30/07/2008

Ética prática



Todo mundo fala em ética. Todo mundo exige ética... dos outros. Pois todo mundo diz que ninguém é ético e quem não seguir a correnteza é trouxa.


Eu poderia me perder em divagações redundantes sobre a origem da palavra, o conceito primitivo e toda uma etimologia completamente supérfula. Seria até divertido, teria o aval dos catedráticos, mas não seria ético. Eu estaria pleiteando glórias em detrimento da missão que me foi confiada. Vão cinco regrinhas pragmáticas que qualquer um pode praticar.


Primeira regra - Faça consigo o que gostarias de fazer ao próximo. Que foi, bem? Achaste que eu iria dar a velha e surrada regrinha de "Faça ao próximo o que gostarias que lhe fizessem"? Não, primeiro experimente o teu remédio, depois dê para que experimentem. Se te der vontade de esganar alguém, siga estas instruções: Peque uma gravata ou encharpe longa, dê uma volta no pescoço, segure firme as duas pontas e estique fortemente os braços para os lados, agora tente respirar. Viu como foi didático? E ainda pudeste se livrar da agonia para colocar a lição em prática. Decerto que nem tudo precisa chegar a este termo, mas com a prática as idéias homicidas desaparecem, chegará o momento em que a dor do outro vai repercutir em ti, então já estaremos conversados.


Segunda regra - Não faça com o outro o que ele não quer que seja feito, mesmo que gostarias que fizessem contigo. Pensa bem, filhote, tu gostas de rock da pura, de balada da mais fina categoria, falou que é de turma lá estarás tu. Mas há gente que gosta da solidão. Eu sou assim. Muito mais gente do que imaginas é assim. Aquilo que te faz falta, pode ser justo o que o outro tem em excesso e do que queira se livrar. Se queres agradar, então se informe a respeito dos gostos e necessidades do próximo. Quase sempre a presença amiga é suficiente, pois há pessoas que não gostam de receber presentes, o que não é o meu caso, mas conheço alguém. Por mais que te dê espasmos, alguém no mundo gosta de musiquinhas melosas e diabéticas dos anos 1920/30, e desde que não invada o teu espaço, deves respeitar.


Terceira regra - É teu? Não? Então não ponha a mão. Parece tão óbvio! Mas quase ninguém acha que só uma olhadinha com a mão trará problema. Mas traz. Há gente metódica, que tem na organização de seu ambiente um elo com a sanidade, e pessoas realmente metódicas percebem alterações milimétricas em tudo o que têm. Não se enganes, não é frescura, e se for não é da tua conta. Também há cousas que parecem com as do cotidiano, mas podem ser instrumentos específicos e difíceis de se conseguir, ninguém conhece todas as artes e ciências. Vale o ditado dos antigomobilistas: Carro antigo é como mulher de amigo, tu admiras, mas não põe a mão.


Quarta regra - Dê o exemplo. É aqui que a porca torce o rabo! É seguramente a mais difícil de todas. Pense na cena: Uma mulher com roupas caras, óculos caros, batom que compraria todo o estoque de uma boutique popular, sapatos de couro de Dragão de Komodo albino, laquê artesanal montado molécula por molécula por um laboratório exclusivo, jóias confeccionadas para a Rainha Claópatra, et cétera. Um nojo de chique. Agora imagine essa senhora abrindo uma embalagem de chiquete, começando a mastigar feito ums ruminante e jogando o papel no chão, sem nem olhar. Tem muita gente pobre que guarda seu lixinho no bolso até encontrar uma lixeira pública. Vale o mesmo para o trânsito e tudo mais; se sabes que mereceste a multa, pague. É teu direito recorrer, mas pagando e não reincidindo, vais ensinar ao teu filho que nem tudo o que é permitido é lícito. Se ele aprender esta lição contigo, em vez de aprender na escola chata e depredada, vai querer imitar e até ensinar aos amigos. Tua ação tão simples pode dar mais frutos do que imaginas.


