13/05/2016

Bronca pelas boas rádios




  Conforme alguns já sabem, eu ouço preferencialmente a Rádio Executiva FM, pela qualidade da programação e a recusa terminante em exibir alguns refugos, que são exaltados pela própria Globo, da qual sua controladora é subsidiária. Nem sempre gosto, confesso, especialmente quando abusam de versões modernas ou alternativas de clássicos da música. Afinal, qual o problema com os originais, especialmente quando poucas rádios os tocam? É um refúgio musical que faço questão de ouvir em volume baixo, só para mim, dando aos apreciadores de outros gêneros o respeito que eles não dão a ninguém. Rádio diferenciada, público diferenciado, compreendem?

  O que tem me irritado, entretanto, não é a rádio em si, mas as intervenções tóxicas de lixo midiático, quer por pagamento de espaço publicitário, quer por obrigatoriedades legais em prol de gente que não se esforça nem um pouco por merecer minutos valiosos, dedicados a um público que não gosta de qualquer coisa. Às vezes me parece que alguém na Jaime Câmara odeia a Executiva e seus ouvintes, porque as interferências na programação são muito claras, ultimamente até a narração ficou comprometida.

  O meio mais fácil de me fazer desligar o rádio, é com uma propaganda imbecil. Textos pobres, com interpretações rasas e apelos baratos, têm proliferado exponencialmente nos últimos meses, mas já apareciam timidamente nos últimos anos. O último e pior exemplo, foi de uma concessionária Renault, que achincalhou com o padrão de qualidade que sempre foi a âncora da Executiva. Sabem aquela besteira daquele MC Bin Laden, que viralizou nas redes sociais? Eu nunca tinha ouvido, até essa tal concessionária, como acompanhamento de um texto digno de botequins de beira de estrada, usou a “obra prima” como fundo musical.

  Não foi a primeira vez, mas foi o cúmulo. O famigerado “sertanejo universitário” já infectava de vez em quando, uma emissora à qual eu já ouvi o caipira legítimo, que também tem perdido espaço com as interferências sofridas. Eu não sei onde foram parar os bons publicitários que Goiás gestou nos anos noventa, mas eles fazem falta, principalmente porque saberiam que certos públicos rejeitam tanto certos “gêneros musicais” mal executados, que simplesmente não prestam atenção ao anúncio... Agora estou ouvindo a de um grupo que há pouco conseguiu ser concessionária Mercedes-Benz, que está maltratando meus ouvidos com um texto ridículo, no pior estilo “promoção imperdível”.

  Pior ainda é ouvir propagandas absolutamente mentirosas dos governos, obviamente caríssimas, tão caras quanto mal feitas, pagas com o erário que deveria ter resolvido os problemas que dizem que estão combatendo. Narrações em tons de benevolência me irritam ainda mais do que os com empolgação forçada, porque fazem o eleitor parecer uma criança com demência; o outro quer nos fazer parecer apenas dementes. Irrita mais essas afrontas à inteligência e à dignidade serem veiculadas em um dos poucos veículos que ainda nãos e renderam ao idiotismo midiático.

  Nãos sei vocês, mas para mim é triste ouvir Changes do Black Sabbath e imediatamente mergulhar no enxofre de “tá tranqüilo, tá favorável”, sair de Lonely Looking Sky por Neil Diamond para depois sofrer com um “vô cumê as muiezada na minha camionetona” no triplo do volume. Não sei se o idiota que comanda aquela subsidiária percebeu, mas a Executiva é um hotel tradicional cinco estrelas, não um bordel de beira de estrada, para precisar de incitações ao baixo ventre a qualquer custo. Os ouvintes da Executiva simplesmente ODEIAM invasões a seus espaços, e a programação que fez a fama da rádio é um espaço sagrado para um público órfão de produções de alto nível. Ou pensam que em alguma rádio popularesca se ouve Elizeth Cardoso cantar Barracão de Zinco? Sim, eu ouço e não é raro.

  Ouçam (ou leiam, vocês entenderam) nem todo vintagista ouve essas rádios, mas todo ouvinte desse tipo de rádio tem ao menos um toque vintagista. Vintagistas típicos prezam pela qualidade, pelo equilíbrio estético e pelo conteúdo. Não um ou outro, mas os três juntos. Sabem aquelas propagandas antigas, em que as marcas se orgulhavam de fazer productos que duravam uma vida inteira? Nós sabemos. Sabemos e temos muitas saudades, tanto desses reclames quanto dessa philosophia. Os reclames, aliás, são motivos de um saudosismo que em alguns beira o patológico, muita gente cai na melancolia ao ouvir os textos ridículos de hoje e se lembrar dos que prendiam sua atenção, na juventude. Deprime mesmo! Imagine sair de Cantiga por Luciana, magistralmente interpretada por Evinha, para cair na fossa séptica de uma catinga pra Lulu em cana! Nem as crianças respeitam mais, propagandas mal escritas e mal dirigidas fazem a interpretação pueril parecer simplesmente ruim.

  Sim, eu sei que estou parecendo arrogante, elitista, Et Cetera. Se lhes pareço ser assim, lamento, assim continuarei a parecer. É melhor do que ser hipócrita e parecer “cool” ou politicamente patético. É aquela coisa inglesa de “Não se queixe, nãos se explique”. Bem, não estou me queixando, eu estou por assim dizer, prestando queixa informal, é também para isso que tenho este espaço.

  Seguramente não sou o primeiro ouvinte insatisfeito com as interferências indevidas, seguramente não serei o primeiro e nem o último a ser ignorado por engomadinhos de ar condicionado, que infelizmente tomaram o lugar dos técnicos e suas decisões certeiras, que realmente construíram este mundo. Mesmo assim, a Beth Regina já me presenteou com algumas novidades absolutamente encantadoras. Por exemplo, o Pádua, cantor goiano com menos visibilidade do que seu talento merece. Ele fez uma versão de Batendo na Porta do Céu que deixaria Bob Dylan em prantos de tanta emoção. É de uma melancolia tão autêntica, que todo o arranjo parece ser o original da letra.

  E a Postmodern Jukebox, uma autêntica big band que, por sê-la, não ouço em nenhuma outra rádio da cidade? Year, uma big band em pleno século XXI, tradição retomada pela divina holandesa retrô Caro Emerald.

  Eu não sei até onde vai essa esculhambação, mas asseguro que o público de veículos de comunicação deste naipe, não vai se esquecer de quem o respeitou e, muito menos, de quem o tratou como lambedor de púbis. As modas passam, as descargas são puxadas, só vai ficar o que e quem tiver feito por merecer.

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