24/02/2021

O risco é diferente para quem vive de vender

 


            Não pense que é má vontade do Seu Pedro da esquina, tampouco que aquele teramercado multinacional do tamanho de uma cidade está mancomunado com o governo illuminati dos alienígenas atlantes do Alasca austral para prejudicar os vendedores de paçoquinha que trabalham nos semáforos. Existe um fator, de inúmeros, que as pessoas ignoram quando descem a lenha em um negócio, que é o risco. Sim, é verdade que a vendinha do Seu Pedro poderia ter artigos sofisticados e recém-lançados no mercado internacional, afinal o comércio electrônico facilitou deveras o acesso de virtualmente qualquer um a qualquer coisa. Comprar poucas unidades de cada coisas e receber tudo em um só pacote é o fino da comodidade, mas sempre para o consumidor final, para revenda as coisas são mais complicadas, apesar da facilidade tentadora de ter coisa fina no armazém. Em tese, mas pura e simplesmente em tese isso seria possível, na vida real a vaca não mastiga de boca fechada. Mesmo que ela pudesse provavelmente não o faria, não tem necessidade e nem genética para fazer isso.

 

            Para um cidadão comum, que deseja apenas algo para uso pessoal pode se dar o luxo de comprar algo que jamais dará outro retorno que não seja emocional, como um besouro roxo de borracha de algum anime obscuro feito em pequeníssima escala, praticamente tudo é viável. O problema vem quando tu precisas obter retorno disso. Mesmo que seja um personagem que é um mestre do último grau da mais alta tradição de guerreiros mágicos da trama mais bem bolada do mundo, existe o risco de a demanda não ser suficiente para justificar a compra e o producto ficar meses, talvez anos parado e empoeirando no seu estoque. E se o recurso investido naquela compra for necessário nesse meio tempo? Vai fazer o quê? Dar desconto? Anunciar? Uma promoção de pague quatro e leve cinco? E quem vai querer ter cinco bonequinhos de um mestre besouro roxo? O seu público é realmente interessado a esse ponto no que tu compraste? Já sentiram o cheiro de azoto do prejuízo? Uma tentativa desesperada de revenda pode custar mais caro do que o valor eventualmente recebido do comprador… se houver um...

 

            Agora voltemos à venda do seu Pedro. Para repor seu estoque ele precisa recorrer aos atacadistas mais próximos, e dentre eles escolher os que oferecem as melhores condições. Há productos que têm muita saída, mas oferecem pouca margem de lucro, enquanto outros saem menos e compensam permitindo cobrar alguns reais a mais do que se pagou ao fornecedor, simplesmente porque o consumidor está disposto a pagar por isso. O real a mais que ele pode cobrar pelo refrigerante compensa os centavos a menos que fazem a alegria do freguês que leva o leite das crianças. É assim que Seu Pedro mantém o equilíbrio frágil entre custo e retorno. O dinheiro que entra não é só dele, a maior parte fica com fornecedores, prestadores de serviço e o governo. Se ele consegue ficar com um terço do faturamento bruto, está cobrando caro pelo que revende. Daí o motivo de ovos de páscoa custarem tanto mais do que uma barra, não é só porque dão mais trabalho para fabricar. Eles pagam o que as balinhas tão populares deixam a desejar.

 

            Mas se certos productos dão tanto retorno a mais, por que ele simplesmente não vende só deles e esquece os que dão muito trabalho e pouco lucro? É porque esses baratinhos são os que chamam e até fidelizam o freguês, é por eles que as pessoas entram e saem da vendinha o dia inteiro. Ninguém vai comprar salmão defumado uma ou duas vezes ao dia, mas qualquer saída pode ser motivo para pegar um saquinho de salgadinhos. E enquanto escolhe o salgadinho, o freguês vê outras opções ao seu alcance, fica sabendo de algumas novidades e pode voltar depois para comprar aquele acepipe de maior valor agregado, e que vai pagar melhor pela hora de trabalho do Seu Pedro. É um expediente de que ele pode lançar mão porque sabe que ambos têm boa saída e justificam investir seus escassos recursos, porque darão retorno, o que ele não pode fazer é ousar demais sem a perspectiva de obter o retorno necessário em tempo hábil.

