31/05/2013

Experimenta criar!


Texto baseado em factos reais. O romanceamento se dá para permitir melhor digestão de um tema indigesto, cujo desenrolar não é divulgado para não prejudicar a carreira política de parte dos envolvidos. Já são pelo menos três casos abafados de famílias que são deixadas em paz por conselheiros politiqueiros, após reiterarem a ameaça e darem sinais claros de que vão cumprir com ela.

Pai e mãe indignados são chamados a um conselho tutelar qualquer, para responderem por agressões traumáticas e humilhantes, feitas a uma brasileirinha em situação de menor idade... Tomam duas horas de chá de cadeira, sem açúcar, quando um vereador sai sorridente, seguido do conselheiro...

- Pode deixar, doutor conselheiro, você está praticamente certo para a secretaria, assim que nós formos eleitos.

- Eu agradeço muito, ilustre doutor vereador! É o reconhecimento pelos relevantes serviços prestados à sociedade por este doutor. Ah, se me dá licença, tenho outra violação dos direitos das crianças e dos adolescentes para coibir.

Chama-os para a sala. Faz caras e poses, então começa a falar...

- Os senhores estão sendo chamados aqui, junto a este conselho tutelar, para prestarem esclarecimentos ao nível de poder familiar, enquanto denunciados pela agressão a uma brasileirinha em situação de menor idade...

Eles o olham com caras de paisagem, enquanto ele enrola a prolixia. Já conheceram muitos conselheiros com os pés no chão, mas estes estão perdendo espaço para os que usam o conselho como trampolim político. Ele retoriza, transforma broncas reservadas em assédio moral, tapas para conter histeria em tortura física, até terem negado permissão para um baile em um posto de gasolina de um deputado, que terminou em tiroteio e processo por tráfico, é relatado como tortura psicológica...

- E como é que você quer que a gente faça?

- Oras, é óbvio! Uma discussão aberta e democrática com a brasileirinha em situação de menor idade resolve tudo!

- Não resolveu, retruca a mãe.

- É porque vocês não foram carinhosos e permissivos o suficiente. Está escrito aqui no meu manual, conversinha mansa sempre funciona!

- Ô moço, interrompe o pai, sem querer faltar com o respeito que o senhor não fez por merecer, as conversas até que funcionam bem, quando não aparece um bocó envenenando a cabeça da nossa filha, falando que criança tem direito de usar o corpo como quiser! Leia-se, dar pra desconhecido em boca de fumo.

- Não é assim, berra o conselheiro, vocês estão distorcendo a verdade! A verdade é que o eca veio para coibir abusos e proteger a criança e o adolescente das crueldades...

- Então onde vocês estavam, quando nossa vizinha foi abusada pelo deputado Pastor Tinho? Ele tá livre até hoje!

O homem engole seco. Mas fica pálido mesmo quando a mãe da menina dispara a falar...

- Todos os dias os jornais dão notícia de traficante torturando de verdade e matando crianças! Onde é que vocês estão? E aqueles valentões que só a polícia enfrenta, e abusam dos próprios filhos? Heim?

- Isso é um absurdo! Berra indignado. Vocês estão tentando me pôr contra a parede! Estão tentando inverter uma situação imperdoável! Estão querendo colocar em mim a culpa de suas agressões covardes e perversas! Eu vou mandar prender vocês! Vou colocar os dois na cadeia! Eu vou tirar a brasileirinha em situação de menor idade definitivamente da guarda de vocês!

- Então tira, desafia a mãe.

- Vou poupar o tempo do bocó de mula, e trazer a Pepita eu mesmo.

O pai sai e chama a menina. Ela chega limpa e bem arrumada, como não estava quando foi tirada a tapas de uma competição de som automotivo, no meio da rua, e ele anuncia...

- Esse aí é o seu pai agora. Vai com ele.

O conselheiro e a menina ficam sem saber o que fazer, sem reação e olhando um para o outro, com um asco mútuo. Ele se vira para os pais e blefa...

