20/06/2009

O que os 80 têm?

Já aviso de antemão, não foi uma época feliz para mim. Foi uma década pessoalmente desastrosa e eu teria (pelo ponto de vista cético) mil motivos para odiar os anos 1980. Mas não tenho. É chamada de "A década perdida" por questões políticas e econômicas, os últimos grandes artistas morreram nos anos 1980, como John Lennon. A inflação no Brasil esteve a tal ponto, que o que se comprava de manhã, à tarde já estava consideravelmente mais caro. Nossa moeda de então estava tão desacreditada, que alguns preços eram cotados por indexadores econômicos, ou mesmo por dólar.

Minha vida (que nunca foi fácil) chegou à beira do insuportável e cogitei fazer muitas besteiras comigo, mas na época eu era cético, não tinha esperanças nem no que me apoiar. Enfim, era para eu ter soltado foguetes quando veio 1990.

Foi horrível para a economia, pra a política e para mim. O mundo em geral tem saudades da época e com razão. Explico os motivos.

Foi a última década da esperança

Ainda não se espancava um colega em sala de aula por ele ser estudioso e andar bem arrumado. Sempre houve um olhar torto para os mais bem alinhados da turma, em todas as épocas, mas então ainda não era crime ser educado, se dar bem com o professor e tirar boas notas. Mesmo com os salários sendo corroídos pela inflação, os professores ainda tinham algum respeito e algum status, ainda podiam reprovar alunos que não soubessem a matéria. Os funcionários de uma escola eram quase que autoridades, se houve abuso de parte deles, a maioria fazia por merecer os vencimentos e sua presença inspirava respeito entre os alunos. Podia-se ir para a escola sem medo de levar um tiro na testa, ou uma facada na barriga. Criança na escola era motivo de tranqüilidade para os pais. Bem, se a educação ainda tinha algum recurso, e seus operários algum respeito, havia esperança no futuro.

Violência ainda era notícia, não nota de rotina

Polícia e bandido estavam em lados opostos. Marginal não chegava perto de delegacia e a farda era garantia de segurança em qualquer lugar. Andar à luz do dia, em lugares movimentados, não causava preocupação. As pessoas ainda deploravam comportamentos violentos, eles não eram aceitos como "curtição". Jogar fogo em mendigos, então, era impensável. Embora falha, a legislação não impedia os delegados de manterem meliantes na cadeia. Ainda lembro de uma reportagem, na qual um bandido disse "Em policial não se atira". Notaram a imensa diferença? Não havia corporações de policiais ultraviolentos, nem humilhar o cidadão em praça pública era aceito como condução de procedimentos. A banditização da polícia não é nova, mas sua institucionalização é.

Bandido não era herói. Lembram do Leonardo Pareja? Do Fernandinho Beira Mar? Lembram de como a imprensa recente os tratou como celebridades? Eu me lembro, foi um dos motivos para deixar de ver televisão quase que absolutamente. Só faltou as revistas darem cadernos fixos para o Pareja, que hoje se agonia nos abismos umbralinos, onde está a menos de um por hora não se sabe por quantos anos ainda.

Ir ao estádio, ver futebol, era motivo para alegria ou aborrecimento, nunca um risco de morte iminente. Depredar e queimar ônibus de torcidas adversárias (nunca rivais) com os torcedores dentro? Só os bandidos mais psicóticos e irracionais pensariam em algo assim. Hoje faz parte dos manuais de torcidas.

O maior risco de ir à praia era o câncer de pele, hoje...

Moda e comportamento ainda razoáveis

Atenção especial para este ponto. As roupas, tanto de mulheres quanto de homens, eram muito mais curtas do que as de hoje. Quando eu digo "curtas", digo "início de nádegas à mostra". Mas ninguém era atacado por isso. Não, os anos 1980 não foram de castidade, pelo contrário. Uma parede que tivesse uma rachadura ou uma protuberância teria muito o que contar, os hormônios em fase nenhuma da humanidade estiveram tão à flor da pele. Não se falava tanto em sexo (nem com tamanha agressividade) quanto hoje, mas se fazia muito.

A questão era que as roupas ainda seguiam as linhas do corpo. Cós baixo era dois ou três dedos abaixo do umbigo. Para transar, era preciso tirar as calças, não simplesmente dar uma baixadinha e "nheco!". Sexo casual existia, mas a regra era haver alguma intimidade, por pouca que fosse, com o parceiro. Os pais não se escandalizavam com as moças andando de pernas totalmente à mostra, na verdade a maioria das roupas era assim. Ainda se sabia sentar, cruzar as pernas, andar com alguma desenvoltura e conversar com estranhos mantendo alguma distância. Beleza ainda era critério para admiração. Ser capa de revista era para as belas, as elegantes ou as muito importantes. Esfregar a buzanfa na câmera e se gabar de ser promíscua é idolatria mais recente. O cós, perdoem os adeptos do cofre exposto, precisa ficar o mais próximo possível do umbigo, é questão até de saúde; nem muito alto, nem muito baixo.

Aliás, só mesmo nesta época triste e cheia de distrações, para que uma filhinha de papai que se prostituiu por diversão, ter seu livro entre os mais vendidos. Livros sobre prostitutas e suas vidas, sempre houve, mas apologia clara à prostituição é recente.

Havia cores, muitas cores. Ninguém era discriminado por usar uma blusa rosa choque e calças verde folha. Houve muitos exageros, mas estes exageros davam inspiração para roupas utilizáveis, que mesmo assim quebravam qualquer monotonia. Transgredir, significava ser alegre em momentos onde a sobriedade costumava imperar, não depredar e tornar o ambiente apocalíptico.

Alegria era uma tônica tão forte, que nisto consistia a noção de "curtir a vida". Não se pensava em ter tudo agora e na velocidade máxima, não havia as bobagens supérfulas que temos hoje, mas sem as quais vivíamos muito bem, obrigado. Cada um escolhia o que queria fazer e ia fundo. Hoje se tem tudo ao mesmo tempo de modo tão superficial que depois vem o vazio. Se teve tudo e nada se aproveitou. O mau gosto era pautado pelo exagero, não pela vulgaridade.

Lembremos, foi a época do fio-dental, dos maiôs mais cavados da história, mesmo assim ninguém ficava feliz com a pecha de "piranha", a quase nudez aumentava os cuidados com a postura, pois ser chamada assim era vergonhoso para a moça e sua família. Hoje é elogio. Há pais e mães que exibem a lista de ficantes dos filhos.

Ainda valia à pena ver televisão

Aqui eu desabafo. Vídeo Show é o programa mais inútil da história. Mas já foi divertido, útil, altamente cultural. Fazia jus ao nome. Havia menos atrações, mas eram mais relevantes, assim como o valor que davam à memória televisiva. Digo o mesmo para praticamente todos os programas de todas as emissoras. Mesmo o que era ruim, era ao menos bonito e divertido; não um ou outro, mas ambos. Os clipes musicais, se pecavam pela técnica, mostravam o que interessa: a música. Era preciso cantar. Os grupos de gente pelada, que só rebola e solta grunhidos, caíam rapidamente no esquecimento. Um mínimo de beleza e harmonia era essencial.

Os programas de humor ainda eram engraçados. Fazer piada não se resumia a soltar um bordão, um palavrão e tirar a roupa, isto é para boates de baixo calão. Os bordões eram tão bem empregados, que quando soltos causavam acessos de risos por si mesmos. Crianças, mesmo com a sensualidade exibida, podiam assistir aos programas sem medo. Elas viam aquilo no cotidiano e a malícia ficava entre adultos. Todo mundo ria e se aliviava do dia duro de trabalho.