Quinta regra - Não confunda tolerância com indiferença. Muita gente que chega do exterior fala da tolerância que existe no "primeiro mundo"... Dá licencinha... RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ... Voltemos ao caso. Muita gente que imigrou do "primeiro mundo" me conta outra história, diz que se alguém morrer na rua, só removem o cadáver quando começa a incomdar a coletividade com o mau cheiro. Eles não toleram a diversidade e a liberdade individual, eles simplesmente não se importam com o próximo, mesmo que o outro esteja à beira de um suicídio. Campanhas internacionais, tudo bem, pois estão agindo em prol de uma causa, mas danem-se as pessoas. Longe de aconselhar que alguém bedelhe a vida alheia, se importar com a situação do outro não é invasão de privacidade. Não penses que se interessando por um drama familiar, serás mal visto, salvo se o sujeito for um cafageste que espanca esposa e filhos. Pergunte como vai, se disponibilize para uma eventual ajuda e isso será o suficiente para o outro não se sentir totalmente sozinho. Será um potencial suicida a menos, ou um potencial surto psicótico a menos. Com o tempo, infelizmente pode levar muitos anos (talvez décadas), os frutos virão, tanto para os outros quanto para ti.


Isto não é tudo, mas é o mínimo básico sem qualquer opcional, nem rádio AM-FM. Mas é o bastante para começar. Se ao menos tentares, mesmo sabendo que vais falhar muito, já estarás melhorando o teu mundo. Se mais alguém vai seguir, é problema deles, a tua parte já está sendo feita.

19/07/2008

A mulher que amarei



Não quero uma mulher melancia. É cousa que, quando boa, se come a polpa e depois lança-se ao lixo, ou à compostagem que é o correcto. Além de ser mais incômodo do que mala, para carregar.


Não quero uma mulher mamão. Já tenho um intestino muito bom, só me serviria para ter diarréia, se estivesse madura, ou fazer compotas, caso estivesse verde. Mas estando verde, seria pedofilia; não, obrigado.


Não quero uma mulher filé. Não como carne vermelha. Ainda que comesse, só dura se congelada lá nos cafundós do freezer, o que a tornaria inútil, se fosse aproveitar teria que preparar e consumir rapidamente. Sendo bovina, há sempre o risco de conter hormônios em excesso, o que me exporia descenessáriamente ao risco de um câncer escorpiano.


Também não quero galináceas, piscianóides, plastificadas ou qualquer outra bobagem mercadológica feita para erigir falos. Para forçar à compra de porcarias que demandam pouco investimento e vendem rápido. Ideal para lavagem de dinheiro ou outra mutreta qualquer.


Quero uma mulher que vá ao banheiro ao menos uma vez por dia, soltar os barros. Talvez até que tenha um pouco de TPM, de vez em quando. Depois pode chorar sem motivos. Para quê? Será tão bom sentir seu corpo se apoiando em mim!


Uma mulher que não esconda que precisa de maquiagem, quando aquela espinha ainda nova aparece. Ser despojada não é sinônimo de ser desleixada.


Uma mulher que fique de mau humor, em vez de planejar um adultério, mas também que mande os pudores aos raios que os partam quando estiver com o fogo aceso. Que saiba ser respeitosa até de shortinho e bustiê.


Uma mulher que seja uma rainha na lida com as visitas, mas não se furte o direito de expôr a lavadeira quando alguém tentar dizer como devemos educar nossos filhos, que a decoração está fora de moda, que não se usa mais aquele modelo de calças... Sempre há um parente chato querendo ser mandado à casa do chapéu.


Uma mulher que tenha sabido aproveitar o frescor da adolescência, bem como saiba transformar em marco cada marca que a maturidade lhe der. Mulheres de verdade sabem que envelhecem, mas se cuidam em vez de tentar aparentar quinze anos, depois da menopausa.


Quero uma mulher de verdade, que seja bela como é, da base ao ápce. Que não coloque um quilograma de silicone em cada seio para chamar atenção, ou esconder a falta de conteúdo. A boca trai os vasos encerados.


