26/09/2013

O peixe do estrangeiro


Dois fazendeiros, um de Jataí e um de Rio Verde, se encontram para a prosa de todo sábado à tarde. Trabalhadores, mas completamente desactualizados com tecnologias modernas, cuja operação delegam aos filhos, logo começam com um assumto...

- Cumpadi, ocê já viu qual é a moda de comida, hoje?
- Não! Qual é?
- Eu nunca comi, mais parece que é um trem bão demais!
- Se num comeu, comé que sabe que é bão?
- Minha filha falou. Ela disse que já tem milhões de pessoas pelo mundo, que come todo dia. e já tem gente viciada, de tão bom que é! Parece que é um pexe que só dá lá nos esta'zunido!
- Ué! Intão deve de ser muito caro! Se é importado e só dá num lugar!
- E merm'assim o povo come todo dia!

O rioverdense matuta, tenta puxar pela memória, enquanto o outro dá um trago, mas não imagina que tipo de peixe possa ser...

- É pexe de água doce ô salgada?
- Num sei. Sei que tem até briga por causa dele. Tem país que até censurô, porque o povo tava fazeno bestera pra conseguir.
- Censurô? Quer dizer, racionamento?
- Acho que é! Cê sabe, se o povo compra demais, a balança econômica fica em déficit!
- Mas esse pexe deve ser gostoso demais! Vô querer experimentar.
- Minha filha falô que amanhã eu vô conhecê. Vô vê se te sobra um pedaço.
- Uai, eu fico agradecido, cumpadi. Mais, me fala, quem é que produz esse pexe?
- Eu até pensei que era brasileiro, por causa do nome, mas é americano do estrangeiro mermo. É um tal de José Quembergue, que o povo chama de Zé Quembergue, ele já deve tá íntimo dos fregueis.
- Esse nome num me é estranho... Mais num me alembro de onde ouvi...
- O rapais tá bilionário, vendendo esse pêxe pro mundo todo.
- Ué, se só ele sabe produzir e todo mundo gosta, que come todo dia, então enrica fácil mermo! Mais, que pexe é esse mermo, cumpadi?
- É pexe buquê.

Ele olha o amigo de longa data com uma cara de espanto! A primeira coisa que imaginou, foi um buquê de noiva nadando rio acima...

- Pexe buquê?
- Strai'né?
- Cumpadi, num tem nada dos estrangeiro  que eu não ache estranho! Minissaia, por exemplo!
- Num gosta?
- Gosto muito! Falei que é estranho, não que não apreceio! É, quem sabe esse pexe buquê...
- Minha filha garantiu, falô que no começo vô estranhá, mais logo o trem fica bão! Só me alertou pra eu não me iludi com promessa de pexe buquê de cor diferente. Só tem azul! Os otro é falso!

Agora ele imagina um buquê azul subindo o rio, com um monte de buquês coloridos atrás, tentando acompanhar...

- Onde foi que a Mariinha incontrô esse pexe?
- Nas interlete.
- Ah, a interlete! Até hoje não intendo comé que funciona!
- Nem eu, nem quero. Só quero comê esse pexe! Diz que tem gente que até arranjô casamento, depois que comeu!
- Ué! Itão divia chamar pexe Sant'antoin! Agora é que vô querê um pedaço! Já tô cansado da viuvez!

O celular do jataiense toca. é a filha dele, avisando que já pode ir experimentar o facebook. Eles de despedem e o amigo promete mandar um prato para ele.

18/09/2013

Os trólebus, para quem não os conhece

Saudoso trólebus de Ribeirão Preto.

É difícil selecionar uma ou duas incoerências do poder público nacional, então temos que nos ater aos urgentes, que também são muitos. Então acabo optando pelo que me aparece pela frente. Agora é a vez dos trólebus.

Simplificadamente, são ônibus com motores eléctricos que usam a rede aérea de energia, por meio de uma haste tetrátil que funciona como fio da tomada. Os mais modernos têm baterias e se recarregam aos poucos, quando páram nos pontos, o que lhes garante uma mobilidade que os de haste não têm, alguns até contam com um pequeno motor diesel para estender a autonomia.