- Não me provoquem! Eu vou tirar o poder familiar de vocês! Olha que eu...

- Então tira! Se eu não puder corrigir a filha que eu trouxe no útero por nove meses, com duas situações em que quase tive aborto espontâneo!

- Fora as vezes em que eu passei dias sem dormir direito, levando ela de hospital em hospital, pra tratar da asma! O governo nem porcaria de conselhozinho vagabundo nenhum, ressarciu os gastos de tratamentos que o governo não quis cobrir!

- Se eu não puder corrigir, então lavo minhas mãos. Pode colocar ela pra adoção!

A menina, que mal completou treze anos, fica trêmula. Ela sabe, por relatos, do que acontece naqueles depósitos de carne humana que o governo finge serem centros de reabilitação de menores infratores, para onde provavelmente iria após se desentender com os funcionários de um orfanato. Já o conselheiro, quase se borrando com a iminência de um escândalo que inviabilize sua carreira política, em parte a ser patrocinada por valentões que agridem impunemente seus filhos, tenta argumentar, remediar ter comparado os dois a bandidos torturadores...

- Sem conversa! Vocês falam demais e não saem de suas salinhas com ar condicionado pra ver se o que falam funciona. Eu dei à luz uma menina, não uma bandidinha que ameaça a mãe com uma faca de mesa!

Eles se viram para irem embora, e deixarem para chorar em casa, quando ouvem o grito desesperado da menina. Ela se agarra à mãe e chora copiosamente, soluçando mais do que falando, mas jurando que vai tentar virar gente. Olham para o sujeito que tentou intimidá-los, mas sabe que não segura o rojão de criar uma menina com actividade intelectual muito acima da média, não bastasse a estética idem, e avisam para se manter longe de sua menina. Que enquanto não for homem para encarar pais perversos de verdade, inclusive caciques políticos, que pie baixinho às suas presenças.

Os cinco anos seguintes, já em outro endereço, longe daqueles delinquentes, em outra escola e recebendo reforço paralelo em casa, porque os livros do governo são pura lavagem cerebral, a menina ingressa para a faculdade. Forma-se pediatra. Conclui o doutorado em psiquiatria infantil, linda, genial, e com os pais no salão, certos do dever cumprido.

Se deu dor de cabeça? Decerto que sim! Quem cria filhos não pode esperar ser diferente. Quem não cria, espera que tudo seja um mar de rosas.

Aos que se revoltaram com o texto, voltem ao primeiro parágrafo e leiam com cuidado.

22/05/2013

Três reais? Mais barato andar de Opala.


Está ficando caro andar de ônibus. Não só porque passou de 2,70 para 3,00, de ontem para hoje. Está caro porque aumentou sem uma melhora sequer. Pior, aumentou com as condições piorando.

Quem conhece um pouco de macânica, pelos ruídos percebe que a manutenção desses ônibus é bem mais precária do que alardeiam as concessionárias. Freios funcionando com metal contra metal, são rotina.  Botoeiras que não funcionam e te fazem perder o ponto, mais ainda. Imundice já nem é mais notada, já é sinônimo de transporte público goianiense.

Hoje tive a terceira camisa danificada em um desses paus de arara, que o prefeitinho jura que é transporte de primeiro mundo, mas ele escomungava antes de se sentar naquela cadeira.

A alegação é a de sempre, o aumento estava previsto no contracto, decorrende da licitação que correu na surdina e contemplou os malandros que já espoliavam a população há décadas, cujo partido do prefeito jurava de pés juntos que expulsaria da cidade, algum dia.

Há alguns anos, empresas de fora se candidataram a tomar o lugar delas, quando reclamaram que estavam tendo prejuízos, e que só se mantinham santamente no árduo labor de bem servir à população, porque estavam contractualmente obrigados a fazê-lo até 2006.