Criança era criança, sem protecionismo

Como já disse, as crianças viam os programas de televisão com os pais. Era uma babá electrônica, não uma mãe electrônica. Quem assistiu aos desenhos do Perna Longa (como eu) não se tornou violento nem malandro, não por causa disso. Corpos expostos faziam parte da cultura de então, as crianças ainda podiam ganhar seus trocados em bicos. Sim, houve exploração de mão de obra infantil, abuso sexual e tudo mais. Acabou? Não. São justamente os radicais pela moral e os pela "justiça social" (dúbia e pessoal) que mais incentivam o sub emprego infantil. Sob a desculpa de proteger a infância, as crianças estão sendo imbecilizadas, poupadas de tudo e de todos, praticamente intocáveis. Mas ninguém permite que se acolha o menino de rua, acreditem, pode dar cadeia. Até aquela época se via como caridade e bom-samaritanismo.

Criança era corrigida, se houvesse violência então a delegacia era acionada. Limpar a casa não é vergonha, ou pelo menos não era nem crime. Um pai podia pôr uma filha no colo, em público, abraçar e beijar sem ser preso e espancado sob a acusação de pedofilia.

As crianças estão sendo tão protegidas, que estão ficando tolas. Explicar uma piada não óbvia é um suplício. Até os filmes precisam ter tudo mastigado, feito papinha de bebê. Pegar as cousas no ar é nostalgia. O mundo ficou neurótico e o bom senso foi para o beleléu.

Eu poderia ficar aqui, escrevendo e meditando, por muitos dias. Mas o que já fiz dá uma idéia. Lembremos de um facto importante, se algo não é realmente bom, não sobrevive, não faz falta, não volta. Não que tenha sido uma época maravilhosa, eu já disse que não. Foi a fronteira de uma época boa para uma ruim, que estamos vivendo hoje. Todos os avanços científicos e políticos não conseguiram refletir naquilo que faz toda a diferença: A pessoa. A pessoa se sente cada vez pior e mais presa ao que deveria facilitar sua vida. Mas a cultura do tudo aqui e agora cega a maioria de nós, que não vê que os progressos materiais não nos tornaram mais felizes, como se prometia. Ninguém era infeliz por se levantar para trocar o canal, ter que sair para comprar pizza, enfim, as dificuldades eram comuns como são no mundo real, fora da bolha de distrações fúteis que temos hoje.
Guardadas as devidas proporções, foi isso que Hitler fez com a Alemanha.

14/06/2009

Faltam cores

New está certa. Faltam cores nos leques oferecidos pelas montadoras. Embora a culpa não seja exclusivamente delas.

As concessionárias economizam com estoque, com a baixa oferta de cores, por isso mesmo não estimulam a população a escolher cores. O povo, por sua vez, fica com medo de na hora da revenda, ficar difícil passar o possante para frente. Deixam de comprar o que gostam para agradar aos outros. A argumentação de que há cores mais fáceis de vender cai por terra, quando se analisa seriamente o mundo dos carros usados.

No meu tempo, não havia tanta exigência estética na compra de um usado. Primeiro porque compra um carro usado quem precisa, se pudesse compraria um novo e escolheria desde a cor até os acessórios da loja autorizada; Segundo porque ninguém tem os mesmos gostos que os outros, por mais predominantes que sejam. Se olhavam a estrutura e a mecânica, nem sempre a cor decidia a compra. Nem todos gostam realmente de cores sóbrias, a prova é o sucesso de vendas do Ecosport, que oferece tons de amarelo e vermelho dignos dos anos 1970, bem como as picapes grandes, como a F250 e as mais arrojadas, como a L200.

Na verdade, perguntando às pessoas que compram carros usados em tons de cinza, preto, branco ou prata, vi que elas também têm muito medo de ser difícil passar o carro para frente, mais tarde. Há, nas redondezas do meu bairro, uma F250 laranja-tô-podendo, não bastando o tamanho, o carro é visível a quilômetros, mesmo de noite.

