12/03/2011

Diversidade sem politicagem

Pois é, minha gente, os anos sessenta e setenta provaram que é perfeita e facilmente possível incentivar a tolerância, a diversidade e a igualdade na raça única, e cheia de biotipos, que é a humanidade terrestre. Não existem raças nesta espécie, ao contrário do que malandros de colarinho branco apregoam.

Há um blog americano sobre quadrinhos antigos... É, para a maioria de vocês eles são antigos. Bem, descobri este blog há poucos meses e esperava uma oportunidade para falar a respeito. A falta de tempo, que me obriga a fazer este um texto compartilhado entre Palavra de Nanael e Talicoisa, agora com cunho mais pop cultural, me deu a chance. Semana que vem trato de assuntos mais espinhosos, mas só no Palavra.
O blog (este) é Out Of This World, do simpático cidadão conhecido como KB. Sujeito maduro que decidiu partilhar seu acervo com quem gostar dele.

O movimento começou nos anos cinqüenta, quando ainda se corria o risco de represálias da KKK, a Ku-Kux-Klan, ou cocô-cocô-cocô para quem sabe o que eles têm na cabeça. Na época o apartheid ainda vigorava nos Estados Unidos e a união conjugal entre negros e brancos era crime. A turma do Bush queria perpetuar isto.

O marco mais significativo foi um quadrinho sobre Martin Luther King, este aqui, de um título que costumava tratar de história social de modo leve, mas inclemente e sem poupar ninguém. Isto encorajou as editoras a meterem a cabeça no assunto e mergulhar na piscina dos quadrinhos de igualdade inteligente. O interessante desses quadrinhos é eles não abordarem o assunto. Sim, eles não consideram em suas páginas, quase sempre, a relação branco-e-negro como um assunto. Fazem sabiamente entender que seria como abordar a relação gente-e-gente. Simplesmente mostram negros e brancos, héteros e homens visivelmente efeminados em situações cotidianas, hora se abraçando, ora querendo torcer o pescoço, como acontece com pessoas normais... Ou quase. Lembremos que foi a época da psicodelia, algumas estorinhas parecem ter saído de um retiro espiritual demasiadamente profundo, ou de uma dose maciça de LSD. Uma boa dose de absurdo faz parte da ficção.

O quadrinho que ilustra o texto saiu de Bunny (aqui), com a personagem título trabalhando como modelo com sua amiga Marcy, que é negra e costuma invadir o gibi da amiga sem pedir licença, mas deixando ela fazer o mesmo. Pela indumentaria vocês podem imaginar o que foram os anos sessenta. Mó barato, aí! O broto papo firme está numa boa com seus camaradinhas, tendo um lero musical com a patota do bar.
O facto de não abordar, de modo politiqueiro, o que deve ser natural e incentivado como tal, permitiu aos roteiristas escreverem tramas leves, fáceis de entender e ricas em entrelinhas, que os mais intelectualizados e os mais sensíveis percebem facilmente, ao passo que os menos intelectualizados e os mais superficiais simplesmente se divertem com o ridículo alheio. Faz parte do espetáculo.

Uma característica da linguagem é a ausência de discursos. Não há diálogos idiotas como "Nós, os afrodescendentes como se não houvesse pardos e brancos na África, estamos conquistando nosso espaço dia a dia na sociedade racista que ainda oprime e reprime, negando a igualdade racial potoca-potoca-potoca..." que hoje são inseridos em qualquer situação, mesmo em cenas de batizados. Não há a subliminar prática racista anti-ariana e negros não são tratados como coitadinhos. Ninguém é coitadinho nestes quadrinhos, que levam a assinatura da longeva Archie Comics (site oficial), que começou a se mostrar estranha ainda nos anos quarenta e está na activa até hoje. Por falar nele, o site tem uma página de download gratuito e seguro, que já doou mais de dois milhões de arquivos, entre aqui e se divirta. Eu disse que esses quadrinhos antigos dão de cem a zero nas bobagens politicamente patéticas de hoje.

Desde que o abolicionista Monteiro Lobato (conheça-o) foi barrado de muitas escolas públicas, acusado de racismo, me desiludi completamente com os órgãos que deveriam ser culturais. Percebi o que há por detrás da decadência veloz que assola a cultura de massas: politicagem. Pessoas com reivindicações legítimas são iludidas por malandros que almejam vôos políticos, incentivadas a extremarem seus discursos e transformadas em massas de manobras. Como resultado a comunicação está cada vez mais artificial e sectarizada, pois é mais um aviso de punição iminente do que entretenimento.

Um exemplo que o Brasil conheceu foi Josie e as Gatinhas (here), que trabalha muito bem o estilo visto em Bunny and Marcy. Chegou a ter um desenho meio tosco, mas muito divertido, nos anos setenta, reprisado até início dos oitenta. Uma integrante da banda é negra com os devidos cabelos densamente encaracolados, e é um dos cérebros da equipe. Por ser negra? Não, simplesmente porque é um gênio mesmo. O único aparente estereótipo é a baterista loura, avoadinha, coitada! Mas não é burra, simplesmente com um enorme défcite de atenção.

Mas personagens mais antigos também entraram na dança, até antes, como Little Audrey, em um episódio bastante (este) instrutivo. O personagem negro é o pequenino Tiny, quase um Denis Mitchel careca, que sem querer põe a família com os nervos à flor da pele, e quando quer enlouquece de vez. Não há discursos de "O pequeno afrodescendente está fazendo o mesmo que os brancos fazem, então não deve ser punido". Simplesmente mostra uma criança hiper activa com uma criatividade acima da média pondo até mesmo a terível Audrey em apuros. Imagine mostrar isto a crianças americanas da época. Imaginem os gibis fazerem isto hoje. Alguém seria processado porque personificou Tiny como o pestinha da turma,  e não o garoto branco de chapéu, portanto é racista e vamos quebrar tudo! O mundo está ficando burro. Em vez de reverter, estão invertendo as discriminações e dando combustível para os cocô-cocô-cocôs que proliferam por aí.

Títulos com quase todos os personagens (e todos os principais) negros proliferaram na época, como Fatalbert e Fast Willie Jackson, que poderão ver no blog indicado. O que me faz lembrar inclusive de uma propaganda na Cruzeiro, sobre uma cadeira de rodas, onde o sujeito diz, "com licença, tenho pressa", como qualquer homem de begócios a caminho de uma reunião. Não havia espaço para coitados, os políticos ainda não tinham se dado conta disso e não estragavam os enredos. O que vão pensar de mim por este texto não me interessa, até porque já pensam desde que comecei a blogar. Deturpariam tudo o que eu dissesse não importando o que fosse, então que vão os que não gostam porcurar algo útil para fazer.

Quando não metem políticos no meio, as pessoas se entendem.

2 comentários:

Vy disse...

É por isso que eu te adoro!!
Mandar às favas, bananas, plantar batatas, qualquer um serve. Eu, fico por aqui mesmo. Beijos sem política! Vy

Nanael Soubaim disse...

Mandar eu mando, mas eles não sabem nem fazer um furo com o dedo, os preguiçosos.