Foi as de fora se manifestarem, e até garantirem que os itinerários curtos garantiriam uma boa redução no preço da passagem, que eles se calaram. Ninguém respondeu mais às perguntas da imprensa.

Quando anunciaram o fim da figura do cobrador, ou trocador em algumas regiões, fizeram uma campanha tosca, que sugeria que eles passariam a ser orientadores nos pontos de ônibus. Mal deu um mês eles sumiram. A partir daí os acidents graves se multiplicaram, com o motorista sozinho no ônibus, sem o colega que avisasse sobre o passageiro que não terminara de descer, geralmente um idoso debilitado.

Com freqüência, colocarm motoristas em rotas que ele desconhecem, mandando que se virem, forçando-os a contar com a ajuda dos passageiros mais antigos, que nem sempre estão à disposição. Há um GPS ridículo no veículo, mas que só diz qual é o próximo ponto, nunca como chegar lá. Só serve para facilitar punições.

E por falar em punições, é o motorista que paga o pato, quando há um acidente. E por falar em motorista, eu não caí na encenação do sindicatozinho pelego, que fecilitou a deflagração da greve para convencer a população que pagar caro, é melhor do que andar à pé.

Como de praxe, a rmtc fez vistas grossas à especulação dos vendedores de bilhetes, que se negaram a vender mesmo quando eram vistos com os ditos nas mãos. Como de praxe, os portadores dos cartões viram o dinheiro depositado nele, valer menos, porque nele consta o valor comprado, não o número de viagens compradas.

Fazendo as contas, sem incluir factores imensuráveis como respeito, dignidade, segurança, mas só dinheiro, um Opala guiado com boas técnicas de pilotagem pode sair mais em conta, especialmente se houver caroneiros para ratear os custos. Ainda mais que eu saio de manhã muito cedo, quase sem trânsito. Mas o mesmo prefeito que xingava os concessionários e hoje os adula, é o mesmo que adulava os funcionários públicos e hoje os sufoca com vencimentos irrisórios e péssimas condições de trabalho. Por enquanto, o carro fica no mundo dos planos por executar.

01/05/2013

Os Dragões de Titânia - A queda do César - Resenha


Renato Rodrigues é meu amigo pessoal, sujeito que prezo muito e a quem dou liberdade para certas brincadeiras, que ele faz se cerimônia... Inclusive com minha idade. Com tudo isso, eu me vejo no direito de fazer críticas constructivas, de apontar falhas e dizer que não gostei de algo. Bem, caríssimi, não é o caso. Novamente Don Renatonski acertou em cheio, mesmo nas partes em que eu gostaria de puxar sua orelha até virar cachecol. Por que ele fez aquilo com aquela menina???

Vamos ao livro e ao que vocês aprenderão com ele, se forem bons leitores. Mas antes, um aviso a muitos que parecem não ter compreendido a linguagem dele. Renato é nerd, casado com uma nerd e vive cercado de nerds, um nerdster por excelência. É fã de video game, RPG, quadrinhos, séries de televisão, cinéfilo, entre outras drogas pesadas do gênero. Quem não estiver familiarizado com a linguagem dessa cultura pop, realmente vai encontrar dificuldades em acompanhar sua narrativa. Ela é muito ágil e conta com a inteligência activa do leitor, quando pensas que a espada está voando, a cabeça já rolou e a turma já está amargando o luto, no dia seguinte.

O livro começa onde o anterior terminou, o que mostra que meu amigo não é essa bagunça que vocês pensam dele. Apesar disso, quem (EU NÃO ACREDITO QUE VOCÊ) não leu A batalha de Argos vai conseguir compreender a trama, se estiver com o raciocínio em dia. Entretanto, o aprendizado que o livro oferece, fica mais bem sucedido que o anterior já estiver devidamente digerido. Vejamos...

