03/08/2011

Menina oitentinha

Hello! I'm be back!
Depois de tantos textos densos, sobre assuntos pesados e desagradáveis, hoje tenho algo mais leve e aprazível para falar.

Ontem, no início na noite, tive uma raríssima boa surpresa dentro de um ônibus. No caso, um caio Apache Vip cheio de remendos e com a transmissão roncando feito uma porca prenha.

A certa altura da viagem, ainda em Campinas, entrou uma menina que me chamou a atenção, até então polarizada em meus devaneios; me dou o direito de chamar de "menina" qualquer uma com idade para ser minha filha. Baixa estatura, bonita de rosto, corpo bem recheado e esculpido, sem qualquer excesso, o estilo que adoptou é que fez a diferença. Usava uma blusa sem mangas, em um azul-teal meio escuro, com cinto largo e mini saia de couro, as sandálias eram rasteiras. A beleza harmônica da idumentária que marcava a cintura não parecia merecer a atenção dos demais, com o cós alto e a gola "quase princesa", digamos, uma "gola baronesa". Tudo bem porporcionado, ela parecia ter a estatura que tem, nem mais baixa, nem mais alta, a roupa a deixou com proporções perfeitas. E sim, a saia era bem curta, mas com boa margem de segurança, afinal ela anda de ônibus, não em carro próprio. Era uma lição visual de elegância básica: barra sobe, salto desce. Embora curta, a saia não se movia, não subia, estava confortável, apesar de bem acomodada no corpo. O que vemos por aí, pelo contrário, é algo tão esvoaçante quanto curto, tornando perigosa qualquer brisa, ou tão justa quanto curta, obrigando a puxar a barra para baixo a cada dois passos.

A postura era nobre, discreta, com a coluna erecta e tentando se segurar naqueles canos de alumínio, até que surgiu uma vaga para se sentar. Eu tinha sacolas pesadas, mas havia uma vaga ao meu lado. Ela, porém, com a prudência que poucas de sua idade têm hoje, preferiu não ficar presa no assento interno com um estranho acompanhando.

O rosto da menina completava a cena com competência. Quadrado e bem corado, nem claro e nem escuro, com uma maquiagem similar ao pó-de-arroz roseando maçãs e um batom em vermelho bonito, mas discreto. Os cabelos em tom castanho estavam encaracolados em toda a sua extensão, cheios, densos, brilhantes, emolduranto aquele olhar tranqüilo de quem sabe ainda ter muito tempo para fazer seu pé de meia.
Tive o cuidado de ser discreto, olhei por poucos segundos, mas foi o suficiente para notar o quanto aquela figurinha delicada destoa da agressividade compulsória que reina neste triste início de século. Ela sentou-se logo atrás de mim.

Em pouco mais de um quilômetro apareceu um amigo para fazer-lhe companhia, então, pela voz, percebi que se trata realmente de uma menina. Mas pelo teor da conversa, seria uma mulher jovem. Eles falavam de estudos e trabalho, ela relatando as experiências que já teve em seus empregos, e que estava procurando um novo há dois meses. A fala era calma, mas animada, pois no meio do tema "trabalho" vinha também o "folga e lazer".

Não só isso, também me encantou a beleza de sua fala. O tempo, o número, o gênero e a pessoa eram conjugados com naturalidade e correção. Ela não relaxou o vocábulo, embora termos coloquiais estivessem presentes, por estar em um ônibus. Ao contrário da cartilha medonha do governo, defendida por teóricos de ar-condicionado, o plural saía com uma facilidade fascinante, sem aglutinações bizarras, nem neologismos estéreis que só o grupinho fechado conhece. Percebi tratar-se de uma menina com responsabilidades assumidas desde cedo, sem muito tempo para dedicar a facilidades de baixo ventre que fazem tanto sucesso.
Quase no ponto em frente à rodoviária, pela janela, vi um exemplo oposto. Com o namorado, outra menina de cabelos lisos usava um traje de saia não mais curta que o da outra, mas de tecido fino e esvoaçante, calçando saltos tão altos que parecia estar na ponta dos pés. Andar por aquelas bandas de salto alto já é uma incoerência, com aquela barra então... Deu a impresão de que ele estava desfilando com ela, porque o tempo que a menina parece ter tomado se arrumanto, ele tomou se desleixando.