Aos compatriotas que moram longe do centro do país, pode parecer óbvio o que descrevi, mas a maior parte do território nacional não conheceu os trólebus. Muita gente sem sabe que eles existem. E se depender de prefeitos do naipe de Marta Suplicy, que demonstram saber mais de supercordas do que de transporte público, o interior do país nunca terá os benefícios desses ônibus singulares.

Felizmente não depende só deles. Infelizmente, mesmo assim, eles conseguem atrapalhar muito. Se eles desejam ou não um transporte público decente, não sei, nunca me coloquei à sua frente para ler seus pensamentos. O que sei é que eles não têm a mínima noção do que seria um transporte público decente; estou sendo gentil.

Quem já viu, como eu, o motorista descer do ônibus e entrar em uma drogaria, implorando por um analgésico, sabe do que vou falar agora. O nível de ruído dos ônibus de que dispomos é muito alto! Atenuaria muito se usassem motor traseiro, que continuaria a incomodar os passageiros, mas incomodaria muito menos os motoristas. O problema é que nossos ônibus não passam de caminhões encarroçados, e francamente eu não conheço um só caminhão brasileiro, com motor traseiro. Sai mais barato, a estrutura de motor à frente já existe e é feita aos milhares, para transporte de carga.

Sim, meus amigos, vocês leram certinho! Somos transportados por veículos de carga adaptados ao uso de passageiros! Sem cintos de segurança e quase sempre usando os duros e melindrosos feixes de mola na suspensão. Não raro, os amortecedores são simplesmente retirados, quando precisam ser trocados, deixando as molas sem controle algum. Tudo isso com a plena aquiescência das prefeituras. Se eles não se importam com suas vidas, vão se importar com sua sanidade mental?

Pesa contra os trólebus antigos, a completa dependência dos fios de alta tensão dos postes. Se a haste caía, eles paravam. Se a energia acabava, facto recorrente, eles paravam. Não por problema do trólebus, mas por falhas de infraestrutura, inclusive do asfalto de péssima qualidade, que faz qualquer veículo dar pulos. Lombadas e valas para redução de velocidade, são exclusividades de países onde a educação é artigo supérfulo.

Em muitos países, os trólebus modernos estão substituindo os bondes com grande vantagem, porque não ficam presos aos trilhos, eles têm baterias próprias, podem rodar muitos quilômetros sem precisar da fiação aérea. Quando têm um motor para estender a autonomia, ele pode ser pequeno, com uma fração da potência do motor de tração, podendo ser mais silencioso e só trabalhar por curtos períodos. Quando precisar, há casos em que eles têm que ser ligados por alguns minutos, para não travarem por falta de uso.

Mas, é claro, isso acontece em países que levam a mobilidade urbana à sério, que estimulam o uso do transporte público em vez de simplesmente penalizar o uso do automóvel. Resolver problemas não faz parte do repertório da política brasileira, torrar o erário em propaganda enganosa e acusar os críticos de golpistas, fazer-se de vítima, alegar intriga da oposição, quando se é situação, ajuda a enrolar o eleitorado e confundí-lo. Deixar pura e simplesmente de dar manutenção, é um modo de convencer a população que os ônibus a combustão são melhores. Nem Rolls Royce dispensa manutenção regular, eles sabem disso.

A grande vantagem econômica dos trólebus, é que se tratam de veículos com concepção naturalmente muito cara. Um ônibus urbano simples, só com o que a lei manda, passa fácil de duzentos e cinqüenta mil reais. Ver exemplos aqui. Fica mais fácil diluir os custos de uma conversão para tração eléctrica ou híbrida. Embora a compra seja bem mais cara, não muito mais, a manutenção é mais simples, há muito menos peças para quebrar e nenhum movimento alternante para fragilizar o motor. Mas veículo que não dá manutenção, não gera licitação.

Para a população e para o motorista, a primeira vantagem é o silêncio. Quase nenhum ruído sai do trólebus, pode-se conversar em voz baixa, ouvir o MP4 em volume mínimo ou mesmo ler algo sem o ronco constante a encher a cabeça. O motorista, pela ausência de ruídos, não estressa tanto, o que resulta em um padrão de segurança muito mais alto. Ele ouve melhor o que se passa dentro e fora do veículo, se antecipando mais a qualquer emergência. Ele chega ao fim do expediente com a audição intacta.