O anterior mostrou como nascem as conspirações, pois A Queda do César mostra sem disfarces como ela se desenrola. O leitor vai aprender que não deve ser surfista político, indo na onda de uma multidão que adora, teme ou adora e teme um figurão. O dito cujo, que está sob holofotes, é apenas uma marionete, que será descartada assim que não servir mais, ou que sua preservação for menos interessante do que sua ruína. Aliás, o autor mostra em detalhes, com a sutileza de um beija-flor e a frieza de um psicopata. Ele não te poupa da verdade, ainda que sob andrajos de uma ficção. É como se ele dissesse "Eddie, eu vou esquartejar esse cara legal aqui e já vou almoçar".

Às vezes ele dá a impressão de que seus livros são escritos a vários pares de mãos, às vezes me dá a certeza de que sim.

Acontece que as pessoas realmente sujas, são discretas. Elas se preservam da ira popular, porque sabem que é implacável. Quem viu o jogo de manipulações no livro anterior, ainda assim vai se impressionar com as dimensões que toma neste.

Aprenderá que a causa mais nobre e bem intencionada pode ser facilmente corrompida, se o grupo radicalizar sua posição. Por que? Porque os manipuladores estão atentos, prontos para suprir as necessidades imediatas em troca de submissão. As pessoas não precisam saber que estão sendo submissas, há muitas formas de o serem sem que percebam. e quando percebem, já é tarde, estão viciadas na vontade do manipulador. E serão descartada assim que não servirem mais, ou ele encontrar marionetes melhores.

Quando falo em descartar, não digo que vai deixar ir embora livremente, me refiro a assassinato cruél e exemplar. Isso acontece todos os dias e o amigo Renato esmiuça os requintes de crueldade, na ficção. Não pensem que quem elegemos é menos demoníaco do que o Castellian, só não tem as mesmas ferramentas.

Aprenderá ainda que as motivações de um evento gigantesco, podem muito bem ter origem em um facto cotidiano, uma frustração ou mesmo uma dor de cotovelo. Mesmo uma figura sagrada perde completamente seu valor, quando o ego está em jogo. Aliás, não é esta a causa primaria de todos os conflitos? Todas as guerras, no fundo, foram e são guerras de egos. A vida ensina de forma dura, mas o renato nos mostra isso no conforto de uma leitura, antes que a pancada nos atinja, por falta de prevenção.

Aprenderá que não existe danação eterna, simplesmente porque as pessoas não são infinitas, então não têm condições de fazer algo de tão ruim que jamais tenha conserto. O eterno e o infinito não pertencem às criaturas. Mas um manipulador de modo algum admite que se compreenda isso, porque lhe tira poderes. Ele fará de tudo para te convencer de que és impotente à sua presença, sem escrúpulos e sem medir conseqüências.

Esses que se vangloriam de terem se livrado dos manipuladores, mas continuam em sua senda de maldades,  se pegarão cedo ou tarde mais comprometidos com eles do que quando cooperavam. O mal é uma marca, ele te encontra onde que que estejas e sabe exactamente onde e como te fragilizar. Não hesitará em usar teu corpo como luva, que descartará sem puderes para não deixar pistas de sua ação.

Aprenderá também, se ler direito, que a convicção não deve ser confundida com certeza. Uma convicção arraigada, então, de modo algum deve ser vestida de certeza absoluta, pois esta só tem quem não erra, e quem não erra não aprende, quem não aprende não tem respostas e tampouco certezas. Se uma placa de trânsito avisa que há um barranco logo à frente, não significa que devas manter a direção e se estabacar lá em baixo.

Os próximos livros, A Dama da Montanha e Crônicas de Leemyar - O Necromante, este da Eddie, trarão surpresas adicionais e luzes novas, com mais do que os sete habituais matizes a que nossos olhos preguiçosos se habituaram... Só que trarão ainda mais perguntas do que respostas, então treinem a arte da paciência.

Aprenderá ainda, por fim, que não importa o quanto o seu grupo esteja ferrado, é muito melhor estar ferrado em grupo do que sozinho. O grupo te dá algo em que se apoiar ou, no mínimo, alguém em quem colocar a culpa.