Enfim, aquela menina era a personificação do que havia de melhor nos anos oitenta. O modo de falar deixou às claras que aquela atitude não era uma obrigação, porque já me doeram os ouvidos falas de moças bem uniformizadas que tinham bolor de sobra. Não foi o caso, a bela viola tocou acordes dignos de sua aparência jovial e aprazível.
A menina parecia uma boneca, mas não uma boneca de louça sintética, dessas mais artificiais do que o plástico que lhes origina. Uma boneca para o dia-a-dia, sem afetações e disposta a enfrentar o mundo, como parecia já fazer há bastante tempo.

Descemos no mesmo ponto, mas fomos para direções opostas. Me peguei perguntando quantas crianças mais tomam aquela postura, porque não se tratava apenas de um estilo vintage, como a roupa, mas toda ela era vintage na melhor acepção da palavra. Deve haver mais gente com esse grau de civilidade e maturidade por aí, não é possível que não haja.

Mais cousas agradáveis aconteceram nas poucas horas de que eu dispunha para aquela noite, mas elas não vêm ao caso. Vem o facto de um fio de esperança, que estava quase se rompendo pelo excesso de esforços, ter recebido a primeira camadinha de verniz em muitos anos, senão pela primeira vez.

10 comentários:

Eu disse...

Achei o texto muito bom. Fico fascinado pelas meninas oitentinhas. Talvez algum dia eu tenha a sorte de atrair a graça de alguma...

Nanael Soubaim disse...

Não é fácil, elas não são fáceis. Tu precisas ter atitudes maduras e fazer por merecer.

cRiPpLe_rOoStEr a.k.a. Kamikaze disse...

E hoje nós vivemos a época das piriguetes, que ignoram quaisquer valores morais, e ainda são aplaudidas pelos candidatos a corno que não sabem valorizar uma mulher decente.

cRiPpLe_rOoStEr a.k.a. Kamikaze disse...

Antes que eu me esqueça: hoje eu vi uma pequena frota de NISSAN LEAF. Vou tentar ver se consigo fazer umas fotos boas antes de sábado...

Anônimo disse...

Nanael:
Aqui em BH, eu e minha esposa percebemos a diferença entre as "meninas" daqui e do RJ. Ei-los:

1 - As meninas do RJ vestem calça 2 numeros menor que o confortável;
2 - As meninas do RJ usam sapato de salto agulha ou chinelo "3 dedos (o dedão e o mindinho ficam de fora);
3- As meninas do RJ se maqueiam muito bem, mesmo bronzeadas;
4 - As meninas de BH não tem cabelo ondulado, sequer encaracolado;
5 - As meninas de BH usam camisa comprida, bermuda com bolso aparecendo e bolsa LVMH no cotovelo;
6 - As meninas de BH usam pregadeira na franja;
7 - As meninas de BH se maqueiam igual ao palhaço Krusty;
8 - A gramática de BH só tem paroxítonas e proparoxítonas, além de não existir sílaba átona;
9 - Toda frase das meninas de BH começa com um "aqui...";
10 - Todas as meninas de BH são simpáticas, o contrário das do RJ que acham que você está flertando...
10 -

Nanael Soubaim disse...

Assaz interessante! Mas a pessoa que pensa que tudo é flerte, geralmente reclama muito quando não consegue um.

Smareis disse...

Ache interessante seu texto. Essas garotas não é fácil de pegar, sempre escapam pelos dedos.
Gostei muito do seu espaço e vou estar a te seguir.Convido a conhecer meu blog, e se gostares me siga também. Um abraço e ótima quinta.

Smareis

Vy disse...

Bom, nem tudo parece estar perdido!
Eu também acabo reparando nesses "milagres" vez ou outra. Onde moro não existe superação...
Mas às vezes a sociedade tem que chegar no fundão mesmo, porque essa é a única forma de começar a subir de novo. Eu creio que um dia as moçoilas vão cansar do "sobe-desce" e voltarão aos 80. Será? Bom fim de semana querido! Vy

Smareis disse...

Dei uma passadinha só pra desejar uma ótima semana cheia de coisas maravilhosa e sonhos realizados. beijos

smareis

Nanael Soubaim disse...

Aduhirê, fiota.