02/11/2010

Porque há o feminismo


A mulher bem resolvida por excelência
 Deixo claro de início que sou contra o aborto. Não estou fazendo apologia ao mesmo, não estou justificando o acto e tampouco tentando atenuar a gravidade do assunto.
Aos radicais eu afirmo que seus opostos me execram tanto quanto vocês. Uns me acusam de pelego, outros de subversivo; os primeiros pensam que o talebam é uma guerrilha de esquerda e os segundos ignoram a força da mulher em Israel. Isto dito, poupem seu tempo e vão procurar outra página para ler, que esta é dedicada aos que, como eu, cultivam a combinação de cabeça nas nuvens e pés firmes no chão.
Salvo para as detratoras do gênero feminino, abortar não é um parque de diversões para uma mulher. Uma mulher sã não toma esta decisão só para escolher o sexo ou para satisfazer um capricho pessoal. Trabalho com saúde pública há mais de oito anos e lido com gente (e seu lado mais negro) há mais de vinte. Essas mulheres não são monstras. O mesmo não posso dizer da maioria dos homens que tangem o assunto.
Não consta na constituição a figura do ex-filho, nem do ex-pai, mas o que muitos fazem após assinar o divórcio é esquecer que colocaram gente indefesa no mundo, dão de ombros para a família e retomam a vida de solteiro como se jamais tivessem visto aquelas crianças. Existe o judiciário, sim, mas ele é lento, ineficiente e só tem recursos prontos para construir prédios luxuosos, nem sempre para aparelhar a busca ao sujeito. Até que o sem vergonha seja encontrado, porque muita gente se dispõe a mantê-lo no caminho das trevas, a mãe fica responsável pela prole. E ai dela se as crianças forem encontradas fazendo baderna nas ruas, por que ela, coitada, é facilmente encontrada e punida pelo judiciário.
E olha que há dez anos era bem pior. Algum imbecil, um anticristo de paletó disse que "o homem em nada peca" e o retardado acreditou, decerto que por pura conveniência.
Pior acontece quando a mulher é solteira. Ainda hoje, com freqüência ainda maior do que há vinte anos, o cafajeste alega que ela dormiu com vários homens e só assume a paternidade com a comprovação genética. A lei não o obriga a se casar, nisto se acha no direito de ir embora e abandonar a todos quando bem entender.
Ponham-se no lugar de uma moça que fez a besteira de transar com um sujeito desses. Ambos são responsáveis, se um não quisesse o dois não brincariam. Ele se recusa a assumir, faz ameaças e desaparece. Quem fica do lado dela? O sujeito se dá ao trabalho de fazer a má fama dela antes de fugir para não assumir, o povo sempre preferiu acreditar no pior e não raro vira as costas para a moça. Não se iludam com o calendário, ainda hoje há famílias que expulsam a moça de casa, e não são tão poucas como pode parecer, só não são notícia.
Abandonada, com os machões do bairro (geralmente casados) assediando, com a miséria que se costuma pagar ao seu perfil e uma criança em gestação, o desespero é a porta mais próxima. Fica vulnerável às soluções "fáceis" e às idéias de jerico dos oportunistas. É facilmente convencida de que a criança é só um apêndice de seu corpo, que ninguém vai sentir as dores da gestação por ela, que ninguém vai ajudar a criar, que é melhor matar agora do que parir e fazer sofrer uma vida inteira.
A igreja? Ah, sim, claro... Acha mesmo que é tão fácil? As queixas contra a repressão prévia não são poucas. Ignorando o que o próprio Cristo aconselhou, apontam para o cisco no olho da moça e não percebem a trava de tronco inteiro que têm em seus próprios olhos. Há religiosos que acolhem sem fazer perguntas estúpidas ou reprimendas em tom de superioridade, decerto que sim, mas a misoginia ainda infecta o cristianismo. De regra, ela não consegue apoio, e no desespero aborta.
Onde está o pai? Onde? Fazendo mais do mesmo, sendo aclamado como macho alpha, e tendo a cabeça oca alisada pela sociedade, muitas vezes também pelo pai da moça.
As que conseguem resistir à tentação de interromper a gravidez não têm vida mole. Primeiro porque é socialmente aceitável pagar menos para a mulher, apesar de ela ser a maior consumidora de bens duráveis; segundo porque a pecha de mulher fácil a impele a abandonar o lugar onde viveu, e onde seria alvo de dedos e do olhar de superioridade do cretino; terceiro, mas não menos importante, por que ser mãe solteira ainda é ítem eliminatório para uma vaga de emprego, seja qual for. Ela tem que se virar. Sozinha.