Notaram? Não é gosto, é medo de rejeição. Neste caso é psicologia agravada pela economia. As pessoas não compram o que gostam porque alguém (quase sempre garageiro) pode usar o mito instalado para depreciar o carro. Os ladrões agradecem.

Os carros estão todos muito iguais, com essa monotonia cromática fica fácil roubar um e escondê-lo no próprio trânsito pesado das metrópoles. Ninguém tenta roubar um Opala SS 1975, simplesmente porque os tons que oferecia (principalmente aquele verde escandaloso) o destacavam no trânsito por mais cores que os outros carros tivessem. E eram muitas cores, era praticamente impossível confundir dois carros na multidão rodante, a não ser que fossem duas Kombis dos correios.
Ah, a Kombi. Lembro que ela já teve um leque muito bom de cores, inclusive contou, por muitos anos, com a charmosa pintura saia-e-blusa, com a parte acima da linha da cintura branca e a de baixo em outra cor qualquer, como vermelho, azul ou verde. Hoje só sai branca, alegam que para reduzir custos. Mas não dava para oferecer cores opcionais? Eu conheço mecânica industrial, sei que é possível, muito mais questão de vontade que de técnica ou economia. Mas não é a primeira besteira daquela que já foi minha montadora preferida.

Não que eu escolhesse uma combinação de roxo e vermelho escarlate, se fosse comprar um carro novo, mas um azul celeste intenso eu compraria.

Aliás, as seguradoras parecem ainda não ter notado o tamanho da seriedade: É muito fácil esconder um carro no trânsito. Se um ladrão tiver que escolher entre um Ecosport amarelo e um dourado-esmaecido, o segundo será candidato a virar clone. É muito fácil. Cores que o mitológico mercado (que não passa de multidão, multidão não raciocina) compra em excesso facilita a vida do meliante, dificultando a recuperação e tornando o carro uma escolha mais óbvia. Porque não se oferece um dourado vivo, mas tons esmaecidos ou sombrios de dourado, o mesmo valendo para a prata. São tons muito parecidos e muitíssimo fáceis de confundir com outros. Imaginem o cidadão chegando à seguradora e ouvindo "Cinza? Bem, então há um acréscimo de 5% na franquia". Asseguro que um saia-e-blusa vermelho e branco é tão ou mais sóbrio que as cores tristes tão em voga, mas muito mais difícil de esconder, seja no trânsito, seja em uma vila da peripheria.

Quem dera fosse só (?) com os automóveis. Hoje as pessoas acham prejorativamente brega ter um liquidificador azul na cozinha, pior ainda se toda esta for colorida. Tudo tem que ser branco, cinza ou preto. Meu, a cozinha é o coração da casa! Se o coração da casa é sombrio e triste, que dirá o resto? Nem panos de prato bem bordados são admitidos, porque não se acha chique. Desculpem, mas sou do tempo em que chique era ser sem fazer força, sem querer seguir modas ou (muito menos) agradar aos outros. Se a questão é ser "chique", sigamos o exemplo da Rolls Royce, que oferece a cor que o cliente escolher, seja ela qual for e em que combinação for.

Alguém pode argumentar que o mundo está sombrio, que a sociedade está sombria e que o "mercado" só reflete as tendências. Repito então: Não existe mercado. Existem multidões que, como tais, não raciocinam, portanto também não se regulam, ficando à mercê de qualquer espertalhão que saiba vender suas idéias, sejam quais forem. Multidões não raciocinam, portanto também não escolhem, simplesmente seguem. O mundo e a sociedade são as pessoas, os indivíduos; eu, tu, ele, nós, vós, eles. Cada um de nós, não um ser sobre humano e intangível. De cada um de nós, eu não aderi a essa histeria pré fabricada.

