Feli$ Natal.
Heim? Já passou? Não, não passou, ainda está por vir.
Não, não é uma daquelas philosophias complicadas que dão sono até na guarda do palácio. Enquanto vocês estão contando os tostões para gastar em ovos de chocolate, a indústria e o comércio já estão de olho na próximas datas comercialmente apelativas. Neste exacto momento há um batalhão de marqueteiros planejando a campanha para o Dia da$ Mãe$, quando este estiver se aproximando o dos namorado$ começa a ser planejado e assim por diante. Ou seja, daí para o natal é um pulo, ou uma verba publicitária. Só me adiantei um pouco às agências de propaganda.
O povo reclama muito desse aspecto tão materialista que imprimem nessas datas, que em tese deveriam ser sagradas. Concordo plenamente. Entretando devo fazer as vezes de advogado do diabo. Por mais triste que o excesso seja, o trabalho em si é bom. Não vou discorrer sobre a exploração da mão-de-obra e a mercantilização (esta citarei mais adiante) dos sentimentos envolvidos. Vou falar das pessoas que, muitas vezes, não têm conseguido sobreviver sem essas datas. Emprego está difícil até na Alemanha, imaginem aqui, onde o governo já comemorou quedas insignificantes do desemprego. Não são só pais de família, como também idosos e adolescentes.
Os primeiros geralmente têm urgência em encher a despensa, depois de enviar currículos até para sósia do Bin Laden, porque a barriguinha do bebê não conhece indicativos econômicos, ela reclama com ou sem emprego.
Os segundos eu retificaria, qualquer pessoa acima de quarenta anos é preterida pelos empregadores, apesar da experiência que trazem e da capacidade de motivar a equipe que só a idade lega. Mas na hora de comprar, aha, até Matusalém serve.
Os últimos são alvos da falta de experiência. Fazem um estardalhaço para promover productos de mau gosto e aspecto chamativo, atraindo a atenção e a mesada, mas na hora de pagar salários, querem que nasça pronto.
Essa gente só tem essas datas para garantir uma situação menos sofrida. Se de uma hora para a outra as pessoas decidissem não gastar mais um centavo sequer em comemorações, o tecido social não se rasgaria, seria feito em trapos imediatamente. É aqui que começo a falar da mercantilização dessas datas. Há responsáveis que ganham com isso, que ganham muito com isso. Por conta desses responsáveis, a indústria deixou de investir em mão-de-obra talentosa para investir em mão-de-obra especializada; se sair um milímetro do que aprendeu na faculdade, trava. Hoje esses artesãos são escassos, por isso mesmo ficaram caros e agora os meios de produção em massa estão com imensas dificuldades em reaver seus préstimos, e sendo poucos a formação de novos artesãos também é dificultada. Mas não é só, esses responsáveis agora estão correndo atrás do prejuízo que causaram em nome da eficiência e da lucratividade, o ar que respiram e a água que bebem estão comprometidos. Estão investindo pesado agora em algo que deveria estar pronto há décadas. Esses responsáveis, caríssimos, estão em escritórios refrigerados, em chalés aquecidos, em campos de futebol, em botecos, furando o sinal vermelho, cozinhando o jantar, pedindo uma pizza, et cétera.
Não reclamemos. Nós todos somos responsáveis pela mercantilização do sagrado. Ainda que só há pouco tempo estejamos começando a nos dar conta disso. Não existe "O" mercado; NÓS somos o mercado. Se as pessoas supracitadas estão nessa situação ruim, é porque NÓS permitimos que nos manipulassem. Ao contrário do que os inescrupulosos pregam, NÓS-MERCADO temos coração sim, só não temos juízo, se nós quisermos que os especuladores que ganham com o sofrimento alheio saiam do páreo, eles saem. Mas para isso precisamos sair da letargia em que nos encontramos e começar a pensar com nossas próprias cabeças, prestando atenção naquilo que compramos, de quem compramos e porque compramos. Há países que usam mão-de-obra escrava, sob os mais diversos eufemismos, por isso vendem bugigangas a preço de banana. Há países onde a manifestação popular é crime, por isso os especuladores pagam o que querem e os empregados ainda se dão por satisfeitos, de onde também se conseguem preços muito baixos.
Na próxima vez que quiser protestar contra uma data comercial, proteste sabendo o que vai comprar. Escolha de quem vai comprar, não se deixe levar pela pechincha. Agindo assim, quem sabe, possamos tornar os comerciais apenas um detalhe das datas comemorativas, e dizer ao fim de dezembro FELIZ NATAL. Mas isso não se dará tirando o meio de vida de gente em dificuldades. Antes de falarmos em salvação da alma, teremos que matar a fome do indigente.
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