 

            Vamos exemplificar com três casos na mesma situação. Aquele hipermercado badalado tem centenas de milhares de itens à disposição a preços atraentes. Como consegue? Por ser uma rede gigantesca, os lotes comprados podem ser desmembrados em quantidades menores para cada loja, que sozinha precisaria comprar de um atacadista que também é um revendedor, às vezes de distribuidores maiores que revendem da fábrica. Uma rede multinacional compra directo do fabricante, pagando não só o preço da fonte, como recolhendo os impostos uma vez só e distribuindo essa vantagem entre seus postos de venda, que assim podem ter estoques comparativamente discretos e vender a preços mais baixos do que muitos pequenos atacadistas, tanto que alguns mercadinhos pequenos recorrem a essas lojas para poderem oferecer algo mais sofisticado à sua clientela local de vez em quando, sem correr os riscos de uma compra grande para a qual sequer teria fundos. Já tivemos uma vendinha no início dos anos 1980 e fazíamos isso, mas é conversa para outro texto em tempo oportuno. Para essas grandes redes não é pesado bancar uma grande campanha publicitária em grandes veículos de comunicação, bem como pagar cachês a artistas famosos em locações distantes.

 

            Por outro lado, o comando pouco pessoal e centralizado de uma rede multinacional dificulta a conversa com pequenos artífices e indústrias tradicionais locais, inclusive porque eles não têm condições de fornecer a quantidade necessária a um cliente de tamanho porte, também por isso algumas lojas dessas redes têm artigos que as outras não têm. Lembram-se daqueles suspiros duros em cores pastéis, os doces de abóbora e batata-doce em forma de coração, as bananadas com brinquedinhos espetados nelas e outros que fazem parte da infância de tanta gente? Dê uma olhada no tipo de embalagem que usam, geralmente uma caixa estampada de forma extremamente simples e rudimentar, e saberão que é uma indústria de pequeno porte, talvez uma empresa familiar. Ainda são fáceis de encontrar em pequenos comércios na periferia e no interior, mas fornecer dez mil caixas em uma semana está totalmente fora de questão. Mas geralmente é coisa que a clientela deles não procura, oferecer artigos normalmente caros a preços convidativos é o mote e diferencial deles, também por isso podem se arriscar mais. Se uma loja dessas redes vende mil itens a menos em um mês, bem, é só uma baixa de demanda em um mês específico. O regente vê as planilhas, confere o estoque, faz uma promoção e decide depois se volta ou não a comprar aquele producto.

 

            O próximo caso é o de supermercados locais, que dificilmente têm mais de cinco lojas e todas elas em bairros mais afastados. Essas empresas dificilmente falam com os grandes fabricantes, que têm os productos de maior saída e lucro agregado, que normalmente já trazem consigo material de marketing e se vendem sozinhos, elas recorrem para isso aos grandes atacadistas e para o restante aos fabricantes locais. Com isso ainda precisam pagar um mesmo imposto duas ou três vezes, o que obriga a reduzir a margem de lucro e ainda assim vender um pouco mais caro, mas como alguns fornecedores estão por perto, a logística ajuda a reduzir custos e prazos, o que faz com que productos da cultura tradicional local estejam presentes em suas gôndolas, dividindo espaço com algumas novidades do mercado que ainda estão longe das prateleiras das vendinhas de esquina. Não que a administração seja rente à clientela, mas é mais pessoal e geralmente os fregueses mais assíduos conhecem muitos funcionários pelo primeiro nome, tornando a comunicação mais ágil e directa com a gerência.

 

            Como o orçamento é bem mais apertado, a publicidade e as promoções são muito dirigidas, se utilizando de carros de som e gráficas locais; muito de vez em quando um anúncio no rádio, raramente usam a televisão e ainda assim só em horários mais baratos. Com um estoque relativamente grande e diversificado, podem se dar o luxo de arriscar mais, testar de vez em quando productos que normalmente não estão na despensa de sua clientela, claro que em pequenas quantidades e a preços menos convidativos. Mas o fator novidade e exclusividade, já que supermercados menores quase nunca têm condições de fazer isso, age como chamariz para a clientela, que mesmo reticente na compra daquela coisa exótica acaba levando outros productos. É uma clientela emergente, por assim dizer, mas que ainda faz as contas antes de colocar alguma coisa no carrinho, então a persuasão do vendedor precisa ser mais forte e directa. Aqui a venda de mil unidades a menos por mês já tem algum drama, pois compromete mais o faturamento mais magro, mas não é o fim do mundo. Um eventual prejuízo dessa monta pode ser absorvido e raramente demanda punições mais severas à gerência de cada loja.

 

            Por último aquela pequena venda de bairro, que normalmente vive de fregueses que moram a no máximo três quadras de distância, e tem no carisma e na pessoalidade do comerciante o seu único recurso de marketing. Por economia, mas muitas vezes também por tradição, os productos são embrulhados com papel grosso ou até mesmo com jornal velho, e isso acaba sendo um diferencial que denota proximidade com a pessoa do comprador. É comum o freguês se sentir mais em casa lá do que em sua própria casa, e ir comprar qualquer coisinha só para bater papo com o comerciante por uma hora ou mais. Não é raro ele morar no segundo pavimento ou, no caso da maioria, nos fundos de seu comércio de poucos metros quadrados, estacionamento, quando há, é a garagem de seu próprio veículo de trabalho. Todo o estoque muitas vezes é só aquilo que está exposto à venda, junto com umas poucas caixas distribuídas pelo estabelecimento para reposição, até a hora de fazer novas compras. E por falar nisso, os atacadistas mais próximos são seus principais fornecedores, quando não os únicos. Vender bolos e biscoitos feitos em sua própria cozinha também é comum. Como os intermediários são muitos, a taxação real também é aplicada mais vezes e os custos por unidade são muito mais altos. Em contrapartida ele oferece além do aconchego inexistente em grandes redes, productos de pequenos fabricantes que muitas vezes também são pequenos negócios familiares nas imediações da cidade, ou coisas que saíram de moda há muito tempo e os CEOs de multinacionais, isolados em seus edifícios envidraçados, jamais arriscariam para não arranhar a imagem de suas marcas; imagine só, um Fusquinha de plástico soprado cor-de-rosa ao lado de um carro monstro superagressivo com controle de mil funções e câmera na frente! Pois aqueles brinquedos de plástico soprado ainda podem ser encontrados em muitas dessas vendinhas.

 

            Nesse tipo de estabelecimento raramente há uma novidade, praticamente só productos sazonais como em época de páscoa, festas juninas e natal, e mesmo assim só das marcas mais vendáveis e em pequenas quantidades, pois até o espaço físico é escasso. Como são caros em relação aos preços dos supermercados e hipermercados, o freguês compra porque já está lá mesmo e porque não quer se deslocar e enfrentar o trânsito, e nem quer esperar pela entrega. Por todas essas limitações, o risco que esses estabelecimentos podem correr é mínimo. Sim, é possível pegar um empréstimo para ter capital de giro e arriscar, mas isso exige um planejamento que nem todos têm, simplesmente porque a maioria deles só quer manter seu ganha-pão e criar suas famílias. Ambições expansionistas não interessam a todo mundo, ao contrário do que universitários bitolados pensam. Se uma vendinha comercializar mil unidades a menos em um mês, ela pode simplesmente não abrir mais as portas. Colocar uma quantidade razoável de productos diferentes não só toma o lugar da mercadoria que a freguesia sabe que vai encontrar lá, como pode consumir todo o recurso de que o dono dispõe, deixando-o refém de um sucesso incerto que, se vier, pode demorar muito mais do que o salutar para seu negócio.

