17/10/2010

Mitos sobre o antigomobilista


Muitos. O velho hábito de as pessoas confiarem no que ouviram falar por aí, em vez de se darem ao trabalho de sair do sofá e investigar um pouco, faz os clubes de veículos antigos parecerem uma sociedade secreta, com acesso restrito e ritos sacros de iniciação. Não imaginam que pessoas comuns fazem e mantém esses clubes, para preservar a memória e fomentar eventos culturais que atraem a cada dia mais simpatizantes. provavelmente vocês conhecem um antigomobilista e não se dão conta. Eis os enganos mais freqüentes:
  • Todo antigomobilista é rico;
Bem, eu não sou, nem tenho ainda um carro de coleção, mas sou antigomobilista divulgador. As pessoas não acreditam quando digo que um Ford A 1929 pode ser comprado em boas condições por menos de sessenta mil reais, e que há quem fabrique peças para ele no país. Decerto que se o sujeito for escolher a nata, só os clássicos raros pelos quais os olhos da cara são uma bagatela, precisa ter bufunfa, infraestrutura, mão de obra qualificada à disposição e um espaço só para os carros. Mas via de regra, passou de trinta anos já é um colecionável, basta ter no mínimo 85% de originalidade e estar em condições de ser exposto. Quem é classe média, tem uma situação estável, mas não pode comprar um BMW na loja, pode se dar um Landau de presente. Ou uma Chevrolet Biscaine Wagon 1965, para passear com a família toda. Quem tem um Corcel I quatro portas em perfeitas condições, sabe o que tem e o quanto os amigos antigomobilistas apreciam suas linhas simples e fluídas.
  • Carro de coleção é tudo importado;
SP2, Itamaraty Executivo e o DKW Fissore são cobiçados lá fora, e têm origem totalmente nacional. O Brasil tem um leque de modelos que foram adaptados ou redesenhados para a realidade nacional, como a fase quadrada do Aero Willys e a Rural Willys com frente bicuda. Os Volkswagen feitos até 1976 eram todos redesenhados para o Brasil, sendo Brasília um modelo exclusivamente nosso, foi exportado e é bem cotado lá fora. Não precisa ter pertencido a Grace Kelly para ser colecionável, um automóvel antigo reflete a sociedade de uma época e é isto que o torna desejável. A sociedade brasileira é única. O Fiat Oggi é menosprezado pelos brasileiros leigos, mas é um desenho único feito a partir do Fiat 147. Lá fora, se sabem da pechincha que quem pode não está aproveitando, logo ficamos sem nenhum exemplar restaurável. E é um carro para uso cotidiano, econômico, espaçoso e com boa visibilidade.
  • Eles guardam seus carro a sete chaves;
Há os egoístas que querem tudo só para eles. Sempre há esses murrinhas que, logo após o último suspiro, têm sua coleção totalmente vendida pelos herdeiros, a preço de banana. Mas a maioria gosta que as pessoas usufruam de uma visão bonita e classuda, o que os carros antigos oferecem de melhor aos passantes. Antigomobilista de verdade usa sua coleção, a coloca a seu serviço e de sua família, pois é para isto que os carros existem. Conheço muitos colecionadores que têm muitas banheironas americanas, com bem mais de cinco metros, e as utilizam normalmente, sempre usando gasolina da melhor qualidade, mantendo a máquina sempre prefeitamente regulada, pneus bem calibrados e aproveitando para apreciar a paisagem, em vez de exibir cavalos-vapor a cada esquina. Passear em um Cutlass de capota baixa é uma experiência a que todos deveriam ter direito.
  • Não existe mulher no meio;
Engana-se quem pensa que antigomobilismo é o clube do Bolinha. Antigomobilista de verdade tem ciência de que os carros de época foram desenhados, em parte, pensando nas mulheres. Não faz sentido um hetero comprar um Cadillac Eldorado 1966 e dar carona para cinco machos; são seis lugares e um porta-malas igualmente espaçoso. Eis aqui o que digo, clique. São muitas mulheres no ramo, afinal antigomobilistas costumam viajar bastante e ninguém quer arriscar, pois um Jaguar XJ6 chama muita atenção por onde passa e as pistoleiras não dão folga. Também engana-se quem pensa que só senhoras, que se fantasiam de melindrosas, em festas à caráter integram o pelotão feminino, a juventude antigomobilista é discreta, mas é pujante Moças e moços que têm ciência de que o sangue é feito basicamente de ferrugem, a não ser que tu sejas um caranguejo-ferradura, o teu também é.
  • Não existem muitos eventos no Brasil;
Existem sim, muitos, todos os meses, praticamente todos os dias, só que a imensa maioria ainda é amadora e não tem muito espaço na mídia, mas é questão de tempo e perseverança. Calendários oficiais podem ser conferidos, nacionais e internacionais, aqui e aqui. Há na barra de links ao lado, um para o melhor blog de carros antigos que conheço, do amigo Nikollas, de Niterói, bem como um especilaizado em Fuscas e derivados, do amigo Guilhon; ele, aliás, é um franco divulgador e organizador de eventos de mão cheia. Há também um para o meu álbum no flickr, de acesso livre e reprodução para uso estritamente pessoal liberado. Águas de Lindóia é o topo dos eventos, ainda não tem rival à altura no Brasil. A cidade fomentou os encontros quando ainda eram vistos como lazer de rico que não tem onde enfiar o dinheiro, hoje Águas de Lindóia e Antigomobilismo brasileiro são sinônimos, veja aqui. Como lá fora (Peeble Beach, Autoclássica, et cétera) a economia nacional começa a sentir os efeitos fortificantes e aceleradores do antigomobilismo. Peeble Beach, aliás, é o ápce do antigomonilismo mundia. Veja aqui. A Autoclássica acontece na Argentina e é de deixar qualquer especialista de queixo caído, vale à pena ir lá, no ano que vem, porque o evento deste ano já acabou.