Se começam a aparecer pedidos de ventiladores verdes, carros lilazes, armários de aço azuis, eles serão fabricados, no mínimo como opcionais, dependendo da demanda, esta que depende de cada um de nós.
Houve uma tentativa, nos anos 1980, de resistir à melancolia coletiva em que mergulhamos, por conta das besteiras que nós mesmos fizemos. Houve exageros de formas e tons, mas foi uma tentativa de as pessoas não se entregarem. Porque só às trevas interessa uma população apática e conformada. Das cores passaram para os filmes, os programas de televisão, as músicas, até os quadrinhos. Tudo ficou triste e pessimista. Feio. A alegria não se expressa mais no jeito de ser, mas nos abusos, na vulgaridade e na depredação.
Eu gostava mais quando cores e formas davam nossos recados.

07/06/2009

Sou republicano, mas...


Tenho um viés monarquista. Deixo claro que sou infinitamente democrata, que ninguém deve ser punido por causa daquilo em que acredita e pensa, que até mesmo os adoradores de imbecilidades televisivas têm o direito de aniquilarem seus neurônios.

Mas eu não me constrangeria em chamar alguém de Majestade. Da mesma forma como não me importo em chamar o presidente de Excelência, se bem que por este tratamento um monte viraria as cabeças, pensando ser consigo.

Quando se deu aquele plebiscito mal feito, mal divulgado e mal esclarecido, votei na república presidencialista. Eu já tinha esta tendência, mas alguns factores pesaram a mais na minha decisão. tanto parlamentaristas quanto monarquistas (seja por decurso de tempo ou o que for) não apresentaram argumentos plausíveis para me convencer. Ambos vendiam suas idéias como a salvação da pátria, exemplificando países onde há monarquias e repúblicas parlamentaristas com elevados padrões de vida, segurança, estabilidade social e boas tradições. Não explicavam, entretanto, como essas idéias poderiam ser aplicadas por cá com o mesmo desempenho, assim como não fizeram menção aos países monarquistas e/ou parlamentaristas que estão em situação bem pior do que a nossa, ou são ditaduras sangrentas. A China, ainda que tendo um presidente, este é eleito pelo partido comunista, na prática é um tipo de parlamentarismo da pior espécie.

Também se esqueceram de citar que temos na América uma república (ainda que muito estranha) que é o país mais rico e poderoso de todos os tempos, gostemos ou não é o cérebro do planeta. Tá, um cérebro dando curto, mas ainda um cérebro.

Não acredito que não tivessem melhor argumentação, acredito piamente que muitos dos integrantes pró mudanças tinham, mas não foram ouvidos nem receberam canais para divulgação adequada. Quando digo "adequada" me refiro a recursos materiais, monetários e midiáticos para que as pessoas digam os motivos que as convenceram a aceitar esta ou aquela idéia. Ninguém me disse porque acreditava que um rei e um primeiro ministro juntos fariam o que os presidentes não fizeram até então. Só me disseram que fariam e ponto final.

Outro problema é que houve debate demais e esclarecimento de menos. Debates se fazem entre pessoas que conhecem um mínimo do assunto, sem o quê o debate se torna uma aula bastante tendenciosa. Para debater, a população deveria estar a par do que é cada sistema e forma de governo. Mas quantos brasileiros se lembram de que já fomos uma monarquia? Quantos, pior ainda, se lembram de que já fomos parlamentaristas? Os motivos para que sejamos uma república presidencialista, então, nem pensar.

Entre correr o risco de dar com os burros em águas desconhecidas, e o de dar com os burros em águas onde sabemos onde estão as pedras, o povo não teve dúvidas, continuamos elegendo um presidente a cada quatro anos, que traz um vice na mochila e um presidente do senado para substituir a ambos, em último caso.

Digo isso porque as propagandas pela continuação do presidencialismo também foram podres. Qualquer pessoa minimamente bem informada sabe que ninguém fica de joelhos diante do rei Carl XVI Gustav. Se houvesse uma quarta opção plausível, os presidencialistas teriam me convencido a dar um pé no traseiro do presidente.