 

            Aquela tradicional vendinha de esquina é um comércio de nicho, muitas vezes com toda a equipe se resumindo a uma só pessoa, que acaba se tornando ponto de encontro de uma freguesia restrita à qual influencia e pela qual é influenciada, a ponto de o inventário ser a cara e praticamente definir quem mora naquelas imediações. Claro que as compras do mês, para encher a despensa, são em comércios grandes que oferecem preço e variedade como atrativo, mas a conveniência e facilidade de acesso transformam a vendinha no salva-vidas para reposições e compras de emergência, e é claro para aquelas coisas que simplesmente não existem mais em grandes centros, como a maria-mole em forma de língua coberta com côco ralado, que veio em uma caixa de cinqüenta unidades com estamparia rudimentar e vai para sua casa enrolada em papel rústico… ou talvez nem chegue lá, tu vais comer enquanto conversa com o seu Pedro, esperando pelo café que está sendo torrado e moído na hora… mil vezes melhor do que qualquer café solúvel do mundo!

 

            É claro que pode haver uma cooperativa ou uma compra conjunta por contracto reconhecido em cartório, permitindo obter e fracionar lotes maiores a preços mais baixos para todos os participantes, mas isso é outra conversa.

15/02/2021

Mais uma utopia estúpida

"Cyberman" from Dr. Who


 De tanto ler e ouvir discursos prolixos de gente intolerante que luta contra a intolerância, resumi em um texto relativamente curto o conteúdo de suas narrativas. As repetições enfadonhas são propositais, mas a quem se deixa envolver pela conversa, tudo parece ser de uma beleza e clareza raras.


            O ser humano é um animal político, por isso deve-se levar a política em conta em todos os âmbitos e nuances de nossas decisões, a fim de não ferir a individualidade pessoal de cada pessoa em si. Assim sendo, posto que todos concordam, devemos aderir a um modo de vida mais racional e sustentável, pondo de lado o velho normal que priorizada o indivíduo em detrimento do coletivo junto à sociedade estratificada e imersa em devaneios individualistas, a fim de realizar as diretrizes para implementação e adaptação ao novo normal. É sabido que a velha mentalidade lutará para permanecer e não seria de outra forma, por isso a nossa luta urge para a vitória a nível de sociedade coletivizada, enquanto não privada em termos de pessoa e propriedade. Trata-se não de proibir a posse, mas de ressignificá-la para uma ampla discussão livre e democrática, que resultará na conclusão da necessidade de maior acesso dos desassistidos aos bens de consumo e serviços. Tudo é muito fácil de ser resolvido, bastando eliminar o egoísmo materialista consumista que vigora e oprime as populações sujeitadas ao sentimentalismo escravagista, pois é aos sentimentos irracionais que apelam os que querem se perpetuar no controle dos destinos do indivíduo e da coletividade. O ser humano vive em busca de prazer, é só a isso que se resume todos os seus esforços e é só isso que interessa ao corpo, portanto é a isso que devemos convergir esforços, sem sentimentalismos estigmatizadores que nos impedem de viver com pleno domínio de nossos corpos e nossos destinos.

 

            Todos de acordo, vamos aos ditames democraticamente discutidos e amplamente aceitos. É necessário que tenhamos um padrão de consumo e um modo de vida mais racionais e sustentáveis, abrindo mão dos conceitos arcaicos e segregatórios de propriedade absoluta e poder absoluto sobre a própria vida enquanto indivíduo participante e afirmativo na sociedade. Começando assim pelos nossos destrutivos hábitos alimentares, que a ciência já comprovou que são insustentáveis, conforme já disseram os nossos cientistas adesistas de nossas idéias democráticas e acessíveis, amplamente discutidas democraticamente em nossos fóruns libertários. O aquecimento global requer medidas afirmativas e urgentes, então deveremos parar imediatamente de produzir e ingerir cadáveres, cuja produção e processamento demandam energias não renováveis, pelo que em pouco tempo nossa atmosfera retomaria os níveis aceitáveis de absorção de carbono, preservando assim as florestas tropicais destruídas pelos pastos, mantendo a produção de oxigênio, detendo e estancando o efeito estufa causado pela atividade consumista.