A ausência de descarga, quando o gerador não está ligado, permite que ele circule em ruas onde um veículo a combustão de grande porte não pode, como ruas onde há escolas e hospitais, o que pode significar um itinerário bem mais curto.

O motor eléctrico tem uma vantagem imensa, ele produz força instantânea. O motor a combustão precisa ganhar rotação, velocidade, para conseguir tirar o ônibus do lugar, para isso serve a embrenhagem. Como conseqüência, muitas vezes ele acaba produzindo mais potência do que seria necessária. Resultando em mais desgaste, mais emissões e muito mais ruído, para o desespero de todos o que estiverem a menos de vinte metros do motor. Fora a mania de motoristas idiotas, de jogar fumaça nos pedestres e carros pequenos.

O limite de velocidade em perímetro urbano, é de 60km/h, mas eles têm que arrancar, acelerar, reduzir, frear, retomar; tudo isso exige uma troca freqüente de marchas. Uma operação que exigiria, em média, 40cv em velocidade normal, acaba exigindo quase que potência máxima na maior parte do tempo, o que às vezes significa usar mais de 240cv. Por suas características, o trólebus pode arrancar usando muito menos potência, na maioria das vezes dispensado troca de marchas, não raro dispensando até a caixa de marchas, trabalhando bem próximo à potência mínima na maior parte do tempo. Não admira que as pesadas e arcaicas baterias de chumbo dos nossos trólebus, dêem conta do recado.

Há ainda o menor custo energético. Um trólebus ruim, custa menos de um quarto do que se paga pelo quilômetro de um ônibus. Um trólebus bom, não chega a um quinto. Um de última geração nem se fala! Nem temos no Brasil! Se levar em conta que dificilmente o kWh passa de R$ 0,50, e que ele pode bastar para rodar vários quilômetros, vocês podem imaginar o impacto positivo que um trólebus bem conservado tem nas contas públicas.

Actualmente, que me conste, só temos uma montadora que fabrica trólebus, e converte ônibus para trólebus no Brasil. A Eletra, ver clicando aqui, é a última sobrevivente nacional de uma tecnologia que só prospera do resto do mundo. Felizmente a empresa teve a visão de considerar o mercado externo, que também atende, ou já teria virado página da história. Porque se dependesse do poder público, já teria fechado. O resultado do esforço, é uma qualidade construtiva e tecnológica de padrão internacional, que por aqui nós simplesmente ignoramos.



Um trólebus antigo, em Santos.

09/09/2013

O longevo Século XIX

Fonte: No Amazonas é Assim
Os mais novos não se lembram, mas muita gente esperava que, na virada para este século, o mundo fosse
transportado para o universo dos Jetsons. Lamentavelmente, as coisas não andaram como o esperado e este século, apesar dos avanços tecnológicos, ainda está muito longe de ser o que poderia. Mas que século é este mesmo? XXI? Não, meus amigos, assevero que não. Estamos em pleno e deformado século XX. Não levem o calendário tão à sério, ele só marca o tempo, a entidade secular é outra coisa, e ela ainda não mudou.

Antes de prosseguir, me digam quando terminou o século XIX. Heim? 1899? Não, garanto que foi um "pouco" mais adiante. 1900? Tampouco. A euforia da bélle époque só mascarou tudo, mais ou menos como um anti inflamatório,  que alivia o incômodo, mas não ataca suas causas. O século XIX, meus caros, terminou em 1994, com o fim do apartheid na África do Sul, que era mantido por princípios que de cristãos, não tinham absolutamente nada. Da mesma forma, a máscara de pós-modernidade mascara o psicótico século XX, que ainda vigora.

Fomos iludidos por nossas próprias conquistas tecnológicas, nos convencendo de que estávamos evoluindo e nos tornando mais civilizados. Longe dos olhos sociais, as máscaras caem rapidamente. A idéia de que há pessoas que merecem mais do que as outras, e muitas que não merecem mais do que a subsistência animal, é o que sustentava não só o regime segratório sul-africano, como também o que havia nos Estados Unidos até meados dos anos setenta. Até 1974, em muitos estados americanos, era crime um branco se casar com uma negra, ou vice-versa. E o presidente que os tirou da crise foi justo um negro gaiato com nome oriental!

