16/01/2010

Casar é moderno

Pode parecer que bebi, ainda mais com tanta gente dizendo o contrário, mas casamento é muito moderno, um tremendo avanço.

Antigamentíssimo, o sujeito só tinha compromisso com suas próprias necessidades mais básicas. Comia, dormia, transava e dava os ombros para o resto. O homem era supostamente livre, sem regras, sem compromissos, sem aborrecimentos. Uma vida que muita gente hoje inveja, por ser aparentemente mais feliz.

Mas veio a civilização malvada e pôs tudo a perder. Será?

Na bucha, a vida descompromissada e sem regras era exceção, na verdade era uma vida de egoístas, que não queriam dar ao grupo sua parcela de sacrifício. Um desses sacrifícios teria sido a defesa da prole ou da comunidade.

É perfeitamente aceitável, hoje, que se queira a presença de amigos, mas não a de seus filhos, não só pelo trabalho que dão, mas também porque os interesses das crianças não divertem quem não gosta de crianças. Na verdade, gente que age assim não costuma tolerar quem não as diverte ou não compartilha dos mesmos interesses, é gente que quer evitar problemas a todo e qualquer custo, mesmo aqueles decorrentes de seus actos. O sujeito simplesmente lava as mãos e de exime de suas responsabilidades, como os do parágrafo acima.

Quem vê um pai de família voltando cansado do trabalho, quase dormindo no banco do ônibus, usa-o como argumento para ser contra o matrimônio. Conviver com gente em um botequim é muito diferente de conviver diáriamente com alguém. No cotidiano o verniz da pessoa afável e benfazeja se dilui no solvente de seus defeitos, é preciso tato para conviver com isso. No botequim se paga para tudo, não se vê o serviço sendo feito e todos estão lá para fins recreativos. Parece o mundo perfeito, talvez até fosse, mas é falso.

A vida de entretenimentos é sustentada pelo labor de quem tem compromisso, pessoas que ajudam a sustentar uma família ou sustenta a própria. Sem um grupo compromissado, a diversão de alguém não acontece. Quem diz que não conhece um casamento feliz, não procurou, se ateve aos exemplos que quis ver. Nós temos uma inata tendência a não enxergar o que está à nossa frente, se soubermos que aquilo não nos é conveniente. É uma imaturidade difícil e penosa de extirpar, mas se até eu consegui, então qualquer um que quiser e se dispuser ao esforço consegue.

Eu passo as histórias de casamentos onde a moça foi completamente anulada e o cafajeste tentava viver como se ainda fosse solteiro, sei que acontecem, como sei que não são a regra do caso, ou aquelas piadinhas onde a mulher espera o marido com o rolo de macarrão não existiriam. Homens como o supracitado têm fins cruéis, eles têm a certeza de que todos irão ao enterro para terem certeza de que morreu mesmo. Quem nunca pára para pensar, não sabe o sofrimento que isto causa.

A civilização, tão execrada por revoltados de todas as épocas, garantiu a sobrevivência da humanidade. Como animais, nós somos a espécie mais despreparada de todo o planeta; Nossa pele é muito fina, o maior casca-grossa se fere com facilidade e demora a cicatrizar; Nossa musculatura é débil, o sujeito tem que ser muito musculoso e com músculos muito bem consolidados, para brigar com um chimpanzé mediano; Nossa infância é uma prisão, ainda estamos tentando controlar as mãos, quando outros mamíferos correm e fazem predadores de bobos. Não fôssemos gregários, teríamos sido extintos em poucos milênios, talvez em poucos séculos. Graças a Deus não encontramos os dinossauros.

Fica fácil perceber que ser uma espécie gregária nos livrou do pior. À parte o mau uso que tantos fizeram disso, assegura que a criança doente possa se tornar um adulto forte e saudável. Sob os cuidados dos pais, que podem acompanhar o desenvolvimento do rebento por muito mais tempo do que a falsa liberdade permitiria, o indivíduo consegue desenvolver suas aptidões e produzir avanços, como a roda, o domínio do fogo, a conservação dos alimentos, o chocolate, entre outros.

Um solteiro está sempre sob o risco de morrer cedo por falta de socorro, caso não viva com uma família. É difícil chamar socorro pelo celular, quando o braço esquerdo está como se o estivessem descarnando com um alicate, e o peito como se fosse rasgado. O corpo é burro, não sabe que apertando botõezinhos a ajuda chega rápido, em situações de emergência ele nem sempre deixa a mente agir.

Vivendo em uma república ou em uma família constituída, por mais rusgas que haja, as chances de um amparo rápido são muito grandes, durante e depois de um ataque cardíaco, quando é aconselhável o repouso com refeições leves em horas certas. A turma divertida do botequim não vai te ver em casa, não vai te ajudar a andar até a sala, não vai te dar comida na hora certa, não vai ligar para o médico a qualquer anomalia.

