07/06/2012

De nossas conclusões



Com poucas exceções, estão todas contaminadas por elementos que neutralizam qualquer boa intenção ou desejo de imparcialidade. É até possível ter uma conclusão madura, mas para tanto é necessário deixar o ego de lado, na hora de raciocinar a respeito.

O que mais atrapalha uma boa conclusão, é a convicção. Alguém convicto de uma idéia, terá muita resistência em aceitar uma conclusão que a contrário, sentindo-se fortemente tentado a acrescentar elementos que a adaptem ao que lhe for confortável. Adianto que o conforto a que me refiro, não é o de consciência ou mesmo o físico, embora possam coincidir, mas o de ego.

É verdadeira a máxima de que muitas pessoas preferem ter razão a serem felizes, ou não teríamos tantos machões assassinando suas esposas apenas por suspeitarem de adultério. Assim, fica menos difícil perceber o quanto é comum as pessoas se sabotarem apenas para não estarem erradas, sabotagem que contamina rápida e facilmente todos os seus raciocínios, estes dirigidos de acordo com o que, muitas vezes, o indivíduo quer concluir. Confirmar seus medos é um modo de saber que se está defendendo a frente certa. Seria horrível montar um abarreira enorme, e descobrir que os lobos estão logo atrás de você.

Estar errado uma só vez em suas convicções, significa poder errar outras, e assim ter que admitir que não se está no comando da situação. Para quase todos isso é normal, para muitos é um grande incômodo, para um certo contingente chega a ser insuportável. Este, em vez de aceitar que pode ter errado em suas conclusões, encrua mais e imagina uma miríade de motivos para as suas previsões terem dado errado, sem remorsos de mentir descaradamente para si mesmo, ainda que para tanto precise jogar culpas pesadas para os outros.

As experiências de vida também são um contaminante importante. Elas induzem menos ao erro, por conta do aprendizado, mas induzem. Pessoas que confiam demais em suas experiências, se dão o direito de ignorar que elas não servem para todas as ocasiões. Acreditam que são imunes a acidentes e deixam de usar o cinto de segurança, só porque jamais foram jogadas para fora do carro em uma colisão. Concluem que, se não aconteceu até certa idade, é porque nunca acontece de verdade, usando até mesmo a experiência alheia para justificar sua conduta, como evocar o avô-chaminé que morreu com mais de cem anos, para fumar e baforar nos outros.

Reforça a conclusão por experiência, o facto de ser comum encontrar mais gente que aprendeu pelos mesmos meios. Tomando aquela gente como sendo "todo mundo", o indivíduo acaba concluindo que aquilo é o mundo e que o que se diz em contrário não é verdade. Quando conhece relatos de pessoas que sofrem seguindo caminhos diferentes, o arraigamento se intensifica, não raro o cidadão torna-se um pregador chato e com tendências radicais, já que tudo parece confirmar suas conclusões. Relatos com indícios fortes de experiências bem-sucedias em contrário, são rechaçadas, ainda que as provas estejam à vista. Afinal, as conclusões a que chegou têm um embasamento sólido, talvez não confiável, mas sólido.

Conclusões conseguidas por informações de terceiros são as mais comuns, também as mais susceptíveis a erro. A confiabilidade dos noticiários é freqüentemente posta em xeque, em pouco tempo, muitas vezes pelos mesmos que deram a primeira notícia, ainda assim é comum a mentalidade do "Se apareceu, é porque é verdade". O grande problema aqui, é a quantidade de divergências entre dois focos de uma mesma notícia. A defesa de muita gente, é passar a acreditar em uma só fonte, para evitar ter contradições, infelizmente o credo na fonte única costuma beirar o absolutismo. O resultado é que o indivíduo passa a desacreditar nas outras fontes, ainda que digam a mesmíssima coisa que a sua escolhida, de onde todas as suas conclusões são tiradas. Conclusões derivadas das conclusões de quem escolheu a notícia e a forma como ela foi veiculada. Ainda que várias fontes dêem a mesma notícia, focando os mesmos aspectos, o que e como se fala a respeito, no decorrer da notícia, muda a conclusão do ouvinte.