 

            O egoísmo de quem está contaminado pela mentalidade e lógica de mercado tenderá a resistir, mas será inútil, pois é o novo normal que vem à tona, é a nova verdade, a nova realidade, a nova ordem do novo mundo de uma nova humanidade mais racional, mais prática, mais sustentável e tolerante às mudanças de paradigmas. Seremos racionais, assim os sentimentalismos que perpetuaram o patriarcado opressor não terão âncoras para se fixarem na nova sociedade, se dissolvendo aos poucos com a figura do “homo proprietarius”. Seremos livres, decidiremos o que fazer com nossos corpos uma vez que os ditames de mercado não oprimirão mais os vulneráveis. A racionalidade prevalecerá e a ciência ditará nossos destinos, não havendo mais lugar para a subjetivização arcaica de interpretações acadêmicas comprovadas, porque o amor, a felicidade e o prazer não passam de reações electroquímicas em nossos cérebros, por isso a solução de nossos anseios é muito mais fácil do que nos permite acessar a mentalidade neandertal que não resistirá à eclosão revolucionária do novo normal.

 

            Quem hoje abre mão das comodidades da inteligência artificial, que facilitam nossas vidas e evitam que cometamos erros irreparáveis, tornando tudo mais eficiente e sustentável? Isso se deve ao reprimido e inato desejo humano de se tornar mais racional, deixar as decisões importantes para quem entende do que se trata cada assunto, sem a interferência da mentalidade individualista que arruína as melhores intenções com sentimentalismos arcaicos e castradores. Se você está usando um computador, está usando o resultado de décadas de mentalidade racional aplicada para o propósito de revolucionar a vida na Terra, proporcionando uma existência mais agradável a todos, democratizando a ideologia racional do novo normal para um mundo onde o egoísmo e a devastação ambiental não têm mais lugar. Aderir à causa é aderir à preservação da própria espécie humana, por isso é na racionalidade científica e filosófica que reside a nossa única esperança. Está cientificamente provado que é a racionalidade pura da inteligência artificial, criada e programada por pessoas racionais, que faz as melhores escolhas, traz as melhores soluções e dá as melhores perspectivas para todos, de modo universal, eficiente e sustentável.

 

            Concordamos que é a ciência que deve ditar tudo, com nossos filósofos aclamados mastigando para o vulgo inculto o que os cientistas disserem, isso já foi ampla e democraticamente discutido pela sociedade engajada e politizada, consciente de seus direitos. É tudo fácil, simples e rápido. A desindustrialização dos bens e primeira necessidade é portanto uma urgência! Devemos abrir mão dos prazeres de sabores não naturais para cessar, de uma vez por todas, a irracional destruição dos mananciais e suas matas ciliares, de modo que a biodiversidade seja restaurada. Com essa mentalidade mais solidária, justa e fraterna, torna-se então desnecessária a figura do comércio, pois cada um estará mais sensível às necessidades do próximo, eliminando a figura egoísta e irracional do comerciante, permitindo que sobrem mais recursos para aplicar nas necessidades básicas a que todos têm direito nato. Assim, sabendo que os frutos de seu trabalho serão aplicados com justiça social e ambiental, é justo que se deixe nas mãos de líderes racionais e solidários os recursos oriundos do trabalho, que dará a cada um o estritamente necessário, eliminando-se assim também as doenças resultantes de abusos alimentares. E uma vez que está nos hormônios do prazer o ponto manipulado pelos sabores que nos levam aos abusos, deverá ser proibido qualquer alimento dotado de impressões sensoriais, porque devemos comer para viver e não viver para comer! Sejamos racionais! Sejamos justos! Sejamos solidários! Sejamos sustentáveis! Sejamos a nova humanidade!

 

            Já deixamos a cargo da inteligência artificial a tarefa de dirigir os carros, escolher nossos programas de televisão, nossas séries, nossas músicas, nossos livros virtuais, nossos vídeos livres e até mesmo a escolha de nossos parceiros em aplicativos de namoro! Já vivemos a racionalidade e desfrutamos de seus benefícios, só que não nos damos conta disso! Por que? Porque sempre somos atormentados pelo pensamento de desligar nossos sonhos perfeitos para sair e trabalhar, porque precisamos pagar para ter prazer, para viver, até mesmo para fazer pagamentos! Isso é injusto, irracional, ineficiente e insustentável! Aqui está provado que o uso da racionalidade delegada pela ciência, a realidade virtual, é um dos alicerces para a plena e perfeita felicidade! Sem esforços, sem culpas, sem preocupações, sem crimes, sem responsabilidades, sem compromissos, tão somente prazeres e felicidade com descargas hormonais não permitidas pelo normal arcaico. Se não há esforço, o consumo de energia é mínimo, e por isso a chance de sobrevivência é maximizada.

 

            Rações isentas de flavores, sem assim consumir os recursos naturais para dar sabor e cheiro, consistem no início de uma nova era, em que aos poucos nos desacostumaremos da sedução do mercado e da propriedade individual, sendo geridos por líderes racionais e eficientes que promoverão a saúde preventiva gratuita e universal, disseminando novas diretrizes sustentáveis para vigorar a nova sociedade racional que já está em andamento. Os recalcitrantes discutirão se essa nova realidade é mesmo real? Mas o que é real? A ciência já provou que não existe uma realidade, é tudo uma interpretação resultante de processos bioquímicos de nossos cérebros, por isso uma utopia humana é possível sim! É necessária sim! É obrigatória sim! Não é de hoje que as pessoas se refugiam em jogos de realidade virtual para viverem como gostariam de viver, sem a interferência deste mundo injusto e perverso, vivendo sem ditames e sem regras. É esse o nosso objetivo! É essa a nossa luta! É essa a guerra que travamos todos os dias contra a mentalidade arcaica que nos prende a todos os males artificiais que não existem na natureza, mas são impostos para que trabalhemos duro em troca de doses mínimas dos atenuantes.

 

            Por isso devemos ser racionais! Seguir e obedecer a líderes racionais! Deixar de lado os anseios construídos de uma vida individual irracional, ineficiente e insustentável. Uma vida coletiva com experiências baseadas em realidade virtual, sem consumos e sem cobiças, com a pureza da humanidade primitiva reestabelecida em bases racionais e sólidas. Quem não gostaria de viver tudo o que quer viver sem os riscos do mundo perigoso que habitamos? É essa a nova era de um novo mundo, que sucederá o novo normal para uma humanidade livre de sentimentalismos castradores arcaicos e perversos. A vida racional de trabalho mínimo para prazeres máximos, sem perdas, sem atravessadores, sem custos, com a subsistência cem por cento garantida por líderes científicos racionais. É só um passo para a fase seguinte, em que prescindiremos até mesmo do mundo externo, assim tornando nulo o nosso impacto ambiental. Viveremos não conectados, mas em simbiose com máquinas geridas por realidade virtual perfeita, proporcionada por nossos líderes científicos racionais e repletos de boas intenções. Então o velho mundo não será sequer história, porque será totalmente desnecessário, então seus arquivos poderão ser simplesmente apagados, poupando a nova e racional humanidade de traumas e frustrações decorrentes do contato com as agressões da velha sociedade, que é totalmente formada por indivíduos perversos e sem salvação.

 

            Viveremos totalmente no mundo virtual, trabalhando sem cansaço para produzir as riquezas de nossa nova coletividade, com tempo infinito para desfrutar de prazeres em vários universos virtuais paralelos, tento doas as boas experiências possíveis a custo zero, em uma sociedade utópica e fraterna, justa e sustentável! Sem custos, sem frustrações, sem castrações, sem violência, sem preocupações, sem culpas, sem compromissos, sem crimes, sem devastação, sem propriedades, sem limites! Um mundo onde a racionalidade científica ditará tudo e definirá tudo, sem que você precise se preocupar em tomar suas próprias decisões. Basta imaginar, na limitação irracional em que ainda estamos, um mondo onde tudo seja formado por bits e algoritmos, no qual se pode voar sem asas, viver debaixo d’água ou mesmo andar para apreciar a paisagem de uma natureza perfeita e sustentável. Tudo perfeito, universal e gratuito, até o dia em que alguém tropeçará em uma raiz, que na verdade é o fluxo de dados do suporte de vida, e todas as máquinas que mantinham nossos corpos funcionando são irreversivelmente desligadas.

06/02/2021

Voltem para seus blogs!