O homem sábio, que sempre tem a última palavra "Sim Querida", mesmo sem perceber assegura uma velhice mais tranqüila. Porque o maior medo da maioria dos solteiros é a incapacidade de se virar sozinho, algo que será inevitável, mas muitos preferem não cogitar e não cercar das devidas previdências. O homem sábio se compromete com o casamento e com os que dele fazem parte, é um motivo perene para se aprimorar sempre.

Um matrimônio bem contraído civiliza. O maior fanfarrão sabe que seus antigos excessos vão afetar mais pessoas, o problema de cair bêbado já não é só seu, o de dirigir bêbado nunca foi. Sabe que haverá uma criaturinha que tentará imitar tudo o que fizer, e não adianta usar o bordão "Faça o que eu digo, não faça o que eu faço", ele não funciona, só retarda e agrava a imitação.

O maior sabotador de um casamento é aquele que tenta anexar-lhe todos os hábitos de solteiro. Lamento, mas não dá. Onde dois vivem há um mínimo de regras a serem seguidas, como avisar que vai demorar, avisar (com antecedência) que vai levar alguém para o jantar, jogar a roupa suja no lugar certo, ajudar na conservação da casa; cousas que outrora uma pizza ou se mudar de endereço resolvia, deixando o prejuízo para quem ficasse.

O que ouço de casais longevos e felizes é praticamente isto: "Case-se com quem gostas de conversar". Casar porque gostou de transar com o sujeito é reservar dinheiro para as despesas do divórcio, é casar por impulso, por instintos, instintos são regidos por hormônios e estes têm ação de curta duração, não se pode confiar neles para uma vida. Com esses casais aprendi que o amor nasce, se deixarmos. Aquela moça que se esmera em te fazer ver o que precisas ver, que consegue manter a tua amizade mesmo te jogando na fronte o que nem sempre te agrada, cuja companhia (muitas vezes) pobre em emoções te faz esquecer um pouco das agruras que te acometem, dê uma boa olhada nela e depois me conte. Olhou? Ela tem seus encantos. Enquanto as aventureiras se esmeram em te seduzir, para te arrancar os recursos, ela só o fará se houver um compromisso teu de que haverá continuidade, e para somar seus recursos com os teus.

Não é (muito) da minha conta, enquanto não for na minha família, mas esta onda de "ficar" é de uma estupidez imensa, é um comportamento muito próximo ao dos animais em estágio mais primitivo de evolução. Ninguém se envolve e ninguém assume sua parcela do que aconteceu com o outro, mas no dia seguinte desce a lenha no governo por causa das notícias nos jornais.

Com a idade é natural que o interesse por sensações decaia, em quem decidir ter uma maturidade digna, em vez de tentar perpetuar a adolescência. O que vai manter alguém do teu lado é o compromisso. Se a outra pessoa se interessa pela tua saúde, em lhe abrandar a passagem do tempo, então haverá algo para tomar o lugar da virilidade e amparar as novas necessidades. Um destino muito diferente do que esperava os velhos (e os doentes) de antes da civilização, quando ser devorado por uma fera enquanto os outros corriam era normal.

A humanidade só conseguiu avançar quando decidiu constituir família, e suprir suas necessidades. Obrigar homens rebeldes a assumirem um papel relevante em prol de um grupo, não só de si mesmos, foi um remédio amargo que funcionou. E enquanto eles continuarem a olhar somente para o próprio umbigo, imaginando que agora poderiam estar pegando doenças venéreas, sendo processados para assumir paternidades tortas, tendo seus cobres indo pelo ralo da promiscuidade, não vão compreender o quanto se doar para um pequeno grupo pode fazer bem. Deixar de agir como um reles animal para agir como homem pode causar desconforto, mas os que conseguiram me asseveram que não trocariam um dia da vida que têm por um ano da que deixaram. O casamento os fez ver além do próprio corpo, do próprio egoísmo, dos próprios delírios de que seriam jovens pela eternidade.

Para aqueles que querem contribuir com o bem comum, fazer a humanidade avançar de verdade, em vez de apenas se iludir com distrações virtuais, o matrimônio constitui uma pedra angular, pois dá um motivo urgente e real para fazer as cousas andarem a contento. Em família os problemas acontecem em tempo real, muito antes de as estatísticas dubias chegarem à mesa do ministro, obrigando à mobilização imediata.

Nem todos têm o preparo ou a vocação para o matrimônio, mas isto é muito diferente de ser contra, colocar nele a culpa pelo mau uso do patriarcado. Não houvesse casamento, teria sido pior, não haveria o que impedisse a gana de poder e prazeres que teria levado muitas comunidades ao colapso. O casamento, por mal aplicado que tenha sido, freou quase todos os impulsos destrutivos do homem, que ainda hoje os tem.

Em todas as vias de todas estas décadas neste orbe, meus caros, tenho da vida a lição de que o casamento desanimaliza, transforma o macaco pelado em homem, ainda que o péssimo hábito de beber água no gargalo persista.

Promiscuidade é cousa de trogloditas, que pegam, usam e saem sem olhar para trás. O moderno, o avançado de verdade é o casamento.

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