Vocês talvez lembrem de um ditado infame, que os mais novos certamente desconhecem: Se a moça desanda foi culpa da mãe, se andou na linha foi pulso do pai. Esvaziem seus estômagos antes de pensarem a respeito, então analisem criteriosamente a sentença. Estômagos vazios? Então vejam a velha lenda de Adão e Eva, que já é distorcida, sendo completamente trucidada para justificar qualquer acto masculino, e condenar previamente a mulher. De cara, antes que a criança berre feito uma louca por sair da barriga, a mãe já é culpada.
Também há a tradição de desmerecer ou mesmo esquecer as heroínas. Quem se lembra de Maria Quitéira? Quem? Tomaram bomba em história ou só decoraram para passar? Corja de desmemoriados! Cliquem aqui e saibam. Mais sobre ela.  Mas de Tiradentes todo mundo lembra, né? Pelo menos os que estudaram direito, caspita! Seria muito pedir que se lembrassem de Sóror Joana Angélica, hoje Joanna de Ângelis, mentora de Divaldo Franco e, para quem quiser saber, o anjo responsável por todo o continente americano.
Elegemos uma mulher para presidente e tem muita gente reclamando. Não por questões políticas, mas por machismo. Em muitas igrejas ditas evangélicas, pastores alardeiam o absurdo que é uma mulher comandar um país. Quem é mesmo que está carregando a economia europeia nos ombros? Não ouvi. Ângela Dorothea Merkel, chanceler alemã e com quem a Dilma certamente tricotará muito... para o nosso bem, espero que sim.
Me valendo da experiência que tive quando era cético, não foi difícil concluir que o feminismo radical e misantropo que hoje se apresenta é conseqüência, não causa do machismo histórico. Basta estudar criticamente a história, usando de vários autores de várias vertentes e analisando a sociedade contemporânea.
Eu sou contra o aborto, completamente contra, a legislação brasileira já contempla todos os casos em que ele se torna realmente necessário. Mas quem sou eu para julgar quem se vê obrigada a fazer? Quem dá emprego a uma gestante? Afinal, alega-se que a gestação causa ônus à empresa, que são meses em, que a mulher "fica à toa" e recebendo, e outras abobrinhas de gente egoísta que não se dá ao trabalho de lembrar que vive em sociedade. Fora que muitas famílias levam as meninas à força para abortarem. Não são gente ignorante e sem recursos, são gente da auto proclamada alta sociedade, que prefere matar (já nascido ou não) a passar por um constrangimento. Ter uma filha que se dá à dignidade de ser mãe mesmo sem o apoio do outro, para eles, é uma vergonha imensa, simplesmente porque eles mesmos seriam os primeiros a apontar seus dedos sujos para a família que o permitisse. Novamente, a mulher é culpada para que o homem seja inocentado, não importa do quê. Afinal, o que é uma criança diante da moral e dos bons costumes da família cristã brasileira? Quando Jesus disse que um camelo passaria pelo buraco da agulha (uma falha de uma rocha que havia nos arredores de Jerusalém) antes de um rico ir para o céu, foi execrado pela sociedade. Mas me digam se ele não tinha razão? Infelizmente os ricos são grandes semeadores de machismo.
Ah, sim, também tem aquela conversa de que mulher que não dá bola é mal comida, é fria, é doente, é lésbica (mais machismo), é mulher da vida que só dá por dinheiro, enfim. Não adianta a moça tentar aparentar um puritanismo que não tem, nem tentar atenuar o que tem, será apontada e adjetivada do mesmo jeito, bastando não aceitar a cantada de um só do grupo, uma só vez.
Moças, só há um remédio, só mesmo um remédio que minha parca cultura me permite encontrar; ABSTINÊNCIA. Se neguem. Não dêem bola para ninguém. Se unam! E só se casem quando estiverem profissionalmente e academicamente estabelecidas. Sejam donas dos seus narizes antes que alguém tome posse. Primeiro amem a si mesmas, ou não vão conseguir amar a ninguém, nem filho, nem marido. Vocês não precisam disso, eles é que não podem ver uma rachadura na parede. Basta uma geração se negar até estar devidamente estabalecida, para que o machismo desmorone e não reste mais do que escombros para os misóginos se esconderem. Imagino que possa ser duro, afinal vocês são bombardeadas diáriamente para serem insaciáveis, revista atrás de revista, propaganda atrás de propaganda afirmando que sexo é como álbum de figurinhas, que é bom ter repetidas para poder trocar. Não é. Após a crise de abstinência, vocês verão que podem viver sem e usar isto como mecanismo de pressão. Afinal, é por honra à cabeça de baixo que o machismo existe. Inutilizem-na e tudo ficará mais fácil. Palavra de homem.

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