 

"Você violou os termos!" "Hein? Tá falando comigo?"
(Str Trek Tomorrow Is Yesterday 1967 ep 19)

            O desencanto com as redes sociais começou quando as pessoas se deram conta de que nem todos são sociais, na verdade uma boa parcela é bem antissocial. O problema aqui veio quando essa índole deixou de ser um mecanismo de defesa para se tornar uma bandeira, de início com "Não estou nem aí para a sua opinião" saindo das respostas particulares a intrometidos, para ser jogado aos quatro ventos em postagens fora de contexto e dirigidas a qualquer um. Já não se tratava mais de gente que só queria passear pelos tópicos e ser deixada em paz, agora eram grupos de malas sem alça enchendo deliberadamente a paciência de todo mundo. Até aqui bastava bloquear o mala sem alça e tocar a vida.

            Juntaram-se a eles os grupos de "novo normal" que festejaram o advento de quadrinhos e animações alternativas repletos de politicamente correcto, engajamentos, inclusões, representatividade, discussões amplas e hai hai hai mil vai pra fora do Brasil! Deveria ser apenas mais um gênero nascente de entretenimento e assim seria, se não fosse a tendência humana em transformar tudo de uma nova religião, ainda que uma religião cética. Porque não basta gostar, é preciso atacar a opção do outro, esfregar na cara do outro seus próprios gostos, tentar obrigá-lo a compartilhar desse re-les en-tre-te-ni-men-to e, por fim, usar de sua paixão pela liberdade de expressão para tentar proibir todo mundo de usufruir dos antigos. Muito coerente mesmo... Depois de algum tempo, como a maioria absoluta dessas publicações e desses programas é absolutamente sem graça, desinteressante e aparentemente feito para só o seu criador entender, essa imensa maioria sai de circulação... então os militantes mimizentos vêm às redes sociais xingando e ameaçando todo mundo porque ninguém deixou de ver o que gosta para prestigiar seus entretenimentos sem graça. Agora chamam de "evolução" a retirada de "Tom & Jerry" do catálogo de uma empresa de demanda de vídeos, para mim uma tentativa de apagar um pedaço da história, porque o contexto das animações clássicas era outro e, assim como há quem diga que ninguém vira psicopata por jogar RPG e vídeo game, ninguém virou serial killer por causa dos desenhos antigos.

            Não sendo isso o bastante, essa gente que se leva à sério mais do que a própria seriedade começou a usar de seu enviezamento político, religioso, ideológico, psicopático para acusar os que não compartilham de seus gostos pessoais de serem inimigos dos oprimidos. Repentinamente, enquanto eles mesmos desejavam em público mortes lentas e sofridas para seus desafetos, pessoas que simplesmente respondiam com "Vai se lascar, corno" passaram a ver suas publicações censuradas, tendo como respostas dos censores discursos prontos que não explicam absolutamente nada. O tal algoritmo já "confundiu" uma imagem de Dom Pedro II com uma campanha da apologia às armas de fogo... e apagou a imagem do perfil de quem a postou... e ficou por isso mesmo. Notaram o sistema de pesos e medidas diversos? Incentivar a violência e a depredação tornou-se um direito de quem compartilha da ideologia ou religião (que no fundo são a mesmíssima porcaria) do censor de rede social, mas basta um do outro grupo escrever "foda-se" para receber bloqueio por uma semana ou mais, bastando uma besta cúbica denunciar como ofensivo. Eu já denunciei certa feita alguém incentivando à depredação, o que recebi DIAS DEPOIS foi uma resposta de "marcaremos como algo que você não quer ver"... Ou seja, não aparece mais para mim aquele tipo de postagem daquelas pessoas específicas, mas elas continuam lá.

            Se houver o discurso certo, é permitido ao usuário escrever "vocês sabem como os franceses protestam, não sabem?" para incentivar a destruição do patrimônio, basta haver o discurso certo com uma justificativa condizente com o pensamento do censor, como "eles se importam mais com vitrines do que com pessoas", mesmo sem conhecer as pessoas que estão acusando de desumanidade, mas o simples facto de ser do outro lado já activa o preconceito dos que lutam contra os preconceitos... dos outros. Nesse mesmo pacote de hipocrisias às claras, perfis de ditaduras e ditadores são mantidos intactos, assim como os de seus financiados, sempre com discursos pseudointelectuais idiotas e vagos como resposta a quem indague a respeito. Foi preciso que uma a Taiwan se reportasse para que UM perfil do PCC fosse posto em quarentena, tão somente em quarentena. Foi preciso que um Estado intervisse para que pelo menos isso acontecesse. O conteúdo? Justificativas à perseguição e prisão de minorias étnicas na China continental. As denúncias de pessoas comuns não surtiram efeito, mas se essas pessoas comuns se atrevem a justificar um revide como retaliação de guerra, pode ter sua conta cancelada por "discurso de ódio". Uma ditadura pode fazer isso, em redes sociais que são notória, aberta e assumidamente proibidas em seus territórios.