Tudo esclarecido, explico que não sou "Conservador" na acepção prejorativa da palavra. Tenho a mente bastante aberta, mas esta abertura tem o filtro do bom senso e da ciência gregária. Sei que uma boa tradição, se bem enraizada, pode sustentar um povo nos momentos mais dolorosos, como sustentou os ingleses durante os bombardeios nazistas, e reergueu os japoneses após a guerra. Humildade faz parte da educação de um rei nos dias de hoje.

Me agradaria saber que ao menos uma pessoa responderia a vida inteira pelo país, não haveria a desculpa de responsabilizar o antecessor pelas cacas espalhadas. Não me importo que uma pessoa tenha poderes perpétuos, não me interessa que esta pessoa pense diferente de mim. Minhas preocupações são com o povo, este sim é a nação. Os judeus só há menos de cem anos têm um território, mas sempre foram uma nação. É notório o cuidado com que cultivam suas tradições e (embora haja os chatos) estas não impedem que gerem pesquisas e tecnologias novas, algumas de ponta. Pelo contrário, é para preservá-las que este povo abençoado (excluamos a politicália que gera os atritos fronteiriços) se esmera em encontrar soluções novas para os problemas, que nunca são exactamente os mesmos ao longo dos anos. O universo muda o tempo todo, as boas tradições ensinam isto.

Entretanto, ao contrário do que aconteceu ao longo dos séculos, tenho a convicção de que realeza e nobreza têm uma obrigação básica e vital para com a plebe: dar o bom exemplo. Sempre. Erguer palácios, estradas, pontes, conquistar territórios e aparecer bem nas capas de revistas fazem um rei entrar para a história, mas não ajudam a instruir o povo. Reconheçamos que bons exemplos a nossa república nunca deu. Um bom exemplo vindo de cima se reflete rapidamente na base.

Aliás, a experiência republicana na América Latina não é das mais felizes. Desde ditadores que juraram estar defendendo a democracia contra os comunistas, até malucos jogando seu país em pandarecos numa guerra contra uma super potência mundial, tivemos de tudo. Quando um presidente entrava, qual a sua primeira providência? Lembram? Não? Eu me lembro: desmanchar e abandonar tudo o que o antecessor fez, não interessa o quanto estivesse beneficiando a população, o governo anterior deveria ser esquecido ou odiado. O que um rei faria? Culpar seu pai, sob o risco de ganhar uma surra da rainha mãe? Ele teria que baixar a cabeça para as besteiras feitas e tentar consertá-las. Seria uma pessoa que (não importa a profissão que escolhesse, esta poderia ser livre) seria preparada durante toda a juventude para representar o país, ao contrário de parlamentares que compraram seus diplomas e propõe leis que desafiam a própria constituição, quando não as leis da física.

Digo mais, acredito que as monarquias se tornarão mais populares, doravante, porque representam uma estabilidade que falta na vida comum, assim como na vida corporativa das empresas. Por mais aventureira que seja uma pessoa, ela precisa de alguma estabilidade, ainda que meramente de referência. Hoje sabemos que a gravidade puxa para o centro, não para baixo, mas foi uma mera mudança de conceito, a essência continua a mesma: se afastar requer energia, se aproximar poupa energia. Ou seja, até para a subsistência global existe ao menos uma referência confiável. E quem confia, em são consciência, em políticos?

O presidente, por melhor, mais "honesto" e competente que seja, é um político e está comprometido com seus partidaristas, em menor ou maior grau. Isto nós sabemos de cor.

Não quero, com este texto, deflagrar uma campanha ou movimento pela restituição da monarquia no Brasil. Só repito: A monarquia será um modo cada vez mais popular. Em meio a celebridades fabricadas, mais falsas do que frutas de cera, uma princesa tem um motivo para ser célebre, ela deve alguma mínima satisfação de seus actos e palavras, ela precisa de conteúdo. Um dia os artistas fabricados não saciarão mais a população, que então se voltará para quem jamais perdeu a majestade, os artistas realmente talentosos e a nobreza.