27/08/2010

Eu sou o cabo

Oi, meu nome é Wandderklaydyçon, eu sou cabo eleitoral.

Não estou aqui para pedir o seu voto, eu não sou candidato, só trabalho... quer dizer, só faço bico em campanha eleitoral.

Você com certeza não me conhece, e se me conhecesse gostaria de jamais ter me conhecido, mas eu te conheço muito bem. Você enfrenta trânsito todos os dias; buzinas estridentes, machões navalhando no trânsito, as Donas Marias não enxergando detrás do estepe do Cross Fox na baliza, motoristas de ônibus apostando corrida e te obrigando a acelerar pra não virar pastel de lata, aquele agente de trânsito que deixa a totosinha andar na contramão e te multa por meio centímetro em cima da faixa. Eu sei, eu te vejo. E pra piorar, quando você chega ao trabalho vê seu carro todo empetecado de adesivos escrotos que não sabe de onde saíram. Bem, agora sabe, fui eu. Você ficou tão estressado no sinal que não viu a gente chegando. É que temos de voltar de mãos vazias, e nem sempre o fiscal vacila pra gente jogar tudo no lixo e ir pra casa. Ah, uma coisinha, a cola dos adesivos não sai... Vai ter que raspar e repintar o carro. Mas não fica zangado não, tio, a gente só tá garantindo o dinheiro da Mobylette.

Eu também sei onde você mora, claro. Mas não se preocupe, não vou dizer pra ninguém que é na Rua das Oliveiras, n° 1337, Jardim Saara VII, apartamento 22. Ética? Sai fora! É que ninguém paga pra ter endereço de pé rapado, então cê tá de boa. Como sei seu endereço? Já viu a sua caixa de correio? Não? Então vai lá que eu espero... Foi? É, pela cara de cão raivoso e a boca espumando, você foi. Então, é por isso que as correspondências sérias não chegam, sou eu quem entope a sua caixa com tranqueira eleitoral, quando o fiscal não está vendo, pra ir pra casa, dormir e voltar no fim do dia, pra pegar a grana. Nada pessoal, são só eleições.

Sabe aquele infeliz com uma vuvuzela, fazendo algazarra em cima de um carro de som, que vuvuzelou justo o seu ouvido? Não fui eu, não desta vez. Mas o miserável que colocou um microphone na boca da vuvuzela, esse fui eu. Não precisa agradecer, a drogaria já me agradeceu e deu minha comissão pela venda de analgésico. Fazer o quê? É a concorrência. A gente tem que aparecer mais do que os cabos do outro candidato, é por isso que cantamos gingles estúrdios sem pagar um centavo ao compositor da música original... Se bem que ele não sabe, se soubesse o que fizemos com o trabalho dele, eu não estaria aqui te enchendo o saco.

Certo, agora você deve estar se perguntando quais as propostas do nosso candidato. Ok. Então... eu não sei. Na verdade eu não dou a mínima, nem sou louco de votar nele. E se fosse você, também não votaria, nem nele nem em noventa por cento dos candidatos. Só estou nessa pelo dinheiro mesmo, senão o Zoreia vende a Mobylette pra outro.

Mas eu gosto mesmo é de balançar aquelas bandeironas enormes. Tá certo, atrapalha o povo ver os ônibus chegando, às vezes só identificam quando o motorista fecha a porta e vai embora. Tá certo, atrapalha os pedestres verem os carros, quando vêem já estão na ambulância do SAMU (página do SAMU). Tá certo, isso tá errado, mas a gente tem que trabalhar... Quer dizer... Tem que aparecer. E se tem coisa que eu sei fazer é dar bandeira, miquento que nem eu, tá pra nascer. Tá certo, uma vez a bandeira tampou a cara de um sujeito que arrebentou o nariz no poste e eu tive que sair correndo... Heim? Era você? Putz! Ainda bem isso aqui é internet. Mas já sarou, né? Um dia sara. Ó, pra ficar tudo em paz, hoje eu enchi a sua caixa de correios com camisetas e cedês de campanha, vai ter pano de chão e espelhinho pra muitos anos.

Não, nem todo cabo eleitoral é escroto que nem eu. Tem piores, tem mais amenos e tem os que (credincruiz, pé de pato mangalô três vezes!) trabalham direito. É por causa desses sacanas que a gente é cobrado, tio.

Mas eu até que gosto desse serviço! Consigo fingir que trabalho direitinho, já viajei o estado inteiro com isso. Pode ir ver no meu orkut que tá cheio de photo que eu tirei. Não é só ralação não, tem festa também, tem dia pra ficar vagal.

E ainda sou jovem, tio. É normal eu ser sem juízo, não dá pra exigir muito mais que isso da gente. Você é que não pode ser sem juízo na hora de votar.

Na boa, tio. Se você não fosse tão relapso na hora de votar, eu podia estar estudando pro vestibular, em vez de ralar pra comprar a Mobylette. Não é pra fazer anarquia não, eu só estava te enchendo mesmo. Preciso dela pra fazer entrega, pra ajudar na despesa de casa. É que eleição é só a cada dois anos, como se fosse pouco, e a chance que tenho pra ganhar um dinheiro honesto é essa... Quer dizer... Ah, da minha parte é dinheiro honesto, do candidato eu não sei, não vi e se visse não contava do mesmo jeito.

Mas, ó, não vota no meu candidato não, que ele é um sacana. Ele vai aumentar o empurrismo nas escolas, a gente que já passa sem saber nada, vai terminar o ano mais burro do que entrou, se ele ganhar. tenho colega na sétima série que não sabe que o Brasil já teve imperador. Acho que nem sabe o que é um imperador. A ficha dele só tá limpa porque sujou a dos outros, mó laranjal, tio. O que ele não conta é que triplicou a verba de gabinete pra empregar os amigos.

Vota direito, tio, eu quero estudar pra ser alguém na vida. Já chega o meu pai que aceita emprego de quinta porque não consegue outra coisa. Eu quero estudar pra não depender de bolsa do governo, que nem o mala do meu vizinho, que engravidou a moça confiando nas cestas e nos vales que eles dão. Dão... Dão o cacete, tio, eles tiram do seu bolso. Ela não tem dezoito anos e já tá esperando o segundo.

Agora dá licença, tio, que se o Nanael descobre que eu tô fuçando blog dele, aí é que eu nunca vou pra faculdade mesmo. É que se eu colocar isto no meu, o hômi desconfia. Fui!

Ah, vê se vota com a cabeça, mané.

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