Por isso mesmo, é comum certos grupos políticos e pseudorreligiosos, desaconselharem seus membros do acesso a outras fontes de informação, que não a oficial da entidade. Para o bem ou para o mal.

A família também contamina as conclusões do indivíduo, seja para aceitar ou rejeitar o que lhe dizem. Quanto mais freqüente, intenso e íntimo for o convívio, seja no bom ou no mau sentido, mais intensas serão as conclusões que se tirará a partir daquela fonte. Nietzsche concluiu que Deus não existe, por causa do pai, que era um pastor radical e intolerante. Mas poderia ter concluído exactametne o oposto, se não tivesse tamanha necessidade de liberdade de expressão.

Conclusões tiradas do convívio familiar podem mudar, de forma radical, com as descobertas que os anos proporcionam, sobre a vida e sobre a própria família. Uma decepção forte pode matar tudo aquilo em que o indivíduo acreditava, e acabando por estender a conclusão para todo o restante da sociedade, como acreditar que homem nenhum presta, ao descobrir podres do próprio pai, ou mesmo que nenhuma mulher vale o que come, se descobrir que a mãe já fez algo condenável. O facto de aquela descoberta doer tanto, fecha as portas para uma vida adulta feliz. O mesmo vale para a escola e o trabalho, que podem fazer o indivíduo acreditar que ninguém consegue cousa alguma por mérito, concluindo assim que a honestidade não compensa. Eu teria motivos para tudo isso, se fechasse os olhos para todas as facetas do mundo ao meu redor.

Não é preciso andar muito para o indivíduo ver suas conclusões desmentidas, não raro dentro do convívio pessoal, ironicamente até mesmo quem compartilha das mesmas conclusões pode fazê-lo, ainda que sem querer. Observar o comportamento de seu grupo, mesmo sob o risco de grandes decepções, pode mostrar as contradições e fragilidades de uma conclusão muito importante. Aqui o indivíduo tem uma bifurcação, um lado leva para posições ainda mais radicais, a outra para um relativamente longo período de melancolia, tentando digerir a perda do chão.

Há meios de se proteger, com relativa eficácia, de conclusões contaminadas. Um deles, e talvez o mais eficiente, é aceitar que nós podemos errar e erramos com freqüência, muitas vezes e nos mesmos pontos, que acreditávamos já ter resolvido a contento. Temos o mau hábito de tropeçar nos mesmos buracos, muitas vezes, até que a dor no dedão se torne grande o bastante para nos deixar mais atentos, ou até que o sujeito compre um coturno para tropeçar e cair sem atingir a unha encravada.

Nesta semana, por exemplo, após uns dois anos de meditação a respeito, conclui que toda promessa é uma mentira prévia. Contaminado pelos noticiários e pelo cinismo dos políticos e muitos magistrados, o leitor pode querer adoptar minha conclusão para sua coleção de bordões preciosos. Não façam isso, a conclusão é falsa, foi contaminada por minha experiência de vida e pelo facto de que as pessoas realmente quebram muito as promessas que me fazem. Entretanto, afirmar o supracitado é duvidar da boa fé de alguém que pode simplesmente ter perdido as condições de cumprir com sua palavra, condições que tinha quando fez a promessa. A pessoa não mentiu para mim, ela realmente tinha a firme intenção de me beneficiar, mas como eu disse acima, nós não temos o controle da vida, só influenciamos os rumos que ela nos dá, só podendo escolher o caminho quando nos mostra entroncamentos.

Percebendo as infecções que tinha, descartei a conclusão e a tenho apenas como mais uma lição aprendida. Acham muito tempo, dois anos de meditação? Há assuntos que já me tomam quase trinta anos, pois encontro falhas crassas sempre que acredito ter chegado a uma conclusão. Claro, isso no tocante aos objetos da questão, no geral eu não fico lambendo assuntos que já se resolveram. Entretanto, nenhuma conclusão tem de mim o status de perpétua, pelos mesmos motivos que me levam a recusar o poder de decisões irrevogáveis a qualquer pessoa.

Nenhum comentário: