28/07/2007

Memorando I

Caro Senhor Director desta Instituição;
Após cordiais cumprimeitos, venho por meio deste externar minha preocupação com os rumos tomados pela sua administração.
Reconheço que se faz necessário cortar supérfulos, o que é uma atitude sábia. Reconheço que deve haver alguma disciplina mínima para a boa convivência, atitude sapientíssima. Reconheço ainda que se deve regular o acesso de gente estranha ao quadro desta entidade, atitude que merece aplausos.
Devo considerar, entretanto, que nem tudo é supérfulo, nem tudo exige disciplina e nem todos os que entram são estranhos.
Meu médico não é estranho, ele trabalha nesta instituição, tendo sido inclusive membro da primeira directoria, quando da fundação. Meus funcionários podem e devem se identificar na portaria, mas nunca o meu médico! Seria melhor o Senhor Director se identificar e até prestar reverências diante de tão augusta figura. Eu não estou aqui de favor, pago caro pela minha hospedagem.
Não se pode querer disciplinar as idas ao sanitário. Ninguém em sã consciência vai três ou quatro vezes àquele lugar porque gosta. Os funcionários, que já estavam aqui quando o "Senhor" Director ainda usava fraldas, trabalham duro todos os dias, por vezes abrindo mão de pequenas folgas, para oferecerem aos associados um tratamento dígno. E não pedem hora extra por isso. Basta lembrar, por exemplo, das enfermeiras que saíram feridas quando foi preciso, inclusive com meu auxílio, conter um dos amigos do "Senhor" Director. Apesar da elevada hierarquia social que trago, não me importo em ajudar nas actividades mais frugais desta instituição, que por anos tem me apartado do mundo insano que se instalou lá fora.
Desjejum NÃO É SUPÉRFULO! Supérfulo é um Mercedes Benz à disposição da directoria, quando o antigo director utilizava um austero e bem-exemplar Fusca Itamar. Não será nos dando pão com manteiga e comendo damasco, que o "Senhor" Director (?) saneará as finanças desta instituição. Não tente me enganar, sei muito bem que a antiga directoria deixou as contas em dias, com saldo positivo no banco. Está tudo com os meus advogados, pronto para ser utilizado caso não se reestabeleça a boa ordem.
A faculdade, "Senhor" Director (ah, ah, ah! Que piada!) ensina muitas coisas boas, mas a maioria delas só se aprende com a idade, que o senhor ainda não tem. Eu conheci seu pai e sua mãe, exemplares obreiros desta sacra instituição, que me acolheu sem saber quem eu era e de onde vinha, me tratando como se trata a realeza. Quando recebi alta, não quis sair, senão para passeios e visitas a amigos e familiares, pois é aqui que está o meu lar. Não permitirei que um garotinho que decorou os livros e as citações philosóphicas, sem saber o que realmente significam, destrua tudo o que Minha Majestade ajudou a construir. Lembre-se de que trabalho em regime de voluntariado e tenho a plena confiança dos demais associados e de todo o funcionalismo.
Espero que esse episódio possa ser enterrado e possamos ser bons amigos, ambos temos muito a ganhar com misso, principalmente o senhor.

Atenciosamente;

Jocasta Nero Bonaparte de Nazaré
Rainha do Egipto e inventora da roda.

Nenhum comentário: