Aviso de antemão que eu estou a par da tragédia do Rio de Janeiro, não sou insensível e não me esquivei de falar a respeito, mas tratei do assunto denso e sufocante em um blog próprio para isso, pode ver clicando aqui.
EM HONRA À GLÓRIA |
Dentre as muitas tosqueiras que apareceram no Brasil, os super heróis estão entre as piores. O grande problema é que seus autores os levam à sério com um orçamento que não pode ser levado à sério. A maioria não aprendeu a diferença entre fazer uma expressão séria e ficar com cara de quem está apertado, sem um sanitário por perto. Já vi boas idéias naufragarem porque seus criadores insistem em agradar aborrescentes viciados em homens másculos e com cara de mau... Imitar o Wolverine, sem o carisma do Wolverine é a receita certa para o fracasso.
Gibis e mais gibis com nomes pomposos, chamativos, cheios de cores e mulheres muito mais artificiais do que o bom senso tolera nas poses. São artistas de talento, mas que esqueceram que mesmo o universo Marvel tem seus bons momentos de humor, e que seus heróis começaram de modo singelo, não foram mandando porrada logo na contracapa. E, me desculpem a sinceridade cortante, mas o roteiro costuma pecar muito. As explicações para a origem de um poder ou a motivação de se assumir a capa de herói, atravessam fácil a linha do ridículo... quando há explicações.
Sem capricho na arte, usando linhas muito espessas, sem uma boa argumentação, sem um bom roteiro, sem nem mesmo carisma e humor que deveriam ser a regra em um trabalho brasileiro, as revistas encalham. Não adianta culpar o público, o editor, o governo e a concorrência estrangeira. O público é cada vez mais medíocre, sim; o editor é uma sogra que dispensa matrimônio, sim; o governo quer mais que o povo vire zumbi, sim; a concorrência estrangeira tomou todos os espaços que conseguiu, sim. Vão esperar que o público melhore, em vez de focar aquele que compra porque aprecia bons quadrinhos? Vão esperar que o editor abra o cofre, em vez de começar com fanzines ou tiras em jornais pequenos? Vão esperar que o governo ponha a mão na consciência, em vez de se tocar que ele não a tem? Vão esperar que os gibis estrangeiros abram mão de um mercado que lhes custou caro, em vez de aprender com eles?
Eu já pensei em lançar um gibi, talvez um fanzine. Mas vi que não teria (ainda não tenho) o tempo necessário para me dedicar e fazer um trabalho que eu gostaria de comprar na banca. Mal tenho tempo para escrever nos blogs, quanto mais argumentar, desenhar e roteirizar.
Eu não gosto de imitações. Embora características possam ser comuns a vários personagens, como a criança terrível, o herói atormentado, o criminoso abandonado pela família, a personalidade de cada um deve ser respeitada. Não adianta fazer de uma moça de família uma ninfeta com poses inexplicavelmente provocantes, só para vender revista. No começo até funciona, mas logo a concorrência estrangeira mostra que faz melhor, com mais conteúdo e mais barato. Eles têm pessoal especializado para cada etapa, podem se dar ao luxo. Nós, pobres fanzineiros deste Brasil desigual, temos que fazer tudo, do rabisco à venda, sozinhos.
Não bastasse isso, a maioria desiste. Simplesmente desiste. Eu não sei quando voltarei a desenhar aquela monstrinha de carinha bonita, muito menos se um dia ela estará em público, mas não desisti. Desanimado? Sim, eu estou. Eu sou funcionário público honesto, meu filho, dôo uma hora por dia ao serviço público para melhorar o atendimento ao contribuinte, como muita gente que conheço. Chego a ficar uma hora à espera do ônibus, um pau-de-arara que recebe manutenção parca e porca, pelo qual eu pago caro. Eu tenho motivos para desistir? Não na minha moral. Talvez na tua, não na minha.
Uma excessão, que vem enfrentando problemas há anos, provavelmente também o de verba, é o CAPITÃO SÃO PAULO. EM HONRA À GLÓRIA!!!
Ele não voa como o Super Homem. Ele não é brutamontes como o Hulk. Ele não corre como o Flash. Ele não atravessa muros como o Visão. Ele não anda nas paredes como o Homem Aranha. Ele não é um deus como Thor. Ele não é sexy como a Mulher Maravilha. Em compensação ele também não tem a fortuna do Batman. Que diabos então esse cara é capaz de fazer? Ele se vira.
Ao volante de seu indefectível super carro, um Puminha conversível 1977 com motor envenenado, ele vara as ruas da Cidade-Estado de São Paulo para defender a paz e a ordem. Exceto nos dias em que o rodízio o obriga a pegar um ônibus. Então o vilão ganha uma vantagem, mas é provisória.
Dono de uma persistência de dar inveja ao Coringa, vence fácil pelo cansaço os vilões como o Homem-Barata e o Capivara-Man. Compensa seu corpo franzino com os saltos atléticos e a mente activa , que divide atenções entre a vilania, o trabalho, a família e a namorada ciumenta. E quando a diarista manda o uniforme de herói para lavar? Vai combater o crime de regata e bermuda, meu.
Os poderes do Capitão São Paulo são: mente activa e afiada, ou não conseguiria perseguir e atender ao celular ao mesmo tempo; persistência invejável, ou tu pensas que é fácil andar de ônibus em São Paulo?; não se leva à sério, senão enlouquece e desaparece; animação muito simples e bem feita, para concentrar os parcos recursos no que interessa; bom humor, ainda que seja ele a vítima deste humor; o criador nunca desiste, afinal é brasileiro.
A própria concepção do personagem facilita a argumentação, o roteiro e o desenho. O Almeida, identidade secreta do Capitão São Paulo, é um sujeito comum. Ele sai no meio do trabalho para fazer um resgate, sai no meio do filme para negociar por reféns, sai no meio da noite para dar cobertura à polícia. Ele sai de seu apartamento de classe média-baixa, usando dos meios que encontra para resolver os problemas. E a vida de herói é muito mais fácil do que a de cidadão, o que todos nós estamos carecas de saber. É tudo muito simples, sem perdas de qualidade, com boa sonorização e boa argumentação. Nada de extraordinário, de poses, de grandes tramas que não caberiam no contexto. É tudo uma brincadeira e as animações deixam claro que é só brincadeira.
Mais sobre ele aqui, aqui, e no vídeo abaixo.
A própria concepção do personagem facilita a argumentação, o roteiro e o desenho. O Almeida, identidade secreta do Capitão São Paulo, é um sujeito comum. Ele sai no meio do trabalho para fazer um resgate, sai no meio do filme para negociar por reféns, sai no meio da noite para dar cobertura à polícia. Ele sai de seu apartamento de classe média-baixa, usando dos meios que encontra para resolver os problemas. E a vida de herói é muito mais fácil do que a de cidadão, o que todos nós estamos carecas de saber. É tudo muito simples, sem perdas de qualidade, com boa sonorização e boa argumentação. Nada de extraordinário, de poses, de grandes tramas que não caberiam no contexto. É tudo uma brincadeira e as animações deixam claro que é só brincadeira.
Mais sobre ele aqui, aqui, e no vídeo abaixo.
2 comentários:
haha, muito bom!
São Paulo é uma das poucas (semão a única) capitais que têm seu próprio super herói, e mais brasileiro do que as patuscadas bairristas que aparecem e somem das bancas sem fazer falta.
Postar um comentário