Mas não é só de quatro rodas que vive o antigomobilismo. Já começou, até mesmo em Goiânia, a aparecer gente que coleciona e restaura bicicletas antigas, Lambrettas, Vespas, Xispas. Também há os tratores, caminhões e ônibus, que retratam a parte mais dura da sociedade de sua época. E, dica, um Caminhão Chevrolet C60 em bom estado pode sair mais barato do que uma picape semi-nova.

Junto com os veículos, o interesse por objectos e roupas de ápoca, ou no estilo de época, também cresceu absurdamente. No exterior é comum haver feiras onde as pessoas se vestem como nos anos de 1920 até 1960 por uma semana ou mais, depende da disponibilidade de tempo e dinheiro. Por aqui os brechós estão fazendo a festa, pelo menos no eixo Rio-São Paulo. É a memorabilia, que já tem tamanha força, que estão voltando a fabricar os antigos discos de vinil. Vantagem? Se uma faixa arranhar, as outras funcionam, e não precisam de codificação de área para cada país, colocou na agulha, ele canta. Queens of Vintage é um site que trata exclusivamente sobre o assunto. Também My Vintage Vogue, que é referência quando o assunto é roupas de época.

Resumindo, qualquer um pode ser antigomobilista. Em nossos países vizinhos a auto e a memorablia são naturais, ninguém estranha quando alguém diz que ganha a vida comercializando móveis com estilo de época, ou fazendo roupas afins. E esta oportunidade de emprego honesto não tarda a fincar definitivamente raízes no Brasil também.
Agora que vocês já sabem, dêem uma olhadela nas bancas de revistas, terão uma grata surpresa.

Um adendo: Isto é cousa que poucos antigomobilistas brasileiros conhecem, um museu de microcarros, que foram febre na Europa pós guerra. Clique aqui.

6 comentários:

Francisco J.Pellegrino disse...

Nanael, muito boa a sua exposição do assunto..parabéns.

Nanael Soubaim disse...

Sempre às ordens.

Nik disse...

Sensacional o artigo, Nanael. Se fosse abaixo assinado, eu já teria endossado!

Nik disse...

Quero dizer, exceto a parte em que se refere à mim, onde você mente deslavadamente para os seus leitores! RSRSRSR! Abraço, amigo!

Nanael Soubaim disse...

Eu não disse metade do que o teu trabalho vale, precisaria de um texto só para isso.

Lilly Rose disse...

Bom dia Amigo Nanael !!

Muito obrigada por tua visita em meu novo Blog.

Tenhas uma Quinta Feira Abençoada!!
C/ Carinho,
Lilly Rose :)