Quero uma mulher que saiba sorrir sem constrangimentos, chorar sem vergonhas, andar leve como quem anda com os pés no chão. Que troque sozinha a lâmpada da sala, mas não se envergonhe em me chamar para matar uma barata.


Quero uma mulher que seja maravilhosamente comum no formato do rosto, linda em sua simplicidade cotidiana, não preciso que outros a achem linda também. Se tiver uma beleza acima da média, que esta se reflita nos olhos, pois eles não mentem. Que seja bela por completo, não por partes.


Não precisaria usar vestidos rodados, sei que são pouco práticos. Tampouco precisaria ter mil e quinhentas receitas de bolos e biscoitos de memória, eu cozinho bem.


Não precisa tocar piano, cantar ou ter algum talento hipertrofiado, não busco uma artista para agenciar. Mas se souber, serei o primeiro a fundar um fã clube.


Quero uma mulher honesta, de carne e osso, que chore por bobagens e solte arroto. Que diga que "hoje não, estou com dor de cabeça". Que aceite me acompanhar na caminhada longa e íngreme que todo homem honesto enfrenta. Que me dê colo quando eu cair exaurido, também que não esite em pedir o meu.


Uma mulher de verdade não é como garrafa de refrigerante, cujo conteúdo se encomenda a um químico qualquer e o casco se rotula nos dissabores da moda. Uma mulher de verdade não admite isso. Tem respeito por si mesma.


Uma mulher de verdade comete gafes, aprende com elas, come biscoitos de chocolate às escondidas e diz que na segunda-feira começa com a dieta.


Uma mulher de verdade suporta com coragem a enfermidade mais grave, mas se dá o direito de gritar estridente quando o esmalte descasca.


Uma mulher de verdade, quando o homem não presta, é a bruxa que se escondia sob a pele da elegante madrasta má. Mas quando ele merece, sabe ser a própria Grace Kelly. É tão encantadora e sofisticada quanto discreta e singela.


Uma mulher de verdade não se vende, mas se derrete quando o sujeito toma homência, pede para terem uma conversa e mostra as alianças que comprou com sacrifício.


Uma mulher de verdade pode ser a mais brava das amazonas, mas se transmuta na mais doce donzela quando ouve, sem motivos aparentes e sem aviso prévio, "Eu te amo".


Quero uma mulher de verdade, à quem possa perguntar sem medo: "Quer se casar comigo?".


Quero uma mulher de verdade, que não esconda a paixão de adolescente pelo Ronnie Von, pelos Menudos, que já tenha sonhado em ser a Patrícia Pilar para beijar o Tonny Ramos.


Poderia dizer que não quero uma mulher perfeita, mas estaria mentindo. A mulher que descrevi é perfeita. Aliás, mais-que-perfeita. O que quero com frutas rebolantes? Aquela que me arrastar para o altar fará comigo tudo o que os idiotas, com o devido respeito aos verdadeiros portadores de idiotismo, sonham fazer com os bifes sacolejantes que infestam programas de auditório.


Aquela que aceitar me tolerar e dividir comigo uma cama, salvo quando me mandar dormir no sofá, não precisará contrair lordose para chamar minha atenção, o lento desabotoar de uma blusa fará isso muito melhor e sem estragar a coluna. Ignorarei minhas constantes e violentas cefaléias para consolar esta mulher, quando a unha quebrar.


Ainda que não a mereça, esta mulher sabe dar valor ao homem que tem. E quando toma as rédeas da casa, o progresso é certo.


Um dia, quem sabe, talvez eu publique aqui um texto inspirado no meu casamento. Mas só depois que encontrar esta mulher. Toda mulher que se dê ao respeito é perfeita. Fruta eu compro na feira.

05/07/2008

Lafassigal


Um país muito pequeno, porém próspero.

A República Educativa de Lafassigal seguia com suas dificuldades e soluções, como acontece com qualquer nação. Suas demandas eram razoávelmente atendidas e seu povo vivia em relativa paz, mas uma paz frágil. Haviam setores politizados em Lafassigal, dentro destes haviam os partidarizados, os que constituíam a verdadeira ameaça.

Certo dia, um grupo de gente bem intencionada, mas meio ingênua, implementou tantas cousas a olhos vistos, gerando tamanho contentamento, que despertou ciúmes dos inimigos políticos. A ingenuitade tenaz dos camaradas organizados, não permitia antever que a baixeza alheia seria capaz de prejudicar uma comunidade inteira, apenas para ver seus desafetos caírem. Só que eles não sabiam que eram desafetos. Houveram discussões, sim, mas isso há em toda democracia.

Por D'us que era gente honesta e ordeira, incessantemente trabalhando comunitariamente e organizadamente, sem fins lucrativos. Ocorre que as eleições em Lafassigal se aproximavam, e um dos membros dessa boa gente se candidatou, para poder fazer mais sem se preocupar tanto em dar satisfações desnecessárias. Mas não há eleição com candidato único, e os inimigos se declararam. A gente honesta já tinha implementado toda uma condecorável organização, uma estrutura que já atendia à comunidade por inteiro e produzia frutos doces, para quem quisesse provar.

Vocês conhecem um pouco de política? Então sabem que as éticas são muito deturpadas por uma percentagem muito grande dos políticos. A politicagem aconteceu, denúncias falsas foram feitas, provas forjadas e tudo o que os próprios detratores apregoavam, antes do pleito, foi jogado às traças.

Eles, que se vangloriavam de participar de uma facção que lutou contra uma ditadura severa, hoje agem como aqueles ditadores. Na base da trapaça e se aproveitando da ingenuidade do povo de Lafassigal, fizeram tudo igual ao que juraram combater... e ganharam as eleições.

Incólumes trabalhadores de cada ordem, porém, nossos amigos continuaram a trabalhar naquilo a que se propuseram, sem demonstrar abalo. Ingênuos. A politicagem não tem lado, seja qual for o radicalismo. Estourou um escândalo, os cartões republicanos, criados para desburocratizar o cotidiano de Lafassigal, foram usados em proveito próprio, como um segundo e muito mais polpudo salário, pelos vencedores (?) do pleito. Eles bradavam contra a corrupção, hoje se corromperam, pois os métodos baixos são como uma droga, quem os pratica uma vez se sente tentado a praticar sempre. Longe de se sentirem abalados, os membros da situação forjaram outra maracutaia e, sem um poingo de verginha, jogaram no grupo honesto a culpa de tudo, inventando ainda outras acusações. Nada foi provado, absolutamente nenhum indício sério foi encontrado.

Tarde. os incrivelmente talantosos e criativos obreiros foram punidos, se não como os corrompidos queriam, com a perda de toda a estrutura erguida, que hoje está às moscas. O povo de Lafassigal ficou sem seus benfeitores?

NÃO!!! De jeito nenhum! Ocorre que o mundo é vasto e eles encontraram outro lugar para erguer outra estrutura, longe da sanha corrompida dos pseudo heróis, estes nada mais do que saudosistas de uma ditadura que os permitia ser irresponsáveis como queriam.

Imaginem o que querem, pois é na imaginação, tão combatida pelos materialistas, que os sonhos mais sinceros começam, e por ela eles se desenvolvem.

Tramem o meio de realizar, pois um planejamento bem tramado dá sustentação para qualquer ambição lícita, mesmo as mais delirantes e aparentemente surreais.

Continuem com a empreitada, pois os inimigos contam justo com tua desistência para te colocarem um pelego e, aos poucos, se tornarem seus senhores.

Organizem suas idéias. Sabendo o que fazer e quando fazer, os imprevistos terão um impacto muito menor, ainda que gente desonesta se aproveite de teus tropeços.

Nossos heróis não são ficção, o que relatei aconteceu, mas romanceei tudo para que não haja margem para represálias e, principalmente, para que sirva de lição também para as eleições que se aproximam, como para tudo mais na vida. Atentem aos que trapaceiam aqui, pois quem aqui o faz, lá faz igual.