            Não me refiro a uma rede em específico, porque praticamente TODAS estão agindo assim, como candidatos ao grêmio estudantil, prometendo justiça e liberdade, mas tornando-se tiranos inescrupulosos assim que chegam ao poder, disseminando os dedos em riste, censurando opiniões divergentes das suas, editando notícias para só o que lhes interessa ser lido pelos asseclas e retaliando sem hesitação, sempre se fazendo de vítimas de suas vítimas. Sim, eu me lembro, cada grêmio se tornava uma nano ditadura sustentada pelo erário. E cada rede social está se tornando uma também. Bastou aparecer o momento certo e todas estão se mostrando como realmente são. Canais inteiros tirados do ar por divulgarem suas próprias opiniões, que não batem com as dos censores de redes... mas os canaizinhos das ditaduras de estimação estão lá, bem como de "jornalistas" levados para conhecer e falar bem delas. E eu já cansei de mostrar desmentidos, mas meus... "amigos"... ignoram solenemente, continuando a mostrar como o ditador é bonzinho e o democrático é perverso... só vêem o que suas ideolopradas permitem e ignoram o resto, como em uma igreja fundamentalista.

            Não foi à toa que Elon Musk apagou as contas da Tesla, exemplo seguido pela Chevrolet, e em ambos os casos a saída não surtiu nenhum efeito negativo, pelo contrário, o pessoal que estava se descabelando com comentaristas nonsenses, inconvenientes e até mesmo militantes apontando seus dedos acusatórios, agora estão lidando com o estresse normal das relações públicas com clientes e autarquias, dando retorno e justificando seus vencimentos. A divulgação das marcas que estão saindo voltou a ser de total controle dessas marcas, em seus sites, seguindo seus próprios critérios e atingindo sua clientela. Claro que eu lamento de não ter mais um canal de conversa com eles, mas compreendo plenamente, é dor de cabeça demais para retorno de menos. Se por telephone já é difícil controlar os ímpetos de um reclamante indignado, imagine controlar os ímpetos pubianos de gente que simplesmente quer atrapalhar, e de gente que pratica o "ódio do bem" que citei, em milhares de comentários e denúncias orquestrados em turma! Para empresas, não existe conta grátis... para ninguém é na verdade, mas são eles que tiram directametne de seus bolsos.

            Então aos que estão fartos disso, voltem aos seus sites, sejam páginas grandes ou meros blogs como este. No que é seu a censura é muito mais difícil e suas publicações só vão atingir o seu público, vocês sentirão a diferença logo nos primeiros dias. Poder escrever alguma bobagem qualquer, só para descontrair, sem ver dedos apontando para a sua testa ainda é possível, dentro do seu espaço pessoal, fora das redes. Decerto que a divulgação em uma rede é bem mais eficiente, mas essa é uma das armas de sedução dos censores de internet, que assim te obrigam a moderar sem necessidade real até que o que sair de seu teclado já não terá nada mais a ver com o que tu pensas. Não digo para saírem de todo dessas  redes porque isso seria dar espaço aos idiotas referenciados, eles simplesmente não podem se sentir à vontade para soltarem tudo o que querem e contra quem querem, porque qualquer um de nós pode ser alvo desse desvairo. Além do mais, em compartilhamento reservado as redes AINDA são uma ferramenta eficaz para divulgação de suas páginas independentes, bastando que o compartilhamento seja feito apenas a quem realmente interessa. Abandonar as redes sociais AINDA é uma utopia, mas pelo bem de sua sanidade mental, voltem para seus blogs!