, a prioridade lá não é a minha vontade; quem deve mudar ou ir embora assim que possível, sou eu.

    Claro, não estou me referindo a organizações criminosas, reuniões de corruptos e coisas assim. Em encontros de lesadores sociais, a história é outra, mas a recomendação de manter o bom comportamento é maior, de preferência que ninguém note sua presença. Depois dê um jeito de dar conhecimento aos federais, mas enquanto estiver entre eles, mantenha o bico fechado!

    Assim como é em clubes, agremiações, associações, fraternidades, sindicatos e afins. Ao ingressar, o neófito é previamente informado das regras, das penalidades, dos riscos, dos ônus e dos bônus. Se tiver entrado de livre e espontânea vontade, a responsabilidade aumenta, porque o grupo terá feito um investimento em alguém que de certa forma e em princípio, não queria entre eles. Os riscos de sua crueza estragar algo muito importante, é grande, por isso as regras são muitas vezes rígidas com novatos. Não lhe cabe determinar o que é certo ou errado naquele ambiente e naquele momento. Não gosta? Saia!

    O interessante é que na maioria das vezes, especialmente quando o caráter do grupo é meramente recreativo, or mais cretino que seja o conceito de recreação do mesmo, o cidadão até lava latrinas na maior satisfação, só por fazer parte da turma. Depois sai furando sinal, andando na contramão, estacionando onde não se deve e ameaçando quem achar ruim o facto de não ter seguido as regras de trânsito. Lá dentro do meu grupo, eu até como o que os chefes deixarem na latrina, mas aqui fora eu sou o maioral e reivindico imunidade às leis.

    Notaram a diferença? Quem contesta regras de uma casa, um grupo sério ou um país, geralmente é de todo submisso às regras de onde escolheu entrar, ainda que essas regras sejam nocivas a terceiros. É como o caso do indivíduo que perde a casa da família na jogatina, por aposta meramente verbal, mas faz pouco até da gravação de uma câmera que o tenha pego em flagrante delito. Quem quer mudar as regras alheias, quase absolutamente sempre não tolera que não se idolatrem suas próprias regras. Os critérios são "Quem está conosco só pode ser bom, quem está com vocês só pode ser mau". Não literalmente é claro. Prolixia e retórica altamente repetitiva, são usadas para disfarçar o caráter completamente subjectivo da formulação dessas regras.

    Não é raro pessoas assim serem muito maltratadas em seus lugares de origem, buscarem amparo ou mesmo refúgio, se beneficiarem da estrutura local e depois se revoltarem contra ela, alegando que o seu jeito de viver é melhor do que as regras que no momento o protegem. Os centros de recuperação de toxicômanos sabem o que é isso. Os países que estão recebendo refugiados sabem o que é isso. Sair de um inferno e tentar transformar em outro inferno o ambiente que o socorreu, é comum entre os viciados, seja em tóxicos, seja em religiões, seja em certezas absolutas, seja qualquer outra droga.

    Se um lugar lhe parece ser muito conservador ou muito liberal para o seu gosto, evite entrar. Não tente mudar as regras de um lugar só porque tu achas que tem que ser do teu jeito. Se esse lugar te acolheu de bom grado, então é tua obrigação moral seguir o máximo possível das regras dele. Se uma mulher dando ordens te desagrada, vá embora. Se uma criança arcando com responsabilidades desde cedo, te desagrada, vá embora. Se o gosto de artefatos bélicos te desagrada, vá embora. Se a presença de outras religiões livremente exercidas te desagrada, vá embora. Se o gosto declarado por alguns valores antigos te desagrada, vá embora.

    Não existe meio termo aqui, ou se respeita, ou se retire. Se ficar, tenha a fineza de não estragar uma estrutura que uma população pode ter levado séculos para construir. Não lhe cabe mudar os outros e seus lares. Quem estiver em tua casa, estará sujeito às tuas regras, mas tu em casa alheia, respeite as regras dos outros.