04/03/2019

Evasão blogueira

The Writing Cooperative

    Recentemente um amigo decidiu abandonar tanto seu blog quanto seu canal de vídeos, ele não é o único e sequer o primeiro. Os motivos são muitos, basicamente os mesmos que tornam minhas publicações tão esporádicas, mas acrescentemos aqui o fator frustração. A era de ouro dos blogs passou e durou pouco, deixando a pouquíssimas pessoas um contingente significativo de seguidores.

    Em geral as pessoas não gostam de ler. Se um texto tiver mais do que dois ou três parágrafos, as chances de êxito são mínimas. Há os que conseguem se adaptar a isso, simplesmente porque o que têm a dizer pode ser dito com poucas (ou até nenhuma) palavras. De outro extremo há os apaixonados por textos prolixos, retóricos e verborrágicos, do tipo que gasta três capítulos pra dizer as horas. O leitor equilibrado e paciente, que era o público maior da maioria dos blogueiros, não está mais disponível. Não sei se a situação é perene, mas certamente não se reverterá tão cedo.

    Some-se a isso o pacote de expectativas que mesmo os de pensamento mais a longo prazo trazem e protegem. Passar anos sem resultados expressivos, desanima. Um deles reclamou de estar cansado de se esforçar para ter seis ou sete comentários nos textos, e não mais do que uma dúzia de acessos em seus vídeos; cifras que há anos eu não conheço. É como conversar com o espelho. Para algumas pessoas, isso basta, mas não para quem quer passar conteúdo. E meus amigos têm MUITO conteúdo para passar. Eles têm cultura, têm acesso a livros e filmes, conversam rotineiramente com técnicos especializados e, principalmente, eles estudam muito aquilo de que pretendem falar.

    Eu não os culpo. A situação chegou a um ponto em que só quem vive de renda ou do blog, pode se dar o prazer de fazer textos e publicar vídeos todos os dias. O mundo real dos trabalhadores comuns, mesmo os de classe média, não permite isso. Quando se tem família, a coisa complica ainda mais, e geralmente a família é o pior dos públicos; o que menos acessa e o que mais critica. Viver de blog ou canal de vídeos não é para todos, os patrocínios não são infinitos e os contadores de acessos não vão com a cara da maioria de nós. E tem piorado. Recentemente alguns canais de divulgação simplesmente fecharam, o último foi o "Google+", que respondia por metade ou mais dos meus parcos leitores.

    Aliás, um dos meus antigos blogs foi apagado. O Wordpress não aceita mais o meu perfil, não com os baixos acessos que eu tenho. Bem, eles têm custos, têm que pagar os funcionários e impostos; amor ao próximo é uma prática e não um meio de vida.

    Não é tão fácil com parece colocar as idéias com acento no papel, ou no seu monitor. O cérebro não é um computador, é uma coisa MUITO mais complicada e melindrosa, um simples mau humor ou uma irritação no decorrer do texto, pode arruinar a publicação. E não é tampouco só questão de se esperar pelo tempo oportuno, porque somos adultos e as atribulações do cotidiano REAL podem simplesmente desvanecer aquela idéia que não for publicada imediatamente. Enfim, viver de blog ou de vídeos é para quem pode se dedicar totalmente a isso, salvo raras exceções.

    Um dos elementos apontados como vilões é a rede social, que dá seus recados rapidamente com textos curtíssimos e memes, embora lá também haja os que queiram lacrar com textões desnecessariamente gigantescos; estes eu simplesmente lacro com um bloqueio. Ironicamente, essas redes sociais têm sido as grandes divulgadoras do que eu faço, mas talvez só porque minhas chamadas com link não têm mais do que duas linhas. Bem, acessam, se lêem até o final é outra conversa... realmente frustrante.

    Até quando este blog estará no ar, eu não sei. Sei que me manterei nisto até quando me for permitido, não será por minha vontade que esta página de quase treze anos se fechará. As esperanças pueris de viver de canais de internet, porém, jazem. Tampouco me importa mais ver as estatísticas de acessos, são tão pífias que continuar a vê-las só alimentaria minha depressão.

    Eu teria desistido há anos se tivesse ainda a vã esperança de receber um centavo por acesso; daria o quê? Uns quinze reais por mês, quem sabe. Talvez tivesse desistido há anos, se o volume de acessos ainda fosse uma preocupação, porque baixar o nível eu não vou!

    Por que então eu teimo feito um touro indignado? Porque algum dia o que eu publico aqui terá alguma relevância para a arqueologia digital. Não é ficção, já há gente gastando seu tempo com isso, como hobby. E como todo hobby, somando-se as pistas que publicações regulares dão sobre a sociedade de seu tempo, um dia será algo sério e relevante. É para isso que eu teimo. Não pé para mim, nem para o público que já não tenho, é para a posteridade. Penso em no mínimo cinqüenta anos adiante. Provavelmente não estarei mais aqui e, sinceramente, não quero estar.



    Não, meus amigos, isto não é uma despedida. é apenas uma satisfação aos pouquíssimos que restaram. Eu não vou parar enquanto tiver como continuar.

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