É a mesmíssima mentalidade que ainda existe, de que mulheres devem ser separadas dos homens, de que elas são as culpadas pelas desgraças do mundo e não podem exercer altos cargos de poder, e nem sempre têm o direito de ganhar seu próprio sustento. A mesma que tem devastado o país com a onda de machismo extremo, que já custou a vida de milhares de ex-namoradas e ex-esposas, já que os fedelhos mimados não toleram perder o que julgam lhes pertencer. E não é só com as moças que fazem isso, essa mentalidade se estende a quem não é do seu grupo e não pode se defender. Tal qual as políticas de colonização vigentes até o século retrasado. Aliás, alguns países ainda têm colônias, algumas voluntárias, outras nem tanto.

Está acontecendo um exemplo claro no Brasil, onde as manifestações estão se dividindo em basicamente dois grupos, um rechaçando as reivindicações e legitimidade do outro. Por que? Porque estão tão apegados às suas bandeiras, ao conceito de que tudo no outro é errado e tudo nos seus é certo, que não se dão conta de que estão ambos sendo manipulados da forma mais elementar do maquiavelismo, ambos pelas mesmas pessoas. Típico do colonialismo, separar para enfraquecer e dominar. E as aldeias idiotas, crentes de que estão do "lado certo", se digladiam, enquanto os colonizadores se apropriam do que é seu.

Assim como no século em questão, vivemos uma época de revolução tecnológica e industrial sem precedentes. Tecnicamente falando, já é possível improvisar com dois guindastes, uma impressora 3D capaz de construir um palácio em uma fração do tempo que levaria, pelo ultrapassado e ainda vigente método de tijolos. é possível construir uma espaçonave, se o interessado tiver recursos, e alugar um avião de grande porte para o lançamento. É possível até mesmo construir um continente no meio do oceano, com recursos suficientes para formar uma nação e prosperar. Já podemos cultivar alimentos de modo a não macular o solo, e fazer com que renda muitas vezes mais do que conseguimos hoje, tornando o custo unitário absolutamente desprezível.

O problema seria que, por serem tecnologias relativamente recentes, ainda são demasiadamente caras, então vamos esperar que ALGUÉM comece a comprar, para que ALGUÉM barateie, e após ALGUÉM atestar que é viável, então compraremos. Só que o problema não é este. Assim como nos anos 1890, ainda estamos com medo das inovações, temerosos de que elas nos engulam, e o cinema não ajuda, só mostrando o lado sombrio de uma humanidade dominada pelas máquinas. Houve, quando do advento da locomotiva a vapor, uma histeria mundial, inclusive em solo americano. Um político chegou a mandar uma carta ao presidente (não me lembro qual, não me pressionem) exigindo a proibição daquela máquina demoníaca. A carta falava em urros selvagens, celeiros e plantações incendiados, animais mortos ou assustados pela visão, crianças atemorizadas, e que Deus certamente não queria que o homem viajasse a velocidades tão perigosas.

Notem que ele se ateve ao medo. Não utilizou absolutamente nenhuma argumentação fundamentada. E Deus não tem nada a ver com nossa burrice, é culpa nossa! Basta ver o episódio recente, em que um senador americano jogava em seu aparelhinho irritante, enquanto o representante da Casa Branca explicava os motivos do bombardeio a Síria. Ou ainda o que aconteceu há poucos minutos, quando o senador Álvaro Dias deu uma prova de patetismo, sugerindo que as prospecções no pré-sal sejam suspensas por conta da espionagem americana... Ele sabe algo de política internacional?

O cidadão médio, e infelizmente inclui quem faz, executa e defende as leis, não sabe muito mais coisas realmente úteis, do que quem morreu em 1900. Não falo de fofocas de subcelebridades, de capítulos de novelas falsamente engajadas, tampouco novos meios de burlar a receita federal; tudo isso é da idade média. Falo de conhecimentos técnicos, científicos e, se for o caso, verdadeiramente teológicos, algo que vai muito além de memorizar cada parágrafo de um livro que foi retraduzido dezenas de vezes, e que precisa ser lido com muito discernimento. Ainda hoje, tem gente que pensa que o sol gira em torno da terra, mesmo com diploma universitário. Como era no século XIX.

Quase todo mundo sabe lidar com um celular, mas quase ninguém faz idéia de como sua conversa vai pra lá e a do outro vem pra cá. Nem se importam, mas deveriam. Os cérebros atrofiados pela comodidade e pelo uso restrito de suas faculdades, fazem falta ao bem comum. Quem se acostuma a investigar um pouco de vez em quando, só um pouco mesmo, tem uma percepção de realidade muito mais lúcida e cristalina. Pode até errar, mas mesmo no erro presta bons serviços à posteridade. Na realidade, até sabedorias populares estão se perdendo, então o cidadão do século retrasado leva alguma vantagem.

As guerras continuam, por motivos que não ameaçam absolutamente em nada as fronteiras, as segregações continuam na marra e legitimadas pelo rótulo de "tradição nacional", as pessoas continuam com medo das inovações, o desprezo por quem não é do grupo continua arraigado e por aí vai. Tudo típico do século XIX. Não vou me aprofundar no fundamentalismo e na intolerância dogmática, que nada tem de religiosa, é só dogma mesmo. Isso tem explodido desde 1979. "Traficantes de Jesus" expulsando espíritas do morro... Qualquer semelhança com o obscurantismo de séculos passados é mera realidade.

A chegada do Século XX foi desastrosa, tanto quanto se poderia esperar. Ele só existe mesmo desde 1995, praticamente, foi espremido pelo antecessor, que durou quase dois séculos. Como uma criança que demora muito a nascer, e nasce em meio a violências diversas, ele tem esquizofrenia grave. Não bastasse a saúde debilitada e a personalidade muito agressiva, ele não sabe quem é, o que faz aqui e tem horror às pessoas que vivem neste tempo, tanto que as liquida sem dó.

O facto de o século ter finalmente virado, não significa grandes cousas, porque a influência do anterior persiste pelas primeiras décadas. Ainda estamos nelas. A mentalidade fechada, o raciocínio focado nas satisfações animais, a rejeição de idéias que lhe são desconfortáveis e o apego agressivo ao que se acredita possuir, seja um conceito, uma coisa ou mesmo uma pessoa. Isso não é exclusivo de uma ideologia, é uma obsessão quase "religiosa" de todas elas, porque todas empunham bandeiras e não arredam pé de um milímetro sequer.

Preciso dizer que ditaduras sangrentas ainda existem e que ainda encontram defensores, que não dão a mínima para a população oprimida, desde que sustentem suas ideologias ou o os conceitos que lhes são anestésicos? Não, não preciso. E ai de quem disser que são regimes nocivos, viram inimigos mortais de seus defensores, ainda que tenham acabado de salvar-lhes as vidas.

Ainda hoje as pessoas confiam cegamente nas fontes com que simpatizam, bastando que continuem a dizer o que lhes anestesia. Ainda hoje as pessoas interpretam ao pé da letra tudo o que lêem, isso quando lêem, em vez de simplesmente repetir como um papagaio o que ouviram falar. Ainda hoje as pessoas vêem com desconfiança quem simplesmente tem um sotaque diferente, não raro isso é motivo para agressões, como na época das cruzadas.

As pessoas não compram algo pela sua utilidade, ou pela sensação de afeto que suscitam. Quase sempre, compram para parecerem o que não são, como os penetras de festas palacianas do século XIX. Quase ninguém compra carro colorido, por exemplo, porque o outro pode não querer comprar, na hora da revenda. Assim, o outro também evita comprar o que gosta, porque o outro outro pode não gostar e se recusar a comprar, já que também visa agradar o outro outro outro e assim por diante. Ou seja, ainda hoje sobrevivemos de aparências, nos esquecendo de viver nossas próprias vidas. E quem não vive a própria vida, vocês sabem, se mete na alheia ainda que não dê o mínimo por ela.

Bem, queridos leitores, eu poderia escrever páginas e mais páginas a respeito, mas este resumo dá bem o recado do que eu quero dizer. Não se iludam com a evolução técnica e científica, que resultou mais em quinquilharias supérfulas do que realmente em soluções reais. Este século ainda é o XX, e rogo que ele dure pouco, ele e sua mentalidade perniciosa. Espero de coração, que não chegue